sexta-feira, outubro 10, 2008

A "discutir o sexo dos ambos"

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As bolsas de todo o mundo descambam no fim da semana que, para muitas, é a pior de todos os tempos. Dezenas de países tentam convergir para medidas que estanquem o descalabro. Milhões de empresas à volta do globo arriscam-se a fechar as portas e milhões de trabalhadores arriscam-se a ficar sem trabalho. O nosso parlamento dedica o dia ao assunto mais importante do momento: o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Uma birra simbólica transformou-se na obsessão de boa parte da nossa intelligentsia de esquerda que tem coluna em jornal ou frequenta os mentideros políticos.
A lei pretendida não resolveria o falso problema que parte da minoria em causa pensa que tem. Não há utilidade que justifique tanto activismo pelo que sou levado a pensar que se trata essencialmente de uma bravata infantil para obrigar o povo, ao arrepio da sua sensibilidade, não já a ignorar, como costuma fazer, mas sim a avalizar a homossexualidade.
Os labregos do povo verão assim quem tem influência nos jornais e amigalhaços em S. Bento.

Espero que o povo veja também o que pode esperar das elites que supostamente o iluminam.

1 comentário:

Anónimo disse...

Tirando um caso ou outro, a crise financeira internacional não tem excitado muito nem o jornalismo, nem a política portugueses. O espaço que lhe dão é pouco para o que seria de esperar; e a relevância também não é grande. O que, francamente, não espanta. Num país pobre, qualquer número com mais de três zeros não entra na cabeça de ninguém. E há ainda a ignorância do cidadão comum, que não percebe o que se passa, e a modéstia dos peritos, que, se percebem, acham melhor não dizer nada. A polémica, de resto ocasional, fica pela morte (ou pela "derrota") da "mão invisível" ou do "neoliberalismo" (que a maioria dos preopinantes ignora o que seja) e, naturalmente, pela "ganância" da "especulação". Enquanto os deixarem viver na sua miséria habitual, os portugueses respiram.
Respiram e vão pensando no que, verdadeiramente, interessa ao país. Na Assembleia da República, a esquerda e a direita tratam, com toda a seriedade, do casamento de homossexuais. Concordo inteiramente que a lei aprove o casamento de homossexuais. Mas, com o Ocidente à beira da falência, já para não falar de Portugal, essa não parece a prioridade do dia. Como também gosto muito de ouvir Manuel Alegre dissertar sobre a liberdade e de medir a distância exacta a que ele está da direcção do PS. Só que, por agora, preferia que ele falasse da queda da Bolsa, dos 12 mil milhões que já perderam os bancos ou do empréstimo da Caixa ao BPN. E, até, se nem ele, nem o Parlamento quiserem descer tão baixo, do "plano Paulson", do "plano" Brown, da unidade da "Europa" e da reunião dos G7.
Admito que estas futilidades não entusiasmem os príncipes que nos governam. De qualquer maneira, talvez não fosse inútil imaginar como acabaria o país, se a recessão americana (hoje inevitável) durasse, por exemplo, meia dúzia anos; se a "Europa" se desintegrasse ou enfraquecesse; ou se a esquerda e a direita voltassem, por força da necessidade, às nacionalizações de 1975. Compreendo que estas coisas deprimem e que, pelo contrário, o casamento de homossexuais puxa muito mais pela parlapatice. Como as casas da câmara, o último episódio dos sarilhos de Santana, a ERC ou a cooperação entre o primeiro-ministro e o Presidente. Portugal continua numa tranquilidade etérea - enquanto a economia se começa pouco a pouco a desfazer e o caos se aproxima.

Vasco Pulido Valente, Público 11 Out. 2008