Sempre tive uma embirração, irracional mas irreprimível, pelo Pirilampo Mágico.
Conheço-o desde que apareceu, há vinte anos. Chegava à empresa onde eu trabalhava pela mão de um colega que, muito louvavelmente, colaborava com a instituição que inventou o boneco. Trazia todos os anos um enorme saco de plástico transparente cheio dos pequenos seres – de todas as cores, de olhos esbugalhados.
O que me irritava era que os ditos seres não tinham a vida efémera de qualquer emblema de peditório. Teimavam em perdurar e conseguiam-no, de preferência colados no topo dos ecrãs dos computadores – alinhados, um de cada cor, à espera do próximo. Toque «kitsch» para humanizar a tecnologia, versão empresarial do galo de Barcelos em cima da TV.
Eu guardava os bichos numa gaveta porque não ousava deitá-los no caixote do lixo. Não sei bem porquê, mas tinha a vaga sensação de que a senhora que fazia a limpeza me acharia sacrílega se o fizesse. Comecei a trazê-los para casa e passaram a ser excelentes brinquedos para o meu gato.
Vem isto a propósito de uma notícia que li no «Expresso» (mesmo que seja falsa não tem importância): o «Roteiro para a Inclusão», liderado pelo nosso PR, deverá arrancar com a gala comemorativa dos vinte anos do Pirilampo Mágico, patrocinada pela primeira-dama.
Senti um clique, fez-se-me luz. Desde ontem que não consigo pensar em Aníbal e Maria Cavaco Silva sem os associar ao Pirilampo Mágico. Imagino o Palácio de Belém invadido por batalhões das inefáveis criaturas, filas coloridas enfeitando os parapeitos da marquise da Lapa e as janelas dos portugueses. Entrámos numa nova era. Tudo passou a fazer sentido, até o discurso do 25 de Abril.
O Nuno Brederode diz que o compromisso cívico lhe faz lembrar «a ideia de felicidade que subjaz aos anúncios de champô» e «Dickens, mas na estética da família Trapp» (DN, 30/4). Acho demasiado complicado: quem subiu a pulso não é obrigado a saber quem foi Dickens.
Luzes de pirilampos e alguma magia e está no papo!