Passei os últimos dias em Lanzarote, nas Canárias, percorrendo e fotografando as suas espantosas paisagens vulcânicas mas a história, que não resisto a contar, pouco ou nada tem a ver com as belezas naturais.
Dois dias depois do 25 de Abril assisti, na TVE, a um debate político com a intervenção de vários comentadores encartados. O pretexto era um livro, publicado por um dos presentes, que trata do fim do franquismo.
Falou-se muito acerca da transição para a democracia em Espanha e discorreu-se sobre se a democracia tinha sido realmente conquistada ou se tinha antes sido oferecida, de bandeja, pelos políticos ao povo.
Referiram-se as vários influências estrangeiras, ou tentativas de ingerência, sendo específicamente mencionados os Estados Unidos e a França.
Concluiu-se que a experiência espanhola de transição pacífica foi um grande sucesso, exemplo para todo o mundo.
Por incrível que pareça, e parece ainda mais no dia 27 de Abril, a Revolução do 25 de Abril e o nome do nosso país nunca foram sequer mencionados.
Dispenso-me de tergiversar sobre o significado desta história...
domingo, abril 29, 2007
Uma história exemplar
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sexta-feira, abril 27, 2007
Mais uma manifestação de sectarismo do novo MRPP
Mas se estas atitudes só comprometem aqueles que as assumem e neste caso era um grupo restrito de meninos identificados com a JCP, já as posições assumidas pelo PCP, JCP e grupos afins durante a preparação da manifestação revela uma total incapacidade de, neste momento, participarem em qualquer organização que se considere verdadeiramente unitária.
Assim, chamaria a atenção para que este ano foi impossível apresentar um manifesto comum às diferentes organizações promotoras da manifestação de apelo à participação na mesma. Tal como tem sucedido em anos anteriores o Eng. Aquilino Ribeiro Machado, com uma enorme paciência, apresentou mais uma vez um borrão à consideração de todos os representantes das organizações promotoras. O PCP e organizações afins, propuseram logo de início um conjunto tão grande de emendas que tornavam inviável a leitura daquele texto e a sua aceitação pelas outras organizações, fora da sua área de influência, com principal destaque para o Partido Socialista. É evidente que o PCP preferiu a não existência de um manifesto à apresentação do que tinha sido elaborado. Ninguém inviabilizou pequenas correcções, algumas propostas pelo próprio PCP, mas era impossível aceitar uma desvirtuação tão completa do texto inicial. É evidente que o que estava em causa desde o início era que o PCP e seus companheiros queriam, num texto que se queria sintético e curto, estar constantemente a sublinhar todas as garantias constitucionais relativamente aos direitos sociais. E ainda estávamos num dos primeiros parágrafos. Sabia-se que mais para diante eram apresentadas alterações muito mais significativas. Seria elucidativo apresentar a versão original e as alterações propostas, mas não as possuo.
Mas a manifestação mais evidente de sectarismo foi a que se verificou com a recusa do Ricardo Araújo Pereira (RAP), dos Gatos Fedorentos, para falar em nome das organizações juvenis. Não estive por dentro do processo de recusa, mas é evidente que, para quem acha que estas manifestações valem pelo impacto mediático que alcançam, era muito mais significativo ter o RAP a discursar, do que um jovem sindicalista, como era apresentado pela JCP, a falar, por muitas verdades que transmitisse sobre a actual situação laboral.
Veja-se esta pérola de alguém que aparece a defender a posição da JCP: “obviamente que com isto ganha principalmente o PS (que assim se safa de mais uma intervenção crítica e logo no 25 de Abril)”. Ou esta outra, ainda mais significativa: “o RAP não passou de um pretexto da JS e do BE para que não houvesse do palco do 25 de Abril em Lisboa um discurso feito por um jovem contra as políticas do governo. ... . Usaram indecentemente o nome de RAP para esconderem que o que NÃO queriam mesmo era um jovem a malhar no palco do 25 de Abril em Lisboa nas políticas do governo do PS.”
Perante afirmações deste tipo, mas que reflectem uma mentalidade, o que se pode acrescentar.
Como já tenho afirmado publicamente, neste momento a Direcção do PCP arrasta este para um caminho sectário e esquerdista, que a longo prazo o transformará num Partido marginal ao sistema político, com quem é impossível estabelecer qualquer compromisso político, tornando-o numa espécie de MRRP dos tempos actuais.
Esta prática, que em diversas alturas atacou o movimento comunista e que conduziu à célebre manifestação de sectarismo de Classe contra Classe do final dos anos 20 e início de 30 do século passado, foi responsável pela derrota do Partido Comunista Alemão (PCA) e pelo desarme da esquerda na resistência à ascensão do nazismo. Foi a época em que o PCA acusava os sociais-democratas de sociais-fascistas (socialistas nas palavras e fascistas nos actos). Mais tarde o MRRP serviu-se desta consigna para atacar o PCP.
Espero em artigo posterior dar conta deste desvio histórico do movimento comunista, que lamentavelmente tanto se assemelha com a actual deriva sectária e esquerdista da Direcção do PCP.
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quarta-feira, abril 25, 2007
terça-feira, abril 24, 2007
25 de Abril em Tenerife
Vou passar o 25 de Abril no meio do Atlântico, a visitar a montanha mais alta de Espanha, o El Teide.
Daqui vai um abraço para todos os amigos da Revoluçao (sem til, por defeito do teclado) e também esta "recordação".
sábado, abril 21, 2007
Os dias da Música
Arrancou ontem à noite,no CCB,o programa de "Os dias da Música" este ano centrados no piano.
Bernardo Sassetti fez uma primeira parte ao seu melhor nível, em improviso sobre Bartók e Frederico Mompou, e rematando com um trecho das Variações Goldberg.
Na segunda parte o pianista Hüseyin Sermet, acompanhado pela Orquestra de Câmara Wrttemberg- Heilbronn dirigida por Ruben Gazarian,tocou o concerto número cinco de Beethoven.
O maestro, jovem como muitos dos músicos, conseguiu galvanizar a orquestra que me pareceu subdimensionada para a peça tocada.
O pianista mostrou grande segurança nos movimentos rápidos.
No andamento central tive a impressão de que nem sempre dominou a complexa dinâmica da lentidão.
No seu conjunto o concerto foi um sucesso e penso que nós, o público, saímos todos satisfeitos.
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sexta-feira, abril 20, 2007
A minha ida ao "Um Contra Todos"
A História de Portugal, para não assustar os concorrentes, restringia-se aos últimos 50 anos ou algumas das perguntas sobre literatura portuguesa referiam-se às inesgotáveis obras da Margarida Rebelo Pinto. Malato, o apresentador do programa, tem espírito e consegue, em algumas tiradas dar um tom progressista, num local que prima sempre pelas opiniões reaccionárias ou, pelo menos, pela defesa da ideologia dominante. Veja-se, por exemplo, quando o Jorge Gabriel apresentou um programa semelhante referiu-se a Chávez, como um anti-americano primário, reproduzindo as ideias feitas sobre esta matéria.
Foi com este estado de espírito que resolvi inscrever-me no concurso. Depois de muitos telefonemas para cá e para lá, mas sempre afáveis e simpáticos, e um interrogatório por telefone a testar os meus conhecimentos gerais, eis que surge o dia em que devo comparecer às 10h30 na Televisão. Pedem-me que leve duas mudas de roupa, não vá eu ir à cadeira. Como são gravadas três sessões por dia, tem que se dar ao telespectador a sensação de que o concorrente está a ser inquirido em três noites diferentes
Como não sabia o tempo que levaria a chegar à televisão e devido aquele espírito antes-de-já, que é próprio dos sexagenários, cheguei com vinte minutos de antecedência. Esperava eu que entrasse, fosse levado para uma sala e esperasse até chegarem todos os 51 concorrentes. Engano meu. Esperámos à porta da televisão, por acaso não foi ao vento e à chuva, porque nesse dia fazia Sol, mas por aquilo que me foi dado perceber, devia ser essa a situação normal. Só mesmo às 10h30 é que chegou uma menina que confirmou a nossa presença. Depois, reuniu-nos e levou-nos para o estúdio, onde nos entregaram um conjunto de folhas, para nos identificarmos e declararmos que renunciamos a todos os direitos de reclamar contra a Endemol, a produtora do programa. Tipo quando instalamos um novo software no nosso computador e a firma produtora nos espolia voluntariamente de todas as possibilidades de no futuro reclamarmos contra qualquer maldade que ela nos faça. Já se sabe que assinei sem me dar ao trabalho de ler todas as alíneas, tal como aceito todos os programas de computador sem ler todos os direitos a que renuncio. Tristes vão os tempos que para se fazer qualquer coisa é preciso comprometermo-nos a não pormos em tribunal com quem nos relacionamos. Qualquer dia para fazermos amigos temos que previamente assinar uma declaração a dizer que no futuro não nos tornaremos seus inimigos.
A sala onde esperamos, onde assinamos a declaração e onde comemos é sempre a mesma, acanhada, com mesas de contraplacado e desprovida de qualquer decoração. Lateralmente tem um pequeno bar, com máquinas de café portáteis e em que o balcão é igualmente uma mesa. Um local sem condições e pouco simpático. No entanto, convencido que estava a fazer um favor à televisão participando no seu concurso, pensei que, tal como em todos os locais onde há conferências, colóquios, etc., poderia ir tomar o coffe break sem pagar nada. Puro engano, o café era a 0,50 €, como em qualquer cafetaria, com muito melhores condições. Sobre pagamentos, soube também que, aos participantes que vinham da província, não era paga a estadia em Lisboa, ao contrário do que sucedia anteriormente. É a crise.
Esperámos e só por volta do meio-dia fomos para o estúdio para gravar o programa. Depois de muitas experiências, justificáveis para quem como eu estava naquelas andanças pela primeira vez, lá se dá início à sessão. O Malato aparece com ar de sono, dizendo que a mãe o tinha acordado às dez, ainda por cima ligando a seguir o aspirador. Todo o programa tem este ar familiar, com um tal Betão, um brasileiro grande, a comandar as tropas, contando anedotas ordinárias, que ultrapassam as raias do dizível. As referências sexuais, supersticiosas e religiosas, tipo seita, são comuns durante todo o dia. O Malato sempre com um ar enfastiado e cansado, transmite a sensação de que é uma grande estafa fazer o programa. O que não deixa de ser verdade porque, segundo percebi, durante três dias, 4º, 5º, e 6º feiras, do fim da manhã até às oito da noite, foi a hora a que acabou a última gravação, vai, apesar das longas interrupções, fazendo momices e perguntas aos seleccionados.
Apesar de já ter sido avisado telefonicamente, os concorrentes têm que estar de pé durante as gravações, resta-lhes nos intervalos um banquinho de plástico, da loja dos trezentos, para aliviarem o seu cansaço. As gravações são morosas, sempre antecedidas de novos ensaios, que, para um leigo, dão a sensação de que se está à espera que o apresentador se disponha a gravar. Como experiência fica-nos um dia que começa às 10h30 e acaba ás oito da noite, a maioria dele passado em pé, sem se ver a luz do dia, almoçando gratuitamente na sala onde se espera, mas com lanche e cafés pagos. No fundo, uma canseira. Há concorrentes que se oferecem para ir lá no dia seguinte, eu pagava para não ir.
E o concurso. Falava-se à boca pequena, que a primeira concorrente que foi seleccionada para ir à “cadeira”, e em teoria ela deveria sê-lo por ter sido a mais rápida a responder a uma determinada pergunta, já tinha sido previamente escolhida. Não sei se é verdade, mas que a senhora vinha muito bem arranjada, como se fosse para uma passagem de modelos, quando todos os concorrentes aparecem vestidos informalmente, é a pura das verdades. Só a sua ignorância é que era maior do que o seu ar.
Já se sabe que chumbei quando me perguntaram, para além das que estavam indicadas, qual era a modalidade que faltava no pentatlo: canoagem, natação ou salto em altura. Fugiu-me logo o dedo para o disparate: salto em altura. Era natação. O desporto não é o meu forte.
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quinta-feira, abril 19, 2007
Da natureza do fanatismo
Já depois de ter escrito o post anterior, em que referi a questão do fanatismo, tive acesso ao fabuloso "Contra o Fanatismo" de Amos Oz.
O livrinho foi distribuído com o jornal Público e eu recomendá-lo-ia em todas as escolas.
Posso dizer que encontrei uma "alma gémea" e que subscrevo tudo o que o livro diz; gostava muito de ter o seu talento e não me importo nada que os meus escritos pareçam plágios de Amos Oz. Aqui fica um "aperitivo" retirado do referido livro:
Vou contar uma história em jeito de divagação: eu sou um reconhecido divagador, estou sempre a divagar. Um querido amigo e colega meu, o admirável romancista israelita Sammy Michael, passou uma vez pela experiência, por que todos nós passamos de vez em quando, de andar de táxi durante um bom tempo com um condutor que lhe ia dando a típica palestra sobre como é importante para nós, Judeus, matar todos os Árabes. Sammy ouvia-o e, em vez de lhe gritar, «Que homem horrível que você é! É nazi ou fascista?», decidiu ir por outro caminho e perguntou-lhe: «E quem acha que deveria matar todos os Árabes?» O taxista disse: «O que quer dizer com isso? Nós! Os Judeus Israelitas! Temos de o fazer! Não há escolha. Veja só o que nos fazem todos os dias!» «Mas quem, especificamente, é que deveria fazer o trabalho? A polícia? Ou o Exército talvez? O corpo de bombeiros ou as equipas médicas? Quem deveria fazer o trabalho?»
O taxista coçou a cabeça e disse: «Penso que devíamos dividi-lo em partes iguais entre cada um de nós, cada um de nós devia matar alguns.» E Sammy Michael, ainda no mesmo jogo, disse: «Pois bem, suponha que a si lhe toca um determinado bloco residencial da sua cidade natal, Haifa, e que bate às portas ou toca às campainhas, e pergunta: 'Desculpe, senhor, ou desculpe, senhora. Por acaso é árabe?' E se a resposta for afirmativa, você dispara. Quando acaba o seu bloco, dispõe-se a regressar a casa, mas, ao fazê-lo,» continuou Sammy «ouve, algures no quarto andar do seu bloco, o choro de um bebé. Voltaria para matar o bebé? Sim ou não?» Houve um momento de silêncio e, então, o taxista disse a Sammy: «Sabe, o senhor é um homem muito cruel.»
Se quer ler o resto deste belo texto, o capítulo "Da natureza do fanatismo", clique AQUI
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quarta-feira, abril 18, 2007
As Bruxas da Memória
Nasci numa família um pouco esquizofrénica no plano religioso.
Por um lado o meu pai era, e ainda é aos 94 anos, profundamente anticlerical. Por outro, a minha mãe foi praticando abnegadamente o catolicismo até que, depois do 25 de Abril e com mais de 60 anos, se afastou irremediavelmente da igreja.
Eu, levado pela minha mãe desde muito cedo, frequentei as missas e só nos meus dezasseis anos me “zanguei” com a igreja sob o pretexto das perguntas indiscretas, e insistentes, durante a confissão dos meus ingénuos “pecados sexuais”.
A maravilhosa disponibilidade da adolescência levou-me directamente da admiração pelas realizações do Salazar, descritas ao pormenor no Diário de Notícias, para a militância clandestina no PCP, em 1966. Devo isso a alguns amigos que me acompanharam, e acompanham, ao longo da vida.
Vem isto a propósito do livro da Joana,”As Brumas da Memória”, para que se perceba por que vou dizer aquilo que vou dizer.
A juventude é dada aos fanatismos e eu, confesso, pensei durante muito tempo que os fanatismos se dividiam entre os bons, que eram os nossos, e os maus que eram os dos outros. No caso dos católicos progressistas a imagem que eu tinha, na minha fase militante da juventude, era mais a dos equivocados que embora subordinados a um fanatismo dos maus queriam “dourar a pílula” com uns “tagatés” ao contrário.
Uma vez ou outra o funcionário do Partido com que na altura me encontrava lá mencionava uma vigília qualquer, como quem diz “não estamos sós”, mas a coisa tinha um certo ar folclórico quando comparada com as elaboradas técnicas conspirativas que nós praticávamos.
Só muito mais tarde a vida me ensinou a abominar os fanatismos todos. O meu problema agora é cuidar, todos os dias, de não os abominar fanáticamente.
Tal como os vírus que habitam, sem consequências, os nossos corpos também o fanatismo, nas suas várias formas, pode permanecer inócuo. Em determinadas circunstâncias degenera em formas agudas de imposição aos outros de “verdades inquestionáveis”.
A cadeia de raciocínios é simples: se a “verdade” é inquestionável torna-se incompreensível que alguém a não queira ou que a ela resista; essa recusa da “verdade” indicia incapacidade ou perfídia; em qualquer dos casos, como a “verdade” é inquestionavelmente favorável, resulta legítimo impô-la aos relapsos mesmo contra a sua vontade.
O facto de rejeitarmos o fanatismo não significa que devamos rejeitar a adesão a ideais, ideologias, misticismos ou utopias. Significa, isso sim, a adopção da relatividade e falibilidade dos julgamentos humanos que reserve para casos extremos, prementes e inevitáveis, a substituição da persuasão pelo uso da violência física ou intelectual.
Talvez por tudo isto penso que a Joana escreveu o livro no tempo certo; pelo que vai no mundo, porque há uma geração que começa a despedir-se e, para além de tudo o mais, porque só agora eu já estou em condições de o ler.
Se tivesse escrito antes talvez eu não fosse capaz de apreciar a hábil mistura de marcantes experiências pessoais, episódios pitorescos e verdadeiros “factos históricos”.
Talvez a ternura com que os leio não tivesse sido possível.
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Hora da publicação: 19:12 1 comentários
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domingo, abril 15, 2007
Era uma vez uma fábrica...
Era uma vez uma fábrica militar que dava pelo nome de FNMAL, Fábrica Nacional de Munições para Armas Ligeiras, e que nos anos oitenta foi integrada, juntamente com outras, na INDEP, Indústrias Nacionais de Defesa. Ficava ao fundo da Avenida de Moscavide.
Durante mais de trinta anos vi da minha janela a sua imponente chaminé de tijolo.
Centenas de pessoas que ainda hoje vivem em Moscavide trabalharam nesta fábrica e, muitas delas, passaram dentro da FNMAL a maior parte das suas vidas.
Em 2001 as instalações da FNMAL foram encerradas e nunca mais voltaram a funcionar.
Durante anos os edifícios aguardaram, no seu recolhimento e decadência, aquilo que o destino lhes reservasse.
No dia 12 de Fevereiro de 2007 apercebi-me de movimentações pouco usuais para alguém que passa frequentemente no local. Pareceu-me que se preparavam para a demolição. Quem ? porquê ? ninguém no local me soube explicar.
Desde essa data, nos últimos dois meses, a maquinaria abateu-se sobre os velhos pavilhões.
Como pretendia saber o que se estava a passar e o que se preparavam para construir no local dirigi-me à junta de Freguesia de Moscavide onde o próprio Presidente me disse, com a maior das calmas, que nada sabia sobre o assunto.
Deixei o meu contacto para me telefonerem quando conseguissem a informação pretendida. Até hoje.
Enviei uma mensagem electrónica para o Município de Loures pedindo informações sobre o projecto mas, apesar de ter sido registada com o número 18184 de 16/02/2007, a pergunta nunca mereceu qualquer resposta.
Entretranto os trabalhos continuavam.
Então resolvi, no dia 3 de Abril de 2007, dirigir-me presencialmente ao atendimento do Departamento de Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Loures.
Para meu grande espanto comunicaram-me que nada sabiam sobre projectos para os terrenos da velha FNMAL em Moscavide. Simpaticamente sugeriram que me dirigisse ao Departamento de Projectos Estruturantes (ou seria Estorturantes ?) pois aí concerteza que saberiam esclarecer-me.
Lá fui, bastante esperançado, mas a única coisa que me disseram foi que uma empresa de nome MAVIFA solicitara autorização para demolir a antiga fábrica, aparentemente já depois de ter iniciado os trabalhos.
Sobre o futuro disseram-me, a muito custo, que um projecto para o local fora reprovado pela vereação e que se aguardava a reformulação do mesmo para eventual aprovação.
Entretanto a fábrica estava quase totalmente demolida.
E transformara-se, depois de triturada, num conjunto de montículos de terra.
Qual não é o meu espanto quando hoje, 10 de Abril, apenas uma semana depois de ter estado nos Projectos Estruturantes de Loures, vejo à porta da demolida fábrica este flamejante cartaz:
Eu para já não tenho nada contra o projecto, nem contra a empresa OBRIVERCA que o vai fazer (propriedade de um famoso dirigente desportivo), nem contra a indústria da construção em geral, mas que tudo isto cheira a esturro lá isso cheira.
No mínimo, no mínimo, houve um total desprezo pelo direito dos cidadãos à informação levando a suspeitar que se está a tentar esconder qualquer coisa.
Não há por aí ninguém disposto a fazer uma reportagem jornalística sobre tudo isto ? ou um trabalho académico no domínio da sociologia ?
Eu possuo, e posso disponibilizar, umas centenas de fotografias das operações de demolição e dos interiores da fábrica tal com eram imediatamente antes da demolição.
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sexta-feira, abril 13, 2007
Entre as Brumas da Memória - o blog
Estas são as motivações da Joana nas suas próprias palavras:
"Decidi criar este blogue por ter recebido várias sugestões nesse sentido, de pessoas que entretanto leram o livro, que me comunicaram apreciações e que gostariam de conhecer reacções de outros. Algumas contaram-me histórias que eu desconhecia, relacionadas com a mesma época e com os mesmos temas - pode ser que se decidam a contá-las. "
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quarta-feira, abril 11, 2007
AFRICAN WOMEN
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segunda-feira, abril 09, 2007
O Caimão
O novo filme de Nanni Moretti é uma obra interessantíssima.
Não se limita a mostrar como Berlusconi é uma figura inconcebível, inimaginável. Isso seria o "lugar comum".
Moretti pemite-nos "sentir" como ao sucesso de Berlusconi corresponde uma sociedade corroída pelo descrédito em que até os dramas pessoais se tornam mais pungentes.
O protagonista está perante um casamento que se desfaz, filhos para os quais não tem tempo, novas realidades sociais a que precisa adaptar-se, amigos que como ele vão ficando cada vez mais velhos, uma realização profissional cada vez mais problemática, dificuldades económicas crescentes, uma televisão cada vez mais rasteira, o medo que transparece nas relações profissionais e descamba em verdadeiras velhacarias, e por aí fora.
Se é verdade que nem todos estes problemas podem ser atribuídos a Berlusconi, pelo que a sua presença no filme poderia ser considerada demagógica, também é verdade que uma envolvente social degradada em vez de constituir um "amparo" para as agruras da vida se transforma, isso sim, num propício caldo de cultura para todas as crises.
Uma outra questão levantada no filme, e da máxima importância, é a relação entre a emergência de uma figura caricata como Berlusconi e a inépcia continuada da esquerda italiana que, como se diz no filme, fez do ódio a Berlusconi o seu único e verdadeiro programa.
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sábado, abril 07, 2007
Um óbvio plágio
O nome "dot.com" do filme do Luís Galvão Teles, que conta a história de um plágio, é ele próprio um óbvio plágio.
O site dotecome nasceu no ano 2000 e este blog dotecome veio à luz em 2004. Vou pedir uma indemnização de mil milhões...(não se assustem, isto é suposto ser uma piada mesmo que não pareça).
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quinta-feira, abril 05, 2007
terça-feira, abril 03, 2007
As Vidas dos Outros
Tenho encontrado nas várias críticas publicadas na blogosfera algumas referências ao carácter simbólico da situação descrita no filme – a tomada de consciência de um oficial da Stasi sobre os malefícios do regímen socialista – e houve quem o comparasse, numa crítica bem elaborada, com o célebre filme de François Truffaut, Fahrenheit 451, em que um bombeiro, que queima livros em vez de apagar fogos, vai progressivamente tomando consciência do horror que era viver numa sociedade que tinha eliminado para todo o sempre a leitura, a fonte de toda a infelicidade. Quanto a mim, apesar do filme poder corresponder à descrição de qualquer regímen que utilize a violência policial para controlar os cidadãos, refere-se à situação concreta do sistema opressivo existente na ex-RDA, que, dada a conhecida eficácia alemã, tinha das polícias mais bem organizadas da Europa de Leste. No caso vertente, isso consistia na vigilância dos intelectuais, estivessem eles ou não em sintonia com o regímen, pois mesmo que fossem seus defensores, como é o exemplo da personagem do dramaturgo Georg Dreyman, interpretada por Sebastian Koch, poderiam ser sempre potenciais dissidentes. O intelectual, em todos os sistemas ditatoriais, é sempre um ser pensante, fonte de desconfiança e de infidelidades várias.
Neste filme há duas tomadas de consciência em relação à situação opressiva que se vivia naquela sociedade, a do dramaturgo, provocada pelo suicídio de um seu companheiro de escrita e amigo, que estava impedido de publicar, e a do oficial da Stasi encarregue de exercer vigilância sobre o apartamento onde aquele dramaturgo vivia com a sua companheira, a actriz Christa-Maria Sieland, interpretada por Martina Gedeck, que era simultaneamente desejada pelo Ministro da Cultura. Posteriormente, a progressiva consciencialização das personagens leva-as a formas concretas de resistência, a do dramaturgo ao publicar no ocidente, com a ajuda de outros intelectuais, um artigo sobre a supressão na RDA de notícias relativas a suicídios, a do oficial, ao não denunciar a actividade do seu vigiado e ao evitar, pela eliminação providencial de uma máquina de escrever onde fora batido o artigo, a sua prisão.
Pode-se considerar que na vida real será pouco verosímil que um oficial torturador, era essa uma das actividades do capitão da Stasi, se transforme em vítima por sua própria iniciativa, já no filme a personagem do capitão Gerd Wiesler, interpretada por Ulrich Mühe, que passa de oficial respeitável a simples funcionário destacado para a abertura do correio, parece-me mais convincente. Contudo, ao contrário do que vi bastantes vezes referido, acho que a causa da sua traição foi mais o resultado da sua atracção pela actriz e o conhecimento que teve de que ela, para conservar a sua carreira, era obrigada a ter relações sexuais com o Ministro, do que por ter concluído que o objecto da sua vigilância não era desmascarar um dissidente encapotado, mas sim a eliminação de um rival dos desejos sexuais do Ministro.
Esta dupla tomada de consciência, sob o pano de fundo de uma RDA pobre e triste, decorre simultaneamente com a explanação do que é um Estado policial e persecutório, em que a vida e as carreiras são feitas de delações e pequenas cedências que, em último caso, pode levar ao suicídio, como sucedeu com a actriz, quando percebeu que a sua colaboração com a Stasi permitiria a prisão do seu companheiro. O filme termina, caído o muro e unificada a Alemanha, com a descoberta pelo dramaturgo de quem tinha evitado a sua prisão e escrevendo uma peça em homenagem àquele oficial da Stasi, que se tinha comportado como um homem bom. Estavam pacificadas as consciências.
Este filme, que recebeu o Óscar para o melhor filme estrangeiro, insere-se na recente produção alemã de média qualidade e de grande êxito comercial, que recuperou alguns dos temas do seu passado recente, quer do nazismo quer da reunificação. Como exemplo, temos A Queda – Hitler E O Fim Do Terceiro Reich (2004), de Olivier Hirschbiegel, Sophie Scholl – Os últimos dias (2005), de Marc Rothemund ou Adeus, Lenin! (2003), de Wolfgang Becker.
Ao contrário de Adeus, Lenin!, que tinha também uma visão bastante amarga da RDA, mas mostrava as dificuldades de integração dos habitantes de leste na nova ordem capitalista, As Vidas dos Outros estabelece uma continuidade entre a tomada de consciência e a opção de resistir dos dois alemães do leste e a nova ordem que resulta da reunificação da Alemanha. O dramaturgo depois de ter publicado no ocidente o seu texto de denúncia da ausência de suicídios na RDA continuará, a seguir à reunificação, a ser representado e a publicar peças de teatro. Sem desvalorizar este retrato impiedoso do socialismo real dado pelos dois filmes referidos, considero que estamos longe do cinema inquietante dos anos 70 de Rainer Werner Fassbinder (ver O Direito do Mais Forte à Liberdade, 1974), de Volker Schlöndorff (A Honra Perdida de Katharina Blum, 1975), de Margarethe von Trotta (Os Anos de Chumbo, 1981) ou do filme colectivo Alemanha no Outono (1977). Estes três últimos exemplos referem-se expressamente à forma repressiva e histérica como a Alemanha Federal reagiu aos atentados do grupo Baader-Meinhof e à sua prisão, os chamados anos de chumbo, parafraseando o filme de Trotta. É evidente que os tempos são outros, aos anos 60 e 70, de contestação política, estudantil e intelectual, seguem-se os da derrota e de denúncia daquilo que foi o embuste do socialismo real.
Adeus, Lenin! e As Vidas dos Outros são feitos hoje, depois da queda do muro, por realizadores que não faziam cinema naquela altura e a quem são concedidos meios para produzirem a sua obra. Por isso, a estes gostaria de acrescentar alguns filmes que fui vendo ao longo dos anos e que foram realizados por cineastas do sistema, em condições provavelmente mais adversas e reflectindo o circunstancialismo da época. Lembraria do cineasta polaco Andrzej Wajda, O Homem de Mármore (1977), do húngaro Pal Gabor, A Educação de Vera (1978), ou, mais recentemente, do russo Nikita Mikhalkov, O Sol Enganador (1994) ou do jugoslavo Emir Kusturica, Underground (1995). São filmes diversos, realizados por cineastas que tiveram percursos e opções posteriores diferentes, algumas contraditórias com o seu passado, mas cuja obra deveria ser revisitada, tendo em conta que muito do que hoje é dito já se encontrava aí expresso, numa perspectiva crítica, mas provavelmente com propostas de saída diferentes do que aquelas que, por exemplo, nos são apresentadas em As Vidas dos Outros.
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Urbanices e coisas tais
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