quinta-feira, agosto 12, 2010

Bom nome



Vítor Magalhães (à direita na fotografia), de 54 anos, está no Ministério Público desde 1983 e foi convidado para integrar a equipa de 12 procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) em 2002, dois anos depois de o órgão dedicado à criminalidade violenta, altamente organizada e de especial complexidade ter sido criado, na dependência direta da Procuradoria-Geral da República.
Vítor Magalhães, é uma estrela no Ministério Público. Começou por estagiar em Cascais e foi colocado a seguir em Torre de Moncorvo, passando depois pelas comarcas do Funchal, de Cascais e de Oeiras. Antes de ir para o DCIAP, ainda esteve 12 anos em Sintra. É um dos procuradores com maior currículo no país em grandes casos de tráfico de droga, máfias e terrorismo, além de lhe terem passado pelo crivo alguns casos de corrupção, branqueamento de capitais e fraude fiscal envolvendo nomes sonantes da política nacional: António Saleiro (PS), Armando Vara (PS), Isaltino Morais (PSD).
O inquérito-crime que levou à condenação na primeira instância de Isaltino Morais a sete anos de prisão fez com que o procurador-geral da República o distinguisse com um louvor há menos de um ano. Em 2004, já tinha sido condecorado pelo FBI, depois de coordenar as investigações em Portugal ao ataque das Torres Gémeas a 11 de setembro de 2001, a pedido das autoridades norte-americanas, e que estavam relacionadas com o argelino Sofiane Laib, detido em Lisboa por suspeita de terrorismo.
Desde há três anos que Vítor Magalhães dirige todos os inquéritos-crime sobre as atividades da ETA em Portugal, liderando atualmente a equipa luso-espanhola de investigação ao grupo armado basco, estreando em janeiro deste ano a aplicação da nova lei contra o terrorismo, com a qual conseguiu garantir a prisão de dois etarras intercetados pela GNR em Torre de Moncorvo.
Na última década, Magalhães conduziu ainda as três maiores apreensões de cocaína em território nacional (nove, oito e sete toneladas) e orientou o inquérito do caso conhecido como as ‘Marias de Arraiolos’, protagonizado por três mulheres que acabaram presas na Venezuela, ao embarcarem num avião particular com malas carregadas de cocaína. Entre os casos mais mediáticos do procurador estão também as investigações a uma rede criminosa italiana de falsificação de cheques que levou a 40 condenações em tribunal e a duas máfias de Leste que operavam em Portugal.

António Paes de Faria (à esquerda na fotografia), de 50 anos, tornou-se magistrado em 1986 e está no DCIAP desde setembro de 2007.
É um dos 18 membros do Conselho Superior do Ministério Público, o órgão que gere as carreiras dos magistrados e tudo o que tem que ver com disciplina, incluindo a instauração de inquéritos internos e a decisão de sanções. Paes de Faria foi eleito pelos seus pares para os representar no Conselho. Além dele, nas mesmas condições, só se sentam à mesa mais um procurador, um procurador-geral-adjunto e quatro procuradores-adjuntos.
Paes de Faria começou como estagiário na comarca de Santiago do Cacém. Depois foi transferido para Cascais, de onde só saiu quando foi requisitado em 1996 para ser assessor jurídico no gabinete de João Cravinho, então ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, no primeiro governo socialista de António Guterres. Em 1998 foi nomeado subdiretor da Polícia Judiciária em Macau, onde esteve um ano, antes de regressar à comarca de Cascais.
No princípio de 2008, já depois de estar no DCIAP, Paes de Faria foi encarregado pela diretora do departamento de investigar o envolvimento de Portugal no programa ilegal dos voos da CIA, que incluíam passagens por aeroportos nacionais em missões de rapto de suspeitos de terrorismo. O inquérito foi arquivado em junho de 2009, sem acusados. Nessa altura, o procurador já estava há nove meses com o ‘processo Freeport’.

Estes dados biográficos dos procuradores do caso Freeport foram divulgados pelo Expresso em 07.08.2010. Quando se analisa estas carreiras, à luz da depreciação pública a que os procuradores têm estado sujeitos, não podem deixar de ser colocadas as seguintes questões:

1. É possível ignorar, de um pé para a mão, apenas por razões instrumentais, as provas dadas por estes procuradores, e o seu profissionalismo, na luta contra o crime organizado ao longo de décadas ?

2. Podemos aceitar de ânimo leve que estes procuradores, com este percurso de vida, tenham deixado que o seu trabalho de investigação fosse manchado por mero ódio a José Sócrates ? Será razoável admitir que estamos perante um ódio simultâneo de dois procuradores que nunca haviam sequer trabalhado em conjunto anteriormente ?

3. Tem estado activa uma campanha mediática, nas últimas semanas, que não hesita em questionar a honorabilidade dos procuradores em nome do direito ao bom nome do primeiro-ministro. Mas tal campanha tem respeitado o direito ao bom nome dos procuradores ? E não será esse bom nome dos procuradores tanto ou mais real do que o hipotético bom nome do primeiro-ministro ?
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