sexta-feira, novembro 15, 2024

ANORA


 

ANORA
O filme conta uma grande história e, como todos os bons filmes, diverte e emociona.
Uma striper novaiorquina é pedida em casamento pelo filho de uns mafiosos milionários russos.
O filme mostra a trabalheira que é anular um casamento, mesmo em Las Vegas. Uma boa surpresa para quem, como eu, pensava ir só ver um thriller.
(Anora é o nome da noiva e nada tem a ver com o parentesco embora ela seja "a nora" dos russos)

segunda-feira, outubro 28, 2024

A Chantagem da Publicidade




A Chantagem da Publicidade
A decisão do governo de acabar com a publicidade na RTP, gradualmente ao longo de três anos, desencadeou várias reações de partidos de esquerda que considero surpreendentes.
Toda a gente parece ter interiorizado que não temos outro remédio se não aturarmos os abusos da publicidade.
Ninguém se insurge contra a publicidade, sequer contra os seus excessos e desmandos. Nem os que sempre verberam a influência dos “privados”, nem os ambientalistas perante a promoção do consumismo, nem os puristas da cultura mesmo quando Mozart é posto a ajudar na venda de sapatos, nem os zelosos da alimentação saudável quando vêem promover hamburgueres de sete pisos, nem os caçadores de “fake news” quando as encontram por todo o lado nos spots publicitários.
Nos anos 70, depois da revolução em Portugal, começou a ser viável visitar a URSS. Muitos dos que lá iam revelavam uma certa desilusão por um motivo algo caricato; não tinham visto anúncios publicitários nas ruas de Moscovo.
Também hoje parece não se conceber uma televisão sem publicidade. E a verdade é que, com excepção da RTP, as televisões, tal como funcionam, não conseguiriam sobreviver sem publicidade.
Temos assim uma situação estranha; os meios de comunicação, que são um pilar da democracia, só conseguem sobreviver com publicidade. Aqueles que desconfiam constantemente da interferência dos poderosos nos conteúdos da informação não acham isto perigoso? Quando o dinheiro dos anunciantes serve para pagar comentadores desde a estrema esquerda à estrema direita podemos ainda falar, sem receios, da liberdade de imprensa?
E os “conteúdos de entretenimento”, tantas vezes meras fábricas de audiências para despejar publicidade, não os achamos deprimentes, ou até pavorosos?
Já sei que me vão dizer: sem a publicidade não haveria isto nem aquilo nem aqueloutro.
Conformamo-nos então com esta chantagem?

sexta-feira, outubro 11, 2024

Envelhecer


 

terça-feira, outubro 01, 2024

PALESTINA


 

quinta-feira, agosto 22, 2024

Please


 

Please

segunda-feira, agosto 12, 2024

Deixemos a baixa como sala de visitas


Deixemos a baixa como sala de visitas,
onde recebemos e confraternizamos com os estrangeiros que nos procuram. Ninguém leva as visitas para o quarto de dormir.
Lisboetas a viver na Baixa seriam sempre uma ínfima minoria de endinheirados.
Passei ontem a tarde na Baixa. Fui visitar o MUDE. Os estrangeiros dão à Baixa um ar de festa, não me incomodam nada.
Vivo na freguesia da Portela e Moscavide. Tenho jardins, estacionamento e calma. Quando me quero divertir vou à Baixa onde não gostaria de viver (mesmo antes de haver lá muitos turistas)

terça-feira, agosto 06, 2024

O centro de Lisboa como “mito urbano”


O centro de Lisboa como “mito urbano”


Partidos jovens, ou influenciados por jovens, falam constantemente de um mítico “centro de Lisboa” e propõe-se voltar a um tempo bucólico que não existiu.
Culpam os turistas e o “alojamento local” da “gentrificação”, como se a Baixa tivesse sido alguma vez um bairro popular onde as vizinhas pediam salsa umas às outras pela janela.
Por acaso trabalhei numa loja da Rua Augusta nos anos cinquenta e nunca vi tal coisa. Em Alfama, Mouraria e quejandos esse mundo existiu mas até há pouco tempo não passava pela cabeça a ninguém ir morar para aquelas casas decrépitas, sem comodidades.
Na baixa os bancos tomaram conta de quarteirões inteiros e ninguém tinha dinheiro para comprar lá uma casa, mesmo que quisesse viver no meio do frenesim.
As pessoas da classe média, do funcionalismo, procuravam casas modernas em ruas desafogadas nas avenidas novas, na Avenida de Roma ou em Alvalade.
Os menos endinheirados, os pequenos lojistas, os pequenos empregados e caixeiros, iam para mais longe.
Os meus pais foram para a Alameda das Linhas de Torres para viverem numa casa moderna.
Eu próprio, nos anos setenta, com dois bons ordenados da IBM, fui viver para a Urb da Portela, entre Moscavide e Sacavém.
Se alguém me tivesse então sugerido o “centro de Lisboa” teria soltado umas boas gargalhadas.
Haja pachorra

terça-feira, junho 25, 2024

Resolvam e calem-se


 

segunda-feira, maio 20, 2024

Tratado para acabar, de vez, com uma discussão estúpida.


Tratado para acabar, de vez, com uma discussão estúpida.
Decidi proceder à exegese minuciosa do discurso que tem paralisado o país, de comoção, nos últimos dias. Dois singelos parágrafos bastaram para despromover ao segundo plano o aeroporto, a redução do IRS, as polícias, os professores e outras classes carenciadas.
A bolha política exige, no entanto, saber se a liberdade de expressão contém, ou não, o direito ao despautério e às ofensas imateriais.
Debruçado sobre o texto o que é que eu encontro:
1. O Ventura acha que nós estamos abaixo de cão (sem ofensa) pois só fazendo um grande esforço alcançaremos o nível de turcos, chineses e albaneses.
2. Nada diz sobre os aeroportos de Pequim e de Tirana mas assevera que o de Istambul só tardou cinco anos.
3. Menciona aquilo que, em sua opinião, é voz corrente sobre a falta de laboriosidade dos turcos. O Ventura parece querer contrariar tal ideia preconceituosa precisamente com base na realização do supracitado aeroporto.
4. Notem que o Ventura não se atreveu a mencionar a laboriosidade dos chineses ou dos albaneses. A dos chineses porque toda a gente sabe que têm as lojas abertas mesmo em domingos e feriados. Quanto aos albaneses creio que, já de há muito, ninguém faz ideia do que lá se passa.
5. É verdade que as generalizações são sempre problemáticas; os orientais nem sempre são lentos e os rurais podem não ser imprevisíveis. Mesmo os espanhóis, com quem detesto viajar pois receio a queda do avião em consequência da barulheira, devem também em certos casos ser pessoas normais (sem ofensa).
6. Conclui-se então que não houve racismo pois os turcos são tão caucasianos como nós e que os únicos ofendidos são os portugueses por causa das acusações de inépcia.
7. Assim sendo recomendo a todos os portugueses que não votem Chega nas próximas eleições

terça-feira, maio 07, 2024

Tricórnio


 

sexta-feira, abril 26, 2024

O Grande Azdak


 

sexta-feira, abril 05, 2024

O Adeus de Costa


 

O Adeus de Costa
Neste dia em que Costa se despede do cargo de Primeiro Ministro, depois de 8 anos de governos, decidi partilhar o que considero ser o seu pior legado; a emergência e crescimento do Chega.
Existindo partidos populistas de direita em países europeus há décadas faz sentido perguntar por que razão em Portugal isso aconteceu precisamente em 2019.
O partido de André Ventura foi criado na fase final do "governo da Geringonça". A tempo de umas eleições legislativas que tiveram o mais pequeno número de votantes do século XXI, o que pode legitimamente ser visto como resultado de uma sensação de impotência dos eleitores.
Quatro anos antes, em 2015, António Costa tinha quebrado um conjunto de práticas políticas como, por exemplo, aceitar o governo da força mais votada e eleger para presidente da AR o candidato da força mais votada.
Tais rupturas tiveram inúmeras consequências como ainda recentemente se verificou na eleição da presidência da AR; o que teria sido "normal" era o PS votar Aguiar-Branco logo na primeira votação, como era tradição.
O arranjo parlamentar que permitiu o "governo da Geringonça" levou a uma descrença no sistema eleitoral, um desencorajamento do voto, a sensação de que não bastava ter mais votos, a ideia de que nessas condições a direita dificilmente voltaria ao poder.
Quando se olha para os resultados eleitorais de 2024 tais temores parecem ridículos; ficou demonstrado, ao fim de oito anos, que a "aliança à esquerda" não constituía uma solução duradoira; foi um mero estratagema conjuntural que conduziu ao afundamento nas urnas dos parceiros do PS na Geringonça.
Mas o PS não se limitou a criar condições para o surgimento do Chega, passou os últimos anos a desejar e propiciar o seu crescimento convencido de que Ventura engordaria só à custa do CDS e PSD.
Agora que temos o "elefante" na AR, com base nos abstencionistas que a governação imprudente foi varrendo para debaixo do tapete, aqui-del-rei.
O Costa sai de cena com a questionável glória das "contas certas" depois da habilidade de transferir o "enorme aumento de impostos" dos directos para os indirectos, ou seja, "sem dor".
E de reduzir brutalmente o investimento, o que teve um impacto enorme na degradação da Educação, da Saude, da Habitação e até das Forças Armadas.
É caso para perguntar "ri de quê?".

domingo, março 31, 2024

EQUADOR



Também já tive os meus cinco minutos de glória.
Precisamente em Agosto de 1967.
Fui colega, na revista "Equador", de nomes como Alexandre O'Neal, Eduardo Prado Coelho e outros que hoje veneramos. De todos eles só conhecia, e convivia, com o musicólogo e professor Mário Vieira de Carvalho (M.V.C.), dois anos mais velho do que eu e a quem, nesses tempos de juventude, chamávamos "Vieirinha".
A revista "Equador", obra do Diamantino Ramos de Almeida (que nunca mais vi), desapareceu logo a seguir. Pertencia à numerosa família das que só publicam o primeiro número.
A minha participação na revista, a convite do Diamantino, consistiu em figurar na capa e escrever um artigo sobre a história do cineclubismo (coisa em que então, nos meus 21 anos, estava envolvido).
A fotografia da capa (sou o da direita) foi feita em casa do arquitecto Sardinha, algures no largo da Graça. O Sardinha é o da esquerda e abarbatou-se ao cachimbo privando-me assim da farda de intelectual (que eu realmente praticava).
O texto que publiquei na "Equador" acerca do cineclubismo foi uma solução de recurso já que o convite inicial visava um poema; quando o material foi sujeito ao visto prévio da censura o meu poema foi alvo do lápis azul e teve que ser substituído.
A revista tinha tido uma longa e conturbada génese. Foi uma realização fantástica se considerarmos a época em que ocorreu, com todo o tipo de dificuldades económicas e políticas.
Quando o Diamantino anunciou as suas intenções no café Chaimite, à Paiva Couceiro, onde eu o tinha conhecido, o grupo de jovens a que pertencíamos considerou o projecto improvável.
O Diamantino Ramos de Almeida, a que toda a gente se referia como "o Doutor", trajava sempre um fato cinzento e gravata escura. Sofria de uma obscura doença (constava que se tratava de coreia) que se manifestava por movimentos bruscos e pouco controlados. Falava com dificuldade o que se notava nos movimentos do pescoço e no esgar facial na emissão das palavras.
Ou nunca soube, ou então não me lembro, por que razão lhe chamavam doutor.
À medida que o tempo ia passando sem que a revista saísse o maralhal, quase tudo estudantes universitários, foi subindo de tom na ridicularização do projecto. A coisa só não era mais achicalhante por beneficiar, o "Doutor", de consideração e estima geral.
E pronto, em Agosto de 1967, a "Equador" apareceu e com isso o Diamantino deu uma enorme lição aos seus detractores.
Um mês depois eu fui para a Marinha, e depois para a guerra da Guiné, e não tornei a ver o Diamantino. Restou-me um exemplar, certamente raro, da revista "Equador".

sexta-feira, março 22, 2024

A grande lição dos votos em Baleizão


A grande lição dos votos em Baleizão
O Expresso publicou uma entrevista com a filha de Catarina Eufémia, a heroína comunista do Baleizão.
Ela explica o que tornou possível o declínio do Partido, numa terra que foi o seu "santuário".
Em Lisboa, do alto dos grandes princípios abstractos, não se avistam as insignificantes aldeias alentejanas.
Quem não percebe o que é uma aldeia, uma taberna de aldeia, nunca perceberá as "sensações de insegurança" de que falava o outro.
Quem raciocina com base na média nacional da percentagem de emigrantes não percebe que em certas aldeias se está muito acima da média.
O problema é que as aldeias (e as sensações) são muitas e portanto os votos no Chega multiplicam-se.
Quem é que assume a responsabilidade por este desfecho?
Não basta arrancar os cabelos e gritar que "vem aí o fascismo"!!!

quinta-feira, março 21, 2024

Política de ficção




O regresso às urnas de milhares de portugueses, em 2024, provocou um cataclismo político. Percebemos subitamente que o “cenário” político em que temos vivido é uma ficção.
Um partido que, ainda há pouco, se temia pudesse perpetuar-se no poder com a sua maioria absoluta foi reduzido aos 28% de um momento para o outro.
Tudo isso se deve ao facto de termos, durante demasiado tempo, interpretado a abstenção como um sinal de desinteresse e apatia política; agora ficou claro que, pelo menos em parte, a abstenção resulta de irritação e impotência dos eleitores que se cansaram dos partidos “velhos” e não se revêem nos partidos “novos”.
Quando olhamos para o gráfico do número de votantes ao longo do século XXI podemos portanto perceber, pelo afastamento ou regresso dos eleitores, que governos os afastaram e que oposições os trouxeram de volta.
Nas eleições legislativas de 2005 verificou-se uma grande participação eleitoral (5.713.640) presumivelmente resultante da retórica com que Sócrates se candidatou, um tanto fora da caixa, com laivos de justiceiro contra os interesses instalados.
A partir de 2005 o número de votantes baixou sempre, atingindo o seu valor mais baixo em 2019 (5.251.064), logo a seguir ao governo da “Geringonça”.
Digamos que em 2019 a “gaveta” dos irritados e impotentes estava a abarrotar; talvez não por acaso foi nesse ano que se constituiu o partido Chega.
O aumento de votantes em 2022 (5.389.705) e a explosão da participação eleitoral em 2024 (6.473.789) não podem deixar de ser associados à emergência e afirmação do Chega.
Bem ou mal, os irritados e impotentes abstencionistas tinham finalmente encontrado uma forma de se expressar politicamente, e fizeram-no com estrondo.
A democracia adormecida que durante muito tempo varrera a contestação para debaixo do tapete, acordou do seu sonho. De repente já nada é como era, e percebemos todos que a nossa vida política tinha bases instáveis.
Mais perturbante ainda é o facto de na “gaveta” da abstenção ainda estarem muitas centenas de milhares de portugueses que esperam não sabemos o quê para voltar a votar.

quinta-feira, março 14, 2024

Já o avô dizia


 

sábado, março 09, 2024

Vergonha


Vergonha
50 anos passados do 25 de Abril a nossa democracia está doente. A campanha eleitoral que terminou ontem, nos termos em que foi feita, devia fazer-nos pensar maduramente.
É verdade que temos agora a praga do populismo, mas é preciso reconhecer que esses partidos já quase só se distinguem pelo grau de boçalidade. O debate político chega a ser mais irracional, e caótico, do que os programas televisivos do futebol.
Os candidatos "responsáveis", quase todos, mentem descaradamente, usam meias verdades, deturpam os discursos alheios e abusam de manipulações semânticas.
Os candidatos "responsáveis", quase todos, diabolizam os adversários, arrogam-se o exclusivo da defesa do povo, fazem apelo a todo o tipo de medos, fanatismos e baixos instintos.
Os candidatos "responsáveis", quase todos, fazem da política um concurso de promessas, mesmo as mais inverosímeis à luz da sua prática anterior e omitem os grandes desafios geopolíticos, tecnológicos e do ambiente.
Em suma, durante 50 anos pouco aprendemos.

sexta-feira, março 08, 2024

E SE?


 

E se, estas eleições que tanto nos excitam não passassem de uma encenação de António Costa, para fugir para a Europa e deixar a batata quente ao Montenegro ou ao Pedro Nuno?
E se o Costa tiver percebido que com a guerra a alastrar pelo mundo, pode vir aí uma nova inflação, o Trump vai regressar e vamos ter que gastar rios de dinheiro a recuperar as nossas forças armadas?
E se o Costa percebeu que os dinheiros europeus vão ser canalizados para a Ucrânia e as corporações profissionais estão todas de faca afiada para o próximo governo?
E se o Costa decidiu evitar esses tempos difíceis e perigosos para Portugal indo para um cargo europeu sem o ónus de ter fugido como Durão Barroso?
E se o Costa tiver pedido à PGR, que até foi escolhida por ele, que escrevesse um parágrafo que servisse de pretexto para a sua demissão?
E se o Costa preferir deixar governar a AD nos anos de crise internacional para depois o PS surgir, salvador, a virar a página mais uma vez?
E se o Costa, ao mandar o incauto Pedro Nuno para a cabeça do touro, matar afinal dois coelhos com uma cajadada?
E se o Costa com esta brilhante jogada se salvar ele próprio de uma derrota eleitoral, minando a carreira do Pedro Nuno e abrindo caminho ao seu delfim na próxima legislatura?
E se o Costa, depois de tudo o que fez, assistir a este filme confortávelmente instalado em Bruxelas?
Desejo-vos um bom dia de reflexão.

segunda-feira, fevereiro 05, 2024

Pobres Criaturas


Pobres Criaturas
A história, cruamente, é a seguinte: uma mulher grávida atira-se de uma ponte. Um cirurgião, ele próprio uma versão do Frankenstein, recupera os corpos recém falecidos e transplanta o cérebro do feto para o crânio da mãe.
Um percurso feito ao contrário; todos nós, no processo de crescer, recebemos algum do “cérebro dos pais” e não dos filhos.
Este estratagema inverosímil, criado pelo grego Yorgos Lanthimos, a partir de um livro de Alasdair Grey, vagamente situado no virar do século XIX para o XX, faz-nos percorrer uma via sacra de consequências exóticas e chocantes. Um cérebro infantil, que acaba de descobrir o mundo num corpo de mulher adulta, permite-nos espreitar o que somos antes de sermos o indivíduo social.
A trama desafia-nos ao longo de duas horas e meia para temas como a educação, o erotismo e o sexo, a parentalidade, as imposições da sociedade, a ética médica, a manipulação, o livre arbítrio, a “perversidade” infantil, etc, etc.
Presenciar “Pobres Criaturas” pode ser considerado uma experiência, mais do que um espectáculo, tão íntimas são as questões em que nos obriga a remexer.
Uma experiência da qual ninguém sairá como entrou.
Os ambientes criados para o filme são oníricos, talvez por pretenderem mostrar a maneira infantil de ver o mundo.
A certa altura a criança/mulher Bella Baxter (Emma Stone), escapa ao seu criador Godwin Baxter (Willem Dafoe), a quem sempre trata por God, para descobrir o mundo.
Nesse percurso passa por Lisboa com o seu amante, meramente instrumental, já que Bella não estabelece qualquer relação entre sexo e afectividade. A cidade que ela vê é fabulosa, com carros eléctricos pelo céu, e uma fonte compulsiva de pastéis de nata. Curiosamente, é num navio que parte de Lisboa para novas aventuras.
Quis o acaso que eu visse “Pobres Criaturas” quando estava a ler “A Civilização do Espectáculo”, de Vargas Llosa, e concretamente o capítulo “IV. O desaparecimento do erotismo”.
Uma parte substancial do filme são as peripécias resultantes da atracção sexual que Bella, uma bela mulher, desperta nos incautos masculinos; mostra como eles estão impreparados para um jogo em que a parceira, para seu desespero, quebra todas as regras.
O cérebro infantil ainda não tem a maturidade suficiente para perceber toda a teia de questões psicológicas e sociais que envolvem a actividade sexual, muito para além da componente meramente física e, no limite, meramente animal.
Ao ver como Bella descobre o seu corpo percebemos melhor as reservas postas por Llosa, no seu livro, relativamente aos “workshops de masturbação” organizados pela Junta da Estremadura, para meninos e meninas a partir dos 14 anos, com o delicioso nome “O Prazer Está nas Tuas Mãos”.
Termino com palavras de Vargas Llosa extraídas do livro acima mencionado:
“O sexo desempenhou um papel de destaque na criação do indivíduo e, como mostrou Sigmund Freud, nesse domínio, o mais recôndito da soberania individual, forjam-se as características distintivas de cada personalidade, o que nos é próprio e nos torna diferentes dos outros. Esse é um domínio privado e secreto e deveríamos procurar que continue a sê-lo se não quisermos tapar uma das fontes mais intensas do prazer e da criatividade, isto é, da civilização”.