quarta-feira, março 24, 2010

Radicalismos súbitos

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O governo da China bloqueou ontem o acesso ao site do Google que funciona a partir de servidores de Hong Kong. Com isso, usuários chineses não conseguem ver o conteúdo não censurado do site alternativo, segundo a edição online do The New York Times.
A medida da Google de redirecionar as buscas foi uma tentativa de driblar a censura imposta às ferramentas Google Search, Google News e Google Images. A estratégia, é claro, não agradou à China, que, por meio de um porta-voz do Escritório de Informação do Conselho de Estado, acusou a empresa de quebrar uma promessa feita por escrito, quando o site começou a funcionar no país, em 2006.
O governo chinês, aliás, agiu rápido para evitar que os conteúdos censurados no Google pudessem ser acessados com a transferência de dados para Hong Kong. A busca por palavras ou expressões que remetessem para assuntos proibidos no país, como “Tibet”, nomes de alguns movimentos religiosos e a famosa manifestação pela democracia na Praça Tian-an-men, em 1989, não era completada e mensagens de erros ou problemas na conexão apareciam no programa de navegação na internet.

Causa-me alguma perplexidades este radicalismo súbito da Google, depois de vários anos de contemporizações. Parece um ataque de purismo fora de tempo e permite interpretações que atribuem a sua decisão à incapacidade para aceitar a posição minoritária (30%) do seu motor de busca na China.

A decisão de afrontar um poder como aquele que representa o governo da China, se por um lado exige coragem por outro devia apoiar-se na razoabilidade. Para os chineses e para a abertura democrática da China seria talvez mais apropriado que a Google evitasse este conflito.

É realmente muito má a supressão de certas informações nas buscas mas o mundo não se esgota no Tibete nem na praça Tian-an-men. Há milhões de outras palavras para além dessas que os chineses precisam de continuar a pesquisar para conhecer o mundo.

 

13 comentários:

1 Espectador "Sociedade Civil" disse...

Muito Boa Tarde,

Aproveito a minha regular visita ao seu espaço para informar a abertura de um novo blog dedicado exclusivamente ao debate de temas falados no programa de televisão Sociedade Civil. Como espectador, este meu novo espaço visa expressar as minhas opiniões sobre o assunto falado no dia. Aproveito a minha passagem pelo seu blog para divulgar, para que todos visitem e que sigam este blog. Serão todos bem vindos, bem como a colocação de links está em aberto. Se a colocação for feita neste seu espaço, colocarei também no meu, basta informar.

http://umespectador.blogspot.com/

Boa continuação e espero que apareçam.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Estás a bater no condenado, esquecendo o carrasco...

F. Penim Redondo disse...

Caro Espectador SC,
já incluí o seu blog na lista "Sob Suspeita" na barra direita do DOTeCOMe.
Bom trabalho

Vitor M. Trigo disse...

Manuel,
ia reagir como tu, mas adiantaste-te.
Realmente há notícias/comentários que me deixam estupefacto. Aqui está uma delas.
Para a China, toda a compreensão - há que levar as coisas a bem. Pudera, digo eu, é lá que está o dinheiro, a grande produção, e o grande mercado.
Já nem as execuções públicas com tiro na nuca são notícia para os "democratas" ocidentsid. Em Cuba, pelo contrário, o mundo não se cala (e muito bem) com as greves de fome. Cuba é pobre...
Critérios.
PS: Creio que o texto, dados os termos abrasileirados, não é original do Fernando. Não é teu pois naõ, Fernando?

F. Penim Redondo disse...

Vitor,

os parágrafos iniciais são realmente "copy paste" de várias fontes brasileiras.

Quanto à China acho que estás a ver mal o problema.

A China é alvo de uma campanha permanente, e de racismo, que só não passa a vias de facto porque eles agora são ricos e poderosos.
Já reparaste que 90% das notícias sobre a China são sobre explosões em minas, condenações à morte, terramotos, viagens do Dalai Lama e outras desgraças ? Que raio, num país tão grande deve acontecer mais alguma coisa, não achas ?

Eu sei do que estou a falar, conheço o terreno e conheço pessoas que lá vivem. Não sou ingénuo e não cultivo ilusões pois já tive a minha conta de "sóis da terra".

Mas perante uma experiência histórica com a dimensão e os impactos da China ver só, ou principalmente, as limitações da liberdade de expressão ou de organização política, é passar ao lado do essencial.

Vitor M. Trigo disse...

Fernando,

mas eu não estou só a ver as restriçoes à liberdade de expressão nem as condenações à morte. Não as quero é ocultar.

Acho é que aqueles que se dizem grandes defensores dos direitos do homem e da liberdade de expressão (*) depressa os esquecem quando surge alguma oportunidade de negócio na China. E elas surgem todos os dias.
Coloco-os ao nível daqueles que se dizem católicos não-praticantes - pecam toda a semana e até se esquecem de se confessarem ao domingo.

Tive o cuidado de referir que, em comparação com Cuba por exemplo, onde estão a ocorrer greves de fome que terminam com a morte do lutador, existem campanhas por todo o lado, manifestações, abaixo-assinados, inúmeros posts em blogs de todoas as tend~encias, enfim, uma descarada auto-massagem disfarçada de altruismo.

Algumas manifestações serão sentidas, mas acho que a maioria não passa de oportunismo hipócrita.

Obviamente que não fico indiferente a alguns atropelos do governo cubano. Não vivo lá, nem conheço tudo o que lá passa. Mas não consigo condenar, destruindo, um país e um povo tão merecedor do meu respeito.

Defeito meu? Admito-o. Mas quem não tem defeitos?

(*) Sei que poderei enfurecer muita gente, mas olhe-se para o caso Português - quantos ditos defensores da liberdade de expressão (vide as actuias telenovelas envolvendo partidos políticos, AR, grupos empresariais, etc), não estão tratando estes assuntos como uma luta prioritária (única, talvez), fingindo ignorar casos similares noutras paragens?
Como exemplares católicos não-praticantes, esperam um dia alcançar o reino prometido...

F. Penim Redondo disse...

Vitor,

é interessante a comparação entre Cuba e a China.

Ambas partem de uma ortodoxia ideológica mas seguem caminhos bem diferentes.

Os chineses, pragmáticos, têm a "coragem" de utilizar as ferramentas capitalistas para se desenvolverem. Todos os anos tiram dezenas de milhões de pessoas da pobreza e estão a tornar-se uma superpotência.

Os cubanos, mais agarrados aos princípios, apesar de algumas realizações notáveis, vivem numa penúria confrangedora. Todos temos a sensação de que o regime não resistirá ao desaparecimento das suas figuras.

A razão pela qual a China me fascina é tratar-se de uma experiência sócio-política muito original.

É o país onde a ortodoxia comunista atingiu os maiores extremos e, passados 30 anos, gere com sucesso todos os mecanismos do mercado.

Por outro lado tem factores culturais extraordinários. Já Confucio pregava a obediência aos superiores.

Nós em Portugal ainda desculpamos os erros da nossa democracia com os 48 anos de fascismo. Mas na China, que nunca viveu em democracia, eles têm que ultrapassar milhares de anos de poder imperial.

Exigir a democracia na China é fácil nas conversas de café.
Quando olho para a confusão politico-partidária em que estamos metidos hoje, e somos só dez milhões de portugueses, fico aterrado ao imaginar o equivalente numa sociedade com 1.300 milhões de pessoas.

Ou seja, democracia na China sim mas com muito cuidado e num processo muito gradual.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro Fernando,

Apesar de termos mantido posições diferentes e mesmo antagónicas em quase todas as nossas discussões ao longo de décadas, tenho-te por um tipo essencialmente honesto, e olha que não há três ou quatro elogios que eu possa fezer que tenham mais significado para mim do que este.
E se tu dás a este elogio o mesmo valor que eu lhe dou, vais certamente fazer um esforço por me esclarecer como podias há poucas semanas temer que Portugal derivasse para o fascismo pelo simples facto de o governo querer que um grupo de comunicação social fosse comprado por outro que lhe é mais simpático, e agora desvalorizas a censura por um governo dos motores de pesquisa da net?
Como se em Portugal a Google fossem obrigada a censurar pesquisas por "Freeport", "Universidade Independente", "vivendas de azulejo", "Face oculta", "off-shore" ou outras tantas deste calibre...
A mim, isto parece-me uma contradição que não consigo compreender?

Por outro lado, noto no que dizes um desconforto com a capacidade de, em democracia, se gerirem países grandes...
Olha que esse receio é semelhante aos receios da Drª Isilda Pegado de que, dando às pessoas liberdade de escolha em situações como o aborto ou o casamento de homossexuais, a sociedade se desagregue...
São receio infundados.
Os países grandes democráticos são grandes países, e o casamento de homossexuais não vai impedir ninguém de constituir família nem de ter e baptizar os filhos.

F. Penim Redondo disse...

Caro Manuel,

agradeço o teu elogio que, sem falsas modéstias, julgo merecer.

Ao mesmo tempo simplificas e distorces um pouco os termos de uma contradição em que eu, supostamente, teria caído.

1. Eu nunca disse que a compra de uma empresa de media levaria ao fascismo. O que eu tenho dito é que a corrupção, falta de princípios e desprezo pela opinião maioritária da população, quando praticados frequentemente, criam o caldo de cultura de onde surgem os tiranos.
Os partidos e dirigentes políticos têm nos últimos anos andado a brincar com o fogo.

2. Eu não minimizo a importância da censura nas pesquisas do Google. Mas acho que a reacção da empresa é tardia e não se percebe o que se modificou agora para ela deixar de aceitar o que aceitava antes. É legítimo interrogar-nos sobre se há uma agenda política nesta decisão.
Eu compreendo que a China hoje incomoda muita gente e desperta muitas invejas. Mas estou um pouco farto de alguns temas que estão sempre disponíveis para fomentar o medo do "perigo chinês" (O Dalai Lama, as condenações à morte, o Tian-an-men, etc, são martelados com uma regularidade reveladora).

3. Eu sinto desconforto com a capacidade da democracia não só nos países grandes como nos pequenos.
Aceito que não conseguimos ainda inventar algo melhor. Mas a verdade é que na sua forma actual é um estratagema para fazer crer ao povo que tem poder quando, afinal, o poder é exclusivo de uma casta composta por uns escassos milhares de membros.

Na China, por razões históricas, culturais e outras, o Partido Comunista ainda garante bastante bem esse papel de manter o povo calmo sem precisar de recorrer à democracia com que nós nos comprazemos.

Os chineses estão hoje a beneficiar da extraordinária vantagem económica de ter um sistema político estável e onde se sabe muito bem quem manda. É neste momento um dos poucos sítios do mundo onde as pessoas podem legitimamente esperar melhorar as suas condições de vida.

Só defendo a democratização da China por pensar que a situação actual não é sustentável a longo prazo.
Mais cedo ou mais tarde, resolvidos os problemas básicos, os chineses tal como nós precisarão de um Sócrates qualquer que se faça eleger e lhes dê a sensação de que foram eles a determinar o curso dos acontecimentos.
É assim a natureza humana.

Vitor M. Trigo disse...

Fernando,
Acredita que, com todo o respeito, não consigo acompanhar a tua argumentação.
Acreditas no que dizes, muito bem. Mas não consigo acompanhar.
Os chineses têm a coragem de utilizar as ferramentas capitalistas para se desenvolverem? Os cubanos "mais agarrados aos princípios" (e o bloqueio americano é diversão de carnaval?), blá,blá,blá?
Não é nada verdade.
Não basta visitar algumas das impressionantes cidades chinesas para generalizar o progresso do País. Desconheces, por acaso, que não é possível fazer negócios na China, mesmo para as multinacionais, sem corromper alguém? Ignoras os dramáticos atropelos aos mais básicos direitos humanos de quem trabalha como escravos?
É claro que muita gente tem melhorado o seu nível de vida. Pudera, com injecção de tanto capital estrangeiro...
Também ignoras a descomunal explosão de bilionários? Esses devem estar satisfeitíssimos. E consta que muitos (há quem diga que todos) estão directa ou indirectamente ligados ao Partido.
Bom, repito, acredita quem quer.
Surpreende-me, contudo, o fascínio que revelas.
Eu não acredito, e temo um dia que o mundo venha a ser dominado por este tipo de princípios.
A China, para mim, é o paradigma do cinismo e do oportunismo sob a capa de pragmatismo.
O assunto é vasto e tão multifacetado que se torna quase impossível discuti-lo desta forma.
Talvez um dia, presencialmente...

F. Penim Redondo disse...

Vitor,

quando leio o que escreves sobre a China encontro todos os lugares comuns que a "imprensa livre" costuma publicar.

Eu não me satisfaço com a papinha que me querem impingir.É preciso ir mais fundo. Eu tenho feito um esforço, leio livros, visito o país e vejo com os meus próprios olhos como lá se vive (tenho uns milhares de fotografias feitas lá), tento aprender a língua e já consigo comunicar um pouco com os "nativos", falo regularmente com chineses pró e contra o regime, etc.

Sem conhecer a história da China e as barbaridades colonialistas lá cometidas pelo democrático ocidente e pelo Japão, sem considerar as raízes culturais que antecederam desde há milhares de anos o marxismo-leninismo,sem imaginar a miséria extrema e as brutalidades por que passou o povo chinês durante o século XX, não se consegue perceber o significado do renascimento chinês actual.
Parece-me até um pouco ridículo (e colonialista) o paternalismo com que se trata um país gigantesco que já era civilizado quando nós ainda éramos bárbaros.

O sucesso económico da China tem só um segredo: o trabalho abnegado e muito sofrido do seu povo.
Enquanto nós nos concentramos nos nossos direitos para os quais muitas vezes não demos o contributo adequado os chineses trabalham (muito) sem esperar grande coisa do Estado.

Como na história da cigarra e da formiga, no espaço de uma geração eles deixaram de ser um país marginal, miserável e desprezado para se converterem numa das maiores potências económicas do mundo. E a sua população sente os resultados desse progresso no seu dia a dia, todos os dias.
Enquanto nós não conseguimos encontrar um horizonte de esperança e tememos pelo futuro dos nossos filhos e netos.

O que tu realmente temes é que a nossa decadência nos torne subordinados do poder dos chineses. Se isso vier a acontecer é apenas uma inversão do que aconteceu durante séculos de colonialismo ocidental na China, que a ti te parecem certamente muito mais naturais.
São as voltas da história.

Vitor M. Trigo disse...

E o Sócrates é que é arrogante...

F. Penim Redondo disse...

Este artigo de O Globo relata o que eu estava à espera que acontecesse.Reforça a minha ideia de que a Google cometeu um erro.


XANGAI - A Baidu, maior operadora chinesa de serviços de busca, pode elevar suas vendas em mais de 50% este ano caso a batalha entre o Google e Pequim se agrave ainda mais. Investidores parecem já ter incorporado boa parte dessa perspectiva favorável ao preço das ações. (Leia também: Sergey Brin pede que governo dos EUA combata censura chinesa e critica )


Analistas acreditam que a Baidu, cujo nome vem de um antigo poema sobre a busca da perfeição, fique com até metade da receita de buscas do Google na China depois que este fechou seu google.cn e migrou os usuários para um site sediado em Hong Kong esta semana.

A mudança poderia elevar em US$ 330 milhões ao ano o faturamento da Baidu, o que representaria alta de mais de 50% sobre os 4,45 bilhões de yuan (US$ 645 milhões) de receita auferidos em 2009.

Mas com a alta de quase 54% que as ações da companhia registram desde que o Google começou a contestar as autoridades chinesas, em janeiro, os papeis já estão cotados a um múltiplo de 61 vezes, quase três vezes superior ao do Google. O que deixa pouca margem de erro ou decepção à empresa. (Leia também: Godaddy.com segue exemplo do Google e deixa a China )

- As avaliações estão muito altas e as pessoas estão incorporando ao preço a ideia de que o governo chinês vai fechar o acesso ao google.com e google.com.hk no país - disse Eric Wen, diretor de pesquisa de internet na Mirae Asset.

As ações da Baidu fecharam a US$ 594,88 na terça-feira, acima da avaliação média de US$ 567,56 apresentada por 23 analistas consultados pela Thomson Reuters I/B/E/S. Embora os analistas estejam revisando para cima as estimativas de lucros, a StarMine classifica a Baidu na faixa mais baixa de valor em termos de indicadores relativos e inerentes.

Alguns analistas também estão preocupados com o foco apenas doméstico da empresa, o que pode limitar seu crescimento. A companhia pode investir US$ 30 milhões no Japão este ano, um dos poucos mercados estrangeiros em que atua, com um serviço de buscas deficitário e com baixa audiência na concorrência contra gigantes locais como o Yahoo Japan, informou Dick Wei, analista do JPMorgan, em relatório.