quinta-feira, fevereiro 01, 2018

Em vez de balas




Parto para a Guiné no dia 6 de Fevereiro, para percorrer os lugares de há 50 anos e fotografar com a mesma máquina que então usei.

EM VEZ DE BALAS
No dia 1 de Maio de 1968, larguei do Tejo, rumo à Guiné, a bordo da fragata Corte Real. Era então um jovem tenente dos fuzileiros, com 22 anos, recém casado, que interrompera os estudos de Economia na Universidade de Lisboa.

Em Bissau integrei a 6ª Companhia, aquartelada no INAB, junto ao Geba. A nossa missão consistia essencialmente na escolta de combóios de embarcações que levavam abastecimento aos quartéis do Exército.

Subi e desci os principais rios da Guiné comandando, conforme os casos, uma ou duas lanchas de desembarque médias (LDMs). Em ocasiões apoiado por lanchas de fiscalização pequenas (LFPs).

Naveguei no Cacheu até Farim, no Mansoa, no Geba e no Rio Grande de Buba. Liguei por mar a foz desses grandes rios e também fui a Bolama e a Bubaque.
A guerra era uma realidade penosa para quem como eu, jovem militante comunista, se opunha ao domínio colonial e defendia a independência das colónias. Partilhei esse drama pessoal com a minha mulher, Maria Rosa, que trabalhou como professora de História no Liceu Honório Barreto.
A fotografia constituiu para mim um paliativo. Ao fotografar a dignidade do povo guineense, a beleza das suas mulheres, o porte dos seus homens e o encanto das suas crianças, eu tinha a impressão de estar a fazer um gesto de amizade no contexto da guerra. A disparar fotografias em vez de tiros.
É significativo que pouco tenha fotografado da guerra e dos temas militares.
2018 é o cinquentenário da minha chegada a Bissau.
Sinto-me na obrigação de comemorar essa fase tão marcante da minha vida de jovem adulto. Tal como os outros jovens da minha geração aprendi, "no terreno", a grande lição da relatividade da nossa própria cultura.
No dia 6 de Fevereiro parto para a Guiné e percorrer os locais por onde passei, e fotografei, há 50 anos. E voltarei a fotografar lá com a mesma câmara Pentax Spotmatic que então usei.
Está a ser organizada uma exposição das minhas fotografias, feitas em 1968/69, que terá lugar no Centro Cultural Português de Bissau, em 2018. O acervo deverá também ser exposto em Lisboa, no mesmo ano, estando em curso um processo de viabilização no Museu Nacional de Etnologia.
Uma espécie de tributo, pela restituição da memória de uma realidade que em grande medida já não existe.
Fechar-se-á então o ciclo. Como experiência pessoal é uma grande emoção.
Num plano mais geral creio que propiciará reflexões sobre a guerra colonial e sobre a forma como a viam tantos jovens que politicamente a contestavam.

Ver o programa Fotobox aqui:

https://vimeo.com/253468657?ref=fb-share&1




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