sexta-feira, agosto 27, 2021

Testa di Moro


Testa di Moro

Já em 1989, em Siracusa, eu ficara apaixonado pelos jarrões em forma de cabeça, esmaltados e quase sempre polícromos. As lojas que se dedicam a esse comércio tinham sido, e voltaram a ser em 2014, locais de deslumbramento.
Vim a saber que às “testas di moro”, que é como se chamam, está associada uma lenda que, dizem, remonta ao domínio muçulmano por volta do ano 1100.
Uma bela rapariga siciliana, de olhos cor de mar, terá então atraído as atenções de um “mouro”, por quem se apaixonou. O romance ficou em perigo quando se soube que o amante deveria regressar à sua terra natal, onde o esperavam a mulher e os filhos.
Desesperada, a moça decapitou o “mouro”, enquanto ele dormia, e usou a sua cabeça para plantar uma flor no seu terraço. Todos os dias a regava com as suas próprias lágrimas e a flor cresceu bela e desmesuradamente.
Os vizinhos, espantados com tal sucesso, resolveram imitá-lo fazendo, também eles, vasos em forma de cabeça. Assim terá nascido esta tradição siciliana.
Percorridas várias lojas, para poder fazer uma escolha fundamentada, lá tomei a difícil decisão de escolher a que vos mostro.

sexta-feira, agosto 06, 2021

Um dia olhei o espelho e vi um velho


 

Um dia olhei o espelho e vi um velho. Com surpresa mas sem mágoa. Desde criança que invejo os velhos, como baús desconjuntados a transbordar memórias.

Nós somos provavelmente a primeira geração que teve a possibilidade prática de registar, em fotografia, o que viveu do nascimento até à morte. Ao longo de milénios o passado dos velhos só podia ser "visto" em longos monólogos ou, melhor ainda, intuído num inesperado brilho dos seus olhos cansados.
Os velhos são a infinita liberdade de quem não espera nada, de quem espera o nada.