quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Reflexões sobre o referendo IV - Os "radicais" e os "moderados"


Como já afirmei na reflexão nº I, o sim afinou desta vez os temas que queria discutir, limitando-os unicamente a 2: a despenalização da IVG e a resolução do problema do aborto clandestino, com a realização do mesmo, a pedido da mulher, em estabelecimento autorizado. Por isso, não se pode afirmar, e isto tem sido dito por muitos comentadores, que o sim tenha radicalizado a sua argumentação. Marcelo Rebelo de Sousa, num furor que me parece pretender o desmascaramento do sim, tem mesmo vindo a afirmar que a campanha deste campo é light ou que resvala para a unicidade, remetendo para a velha questão da unicidade sindical, defendida à 33 anos pela CGTP (a utilização desta terminologia, por quem é, nada tem de inocente).
No entanto, os profissionais da moderação, tentando distribuir os as culpas pelos dois lados lá vêm mais uma vez falar do radicalismo do sim e do não.
No programa A Quadratura do Círculo, da SIC Notícias, todos os três intervenientes falam dos radicais, apesar de Jorge Coelho ter reconhecido que eles se manifestam mais do lado do não. Pacheco Pereira no seu afã, que eu já denunciei, aqui ao lado, no nosso Fórum, de não ser confundido com os radicais, insiste nas suas posições moderadas. O que se passa com este comentarista é que, quando não se sente obrigado a separara-se dos tais radicais, costuma fazer análises bastante interessantes. Ainda ontem, referiu o peso que a intelectualidade católica, representada por Professores Universitários ou profissionais liberais de reconhecido mérito, têm nas posições defendidas pelo “não”, provocando muitas vezes o próprio espanto da esquerda, que esperava que aquelas posições fossem defendidas pelos pastores e os seus rebanhos e não por tão eméritos cidadãos.
Voltando à dicotomia radicais versus moderados, o não, numa pirueta de última hora, resolve agora que a pergunta é enganadora e que estaria disposto a, se vencer, propor de imediato uma alteração legislativa que despenalizasse as mulheres que praticam a IVG. Pretendendo afirmar, neste passo de mágica, que se cedeu na parte referente à despenalização, compete agora à outra parte manter o aborto clandestino (é evidente que os termos são meus). E quando Sócrates afirma o óbvio, quem votar não está a pugnar pela manutenção da actual situação, Marques Mendes, utilizando a demagogia mais asquerosa, classifica Sócrates, quem o diria, de radical e extremista. Ou seja, o que é proposto, em vésperas de realização de um referendo popular, é que Sócrates e Marques Mendes se encontrassem, e nas costas dos eleitores, tal como o fizeram, há 8 anos, Marcelo e Guterres ao arrepio da decisão da Assembleia da República, dividiam a pergunta ao meio e Sócrates ficava com a despenalização e Marques Mendes com a manutenção do aborto clandestino. Ora isto é impensável e revela uma profunda má fé. Mas, mais uma vez, o que se pretende é lançar sobre o adversário o epíteto de radical. Tal como o representante do PSD no “Debate da Nação” na RTP 1, acusou, a insuspeita Lídia Jorge, de radical e insensível, porque nos Prós e Contras tinha chamado coisa ao feto. Ou seja, desde o princípio, que aquilo que se pretende é acusar os defensores do sim de radicais, de modo a isolá-los e acantoná-los às posições do Bloco de Esquerda e às suas posições ditas fracturantes sobre a sociedade.
Não queria terminar, sem chamar a atenção para um texto de Rui Ramos, um dos ideólogos do neo-conservadorismo nacional, que, em artigo de opinião no “Público” de quarta-feira, entende que o referendo não serve para nada e que resulta do manobrismo político de alguma central da subversão contra os partidos do centrão político. E mais uma vez, para ilustrar tão brilhante reflexão, lá vem a fotografia de uma barriga de mulher com a inscrição aqui mando eu, tentando encostar o sim à radicalidade. No dia 11 iremos saber se tão perigosos radicais venceram ou foram mais uma vez encostados á parede pelo Portugal Católico e Bem-pensante.

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