terça-feira, novembro 29, 2005

A discussão presidencial que ninguém faz

_________________________________________________ Escher


Tenho escrito que considero a campanha eleitoral para a Presidência, pelo menos nos moldes em que está a decorrer, não só inútil como eventualmente mistificadora (post do dia 22 de Novembro).

Não quero porém que tal possa ser confundido com a desvalorização da escolha que vai ser feita a 22 de Janeiro (e na eventual segunda volta).

Se considerarmos que o candidato eleito pode vir a ocupar o cargo durante dez anos facilmente concluímos que, durante um período com essa extensão, podem ocorrer crises de magnitude incomum.

A discussão à volta das presidenciais tem sido feita de fait divers como se o Presidente da República nunca pudesse vir a ser confrontado senão com as crises "de opereta" do tipo Guterres ou Santana Lopes. O refrão continua a ser a "magistratura de influência".

Devíamos estar, isso sim, a discutir a capacidade dos candidatos para enfrentar situações de ruptura do "regular funcionamento das instituições" como:

- Boicote activo por parte dos agentes judiciais, "em guerra" com o executivo, que levasse à paralisação duradoura do sistema de justiça.

- Boicote da participação de Portugal em missões armadas no exterior por parte das estruturas representativas dos militares seguida de crise de autoridade, persistente, na cadeia de comando.

- Suspensão generalizada do fornecimento de medicamentos à população como forma de pressão do lobby das farmácias e da indústria farmacêutica seguida de retaliação judicial ineficaz desencadeada pelo governo.

- Surgimento de um movimento de desobediência civil implicando a não declaração de impostos por parte de milhares de cidadãos, com base na injustiça fiscal, secundado por uma parte dos partidos parlamentares.

- Declaração de greve às sessões da Assembleia da República por um número significativo de deputados, em claro desafio ao sistema, como resultado dos "ataques" às suas prerrogativas e à "devassa" das suas vidas privadas pela polícia judiciária.

- Generalização de motins na periferia de Lisboa, nos bairros degradados habitados por imigrantes, que as forças de segurança, desmotivadas, se recusaram a "controlar".

- Suspensão dos fornecimentos dos serviços municipalizados (água, electricidade) como forma de pressão "regional" para "corrigir" as transferências do poder central.

Infelizmente a deterioração da situação económica e orçamental do país tornam estes cenários, e muitos outros ao alcance da imaginação, não só possíveis como quase prováveis.

O Presidente, seja ele quem for e queira ou não queira, pode vir a ser o fiel da balança, a autoridade que se impõe sem recurso das partes ou mesmo a última instância antes do caos.

segunda-feira, novembro 28, 2005

As lentes da MundiVISÃO



Se as ideologias são os óculos da mente então tudo o que vemos, e não vemos, depende de comprarmos as lentes certas à MundiVISÃO.


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sábado, novembro 26, 2005

A questão fundamental



"Um meu amigo, mas rival nas eleições (Manuel Alegre), afirmou que dorme descansado com Cavaco Silva em Belém. A seguir veio o outro (Jerónimo de Sousa) dizer que não dorme ele, nem os trabalhadores. Eu estou de acordo com Jerónimo de Sousa, porque também não durmo descansado".
Mário Soares em Beja.


Os candidatos à presidência dividem-se portanto em dois grupos fundamentais: aqueles que dormirão descansados a partir de 22 de Janeiro (Alegre e presumivelmente Louçã) e aqueles que não dormirão descansados (Soares, Jerónimo e presumivelmente Cavaco).

Antigas dicotomias como esquerda/direita ou liberalismo/estatismo parecem estar completamente fora de moda na conjuntura actual.

O futuro ameaça com dramáticas disputas pela escassez do XANAX.

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quinta-feira, novembro 24, 2005

É só escolher...



As zebras são todas diferentes umas das outras.
O que é difícil é perceber em quê.


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terça-feira, novembro 22, 2005

Atropelamento e fuga



A campanha para as presidenciais é em grande medida inútil e corre o risco de se tornar, em vez de uma campanha de esclarecimento, numa "campanha de obscurecimento".

Os principais concorrentes são velhos conhecidos do povo português, frequentaram um grande número de eleições, exerceram cargos públicos durante muitos anos, deram milhares de entrevistas. É caso para perguntar o que temos para descobrir nesta campanha que não saibamos já "de ciência certa" com base na mãe de toda a sabedoria, a experiência. Nada.

Sendo a eleição para um cargo unipessoal é marcada fundamentalmente pela "personalidade e qualidades" dos candidatos; os próprios manifestos são a vários títulos irrelevantes (por causa dos limites constitucionais da acção presidencial mas também porque, como temos visto, as garantias dadas nas campanhas são fácilmente desrespeitadas com o pretexto da mudança das circunstâncias). A personalidade dos candidatos está o povo farto de conhecer.

Assim sendo devemos concluir que a campanha só pode ser usada para mistificar, para impor uma nova imagem dos candidatos que obscureça aquela que a experiência vivida construiu na mente dos eleitores.

-O Cavaco quer deixar de ser apenas o competente mas hirto professor de finanças para ser o avô preocupado com os desfavorecidos e com o futuro da nação.

-O Soares quer deixar de ser o padrinho da esquerda, de charuto bem almoçado, para se converter no paladino da luta contra o capitalismo (desde que seja selvagem).

-O Alegre já não será o poeta que passa a vida a planear as pescarias e caçadas para se tornar o "sem abrigo" dos partidos com que sempre pactuou.

-O Jerónimo e o Louçã, honra lhes seja feita, não mudaram o discurso. Apoiam todas as reivindicações e direitos adquiridos sem cuidarem de explicar quem vai pagar a conta (o Jerónimo chegou ao ponto, esta ouvi eu, de dizer que os juizes não são uma elite).


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domingo, novembro 20, 2005

Short Cuts



Por obra e graça do canal Hollywood tive a oportunidade recente de rever (e gravar) o filme "Short Cuts - Vidas Cruzadas" dirigido por Robert Altman em 1993.

Quando o vi pela primeira vez, há uns anos, fiquei profundamente impressionado. Ao revê-lo agora apenas confirmei que se trata de um filme extraordinário.

Mostra (durante três horas) um certo número de vidas "entrelaçadas" o que só por si está longe de ser original e até tem produzido alguns filmes detestáveis. Os motivos de interesse são outros.

Um polícia, um médico, uma "palhaço ao domicílio" que anima festas de aniversário, uma pintora, uma empregada de balcão numa cafetaria, um limpador de piscinas, um comentador de TV, uma prestadora de serviços pornográficos via telefone, uma violoncelista, um condutor de limousine para encontros amorosos, um piloto de helicóptero, uma cantora de jazz, um decorador de bolos comemorativos, um maquilhador de efeitos especiais e outros, cruzam-se e voltam a cruzar-se (em Los Angeles, como no excelente "Colisão" que ainda recentemente comentámos).

A lista das profissões, onde não figura nenhuma ligada à produção de mercadorias convencionais, mostra uma sociedade "desenvolvida" com grande pendor para os "serviços interpessoais" e onde a "classe operária" ou desapareceu ou é invisível.

As relações afectivas mostram-se ressequidas e distorcidas como se estivessem atacadas por uma praga (curiosamente o filme decorre sob o pano de fundo de uma praga de moscas que os helicópteros todas as noites tentam envenenar aspergindo químicos sobre a cidade).

Com o decorrer da acção vamos intuindo que o mal-estar e, depois, a tragédia radicam na mercantilização de gestos e comportamentos que costumavam situar-se no plano das relações afectivas, tornando "profissionais" as relações que deviam ser íntimas e fazendo cair as barreiras que costumavam separar as amizades, a família e os afectos da luta, quantas vezes impiedosa, pela sobrevivência económica.

Aqueles que ainda pensam que a alienação resulta da preponderância das coisas no relacionamento entre os humanos deviam perceber que é ainda pior quando o que se compra e o que se vende são os próprios humanos.

(mais sobre o filme)

quarta-feira, novembro 16, 2005

Esfíngico



Como diria um outro candidato:
"És finge mas não és fixe"

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segunda-feira, novembro 14, 2005

Políticas acidentais


Políticas acidentais
por Miguel Poiares Maduro


Bismark disse que para continuarmos a respeitar as salsichas e as leis não devemos ver como são feitas. Nunca gostei muito de salsichas mas quanto às leis é difícil fazer dieta… Elas estão em todo o lado. Existe um sério problema de obesidade legislativa. Quando não temos solução para um problema legislamos. As leis parecem apresentar desejos em vez de soluções. O homem sonha e logo legisla, arriscando-se a transformar as leis em meras intenções. Multiplicamos as leis sem chegarmos a soluções. Mas de onde vem, afinal, este existencialismo legislativo? Ele tem origem numa crise existencial da própria política.


________________________________________ Siena, 2005 - FPR


À política caberia tradicionalmente a decisão sobre certos riscos sociais, a distribuição dos seus custos e benefícios e a arbitragem entre os diferentes interesses a eles associados. Hoje em dia, a política tem dificuldades em desempenhar estas funções. A verdadeira política tirou férias: a ênfase é toda colocada na arte de fazer política, esquecendo as políticas que deviam ser a sua razão de ser. A estética da política (não confundir com a estética dos políticos) interessa mais que as próprias políticas. Neste contexto, não é de estranhar que as políticas pareçam, por vezes, um resultado acidental da política.
Isto é visível, desde logo, na forma como se reduzem certas questões políticas a escolhas técnicas. Depois do tanto que ouvi de tantos lados, confesso que já não sei o que pensar do futuro aeroporto de Lisboa, do TGV ou de como reciclar os nossos resíduos tóxicos. E, no entanto, a forma como estas questões nos são apresentadas indiciaria uma decisão fácil. O discurso sobre estas e outras políticas está dominado pela invocação da técnica e da ciência. Ambos os lados parecem estudantes aplicados, esgrimindo estudos técnicos, planos de impacto, projectos de viabilidade e outras expressões enjoativas. Por vezes, não sei se assisto a um debate político ou a um exame de engenharia. Parece que não se trata de fazer opções políticas mas de determinar o que é verdade ou mentira. As políticas são apresentadas como o resultado de uma decisão técnica, mas parece que a técnica está mais confundida que a política.
Só que se o problema fosse meramente técnico a opção política seria simples: confiar nos melhores técnicos. Mas o problema é outro: é que já não conseguimos distinguir entre o que pertence à técnica e o que pertence à política. Não sabemos se foi a ciência que tomou conta da política ou se é a política que se esconde atrás da ciência. A ciência é fundamental para esclarecer e iluminar a escolha política mas não se pode é reduzir a política a uma questão de ciência. Por ex.: a ciência pode e deve ajudar-nos a determinar o risco existente num certo método de reciclagem de resíduos tóxicos mas essa não é a questão política. As perguntas, a resolver politicamente, são outras: é esse risco socialmente aceitável face às alternativas existentes e aos riscos que também comportam? Como deve ser esse risco distribuído na sociedade (quem o deve comportar e como deve ser compensado por isso)? A política tem de partir dos factos mas não pode ser reduzida a um juízo de facto (o que é verdade ou mentira). A política, como a vida, é antes um processo de escolha entre diferentes alternativas imperfeitas.
Falta também visão periférica às políticas. Em parte isto deve-se a uma "ghetização" do discurso político, organizado em torno de grupos que prosseguem objectivos específicos. Cada um destes grupos identifica o interesse geral com o interesse que entendem ser prioritário proteger. Num contexto deste tipo, o verdadeiro interesse geral devia resultar do equilíbrio entre estes diferentes interesses parcelares. À política deveria caber promover um debate entre todos e arbitrar entre eles. Mas não é bem assim. Em primeiro lugar, devido à crescente complexidade social e, logo, das decisões políticas, a segregação do discurso político tem-se reflectido numa segregação das próprias políticas. Criam-se diferentes instituições (comités, institutos, agências) a que se atribuem certos objectivos específicos. Naturalmente, estas instituições centram a sua acção na maximização desses objectivos. O mesmo sucede, crescentemente, com diferentes áreas de governo: moldados por diferentes objectivos e com conhecimentos compartimentados, é natural que, por ex., o Ministério do ambiente tenha uma cultura do interesse público bem diferente da do Ministério da economia. Quando a política já não consegue coordenar e arbitrar estes diferentes poderes, as políticas entram num ciclo de constante alternância consoante aqueles que são chamados a controlá-las. Em vez das políticas representarem uma escolha entre diferentes alternativas imperfeitas à luz dos vários interesses em causa elas são, alternativamente, dominadas por vários interesses parcelares. Por vezes, isto tem como consequência uma enorme instabilidade legislativa e política. Outras vezes, um desses interesses consegue estabilizar o seu domínio numa certa área e o problema é o oposto: um congelamento da democracia, em que a transformação de certos interesses predominantes em direitos adquiridos impede a reforma de políticas que, mesmo que inicialmente o tenham sido, há muito deixaram de ser eficientes e justas.
No fundo, subjacente à dificuldade de assumir a política como escolha encontra-se um enorme mito: a presunção de que os recursos do Estado não são escassos. Muitas vezes, as reivindicações que se ouvem em Portugal parecem entender que prosseguir um certa política é apenas uma questão de vontade e não exige uma opção entre diferentes utilizações possíveis dos mesmos recursos limitados. Fala-se muito de justiça distributiva mas ignoram-se os efeitos redistributivos da maior parte das políticas. Fornecer o acesso universal a um certo serviço (a educação por exemplo) pode parecer incontestavelmente desejável. Mas o que temos verdadeiramente de decidir é se preferível utilizar certos recursos do Estado para garantir um acesso gratuito a todos independentemente do seu estatuto económico ou se existe uma alternativa melhor para utilizar e distribuir esses recursos.
Uma política perfeita é um pouco como a felicidade, toda a gente diz que a viu e que anda por aí mas ninguém sabe onde mora. É bom ter a ambição de buscar a perfeição mas não de viver obcecado com ela. Na política como no resto, o que conta são as escolhas que se fazem e não aquelas que gostaríamos de poder fazer. As políticas são acidentais quando as escolhemos sem ter consciência dos limites da nossa escolha.

Políticas acidentais
por Miguel Poiares Maduro

domingo, novembro 13, 2005

Ramón Castellano de Torres

____________________ estirando las piernas


Descubra o trabalho deste pintor nascido em Ceuta e que vive em Sevilha clicando na imagem.

quarta-feira, novembro 09, 2005

Auto da (b)arca



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domingo, novembro 06, 2005

Gerónimo, o índio que está na moda


Não rompera ainda o Sol na Reserva e já o Gerónimo e os camaradas “Ideologia Nebulosa”, à esquerda, e “Coiote Tarefeiro”, do outro lado, se internavam na mata, sem desanimar, mostrando que de vermelho não têm só a pele.

Ao contrário do que se possa pensar Gerónimo, também conhecido por “Urso Dançarino”, não tem más intenções. Aliás, como disse Arnaldo Matos, também conhecido por “Grande Educador”, a Revolução não é um chá dançante.

Os facalhões, afinal, são apenas canivetes com que pretende cortar algumas ramagens para enfeitar a tenda amanhã, o saudoso 7 de Novembro da Revolução de Outubro.

A Democracia Avançada para o Século XXI, também conhecida como “DAS XXI”, constrói-se com estes pequenos gestos cheios de intencionalidade.
Seja lá ela o que for.


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quinta-feira, novembro 03, 2005

S. Francisco do Bloquinho


S. Francisco do Bloquinho


É realmente cansativo andar sempre com o bloquinho ao colo, para mais persistindo a dúvida sobre se ele ainda cresce ou se fica mesmo assim.

Os outros dirigentes partidários deviam era estar calados pois não sabem o que é gerar um bloquinho, adoptaram os seus já eles criavam barba quando não guedelhas grisalhas.

Quer se trate de pregar aos peixes, aos candidatos imaturos ou aos poetas zangados o “padre vermelho”, como carinhosamente é referido, não poupa retórica.

A sua clarividente e revolucionária proposta de novo imposto sobre as “grandes fortunas” é a versão digital do preceito bíblico que calibrava os ricos e os camelos pelo cu de uma agulha.

Como diria S. Durão do Barroso:

se há bichas nos hospitais
e falhanços nas pensões
não há TGV no Tejo
nem Ota com aviões


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