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domingo, abril 19, 2020

Parábola da árvore chamada "Estado"




Parábola da árvore chamada "Estado"
(fotografia de Louis Dallara)

Era uma vez um campo abandonado.
Como acontece em casos que tais as ervas proliferavam numa alegre sinfonia de verdes.
E viviam muito felizes ao sabor das estações; na Primavera deitavam as suas flores, quando as tinham; no Verão amadureciam e mirravam com a canícula, o que no Outono dava ao campo um ar despido e raso; no Inverno suportavam as geadas e as inundações pluviais.
Eram todas quase do mesmo tamanho, raramente excediam dois palmos de altura.
Até que um dia houve uma, mais introspectiva, que lhes disse:
"Amigas, a nossa vida seria muito mais agradável se pudéssemos evitar os abusos do sol e do vento.
Precisávamos de ter um obstáculo que impedisse esses dois flagelos."
Toda a assembleia, que por natureza estava sempre reunida, concordou com o reparo.
E houve alguém que lançou uma ideia:
"Se tivéssemos uma árvore entre nós ficaríamos protegidos. Vamos escolher uma das ervas e ajudá-la a crescer muito para além da nossa altura"
Assim fizeram, durante anos a erva escolhida foi alvo de todas as protecções e substâncias favoráveis.
Deu de crescer que era uma lindeza. Ramo após ramo ergueu-se sobre as suas amigas.
Baptizaram-na "Árvore do Estado".
Anos a fio protegeu a comunidade vegetal com a sua sombra no pino do estio, e com a sua copa quando se armava vendaval e desabava o céu em dilúvio.
Viveram tempos de prosperidade e harmonia.
Mas, como sempre na vida, as coisas lentamente começaram a mudar.
A árvore nunca mais parou de crescer.
Eram pernadas e mais pernadas, folhagem e mais folhagem, até que começou a ajoujar com o peso da estrutura.
Por baixo deixou de ser ver o sol, quer de Verão quer de Inverno.
As raízes estendiam-se num enorme raio e drenavam a humidade e os alimentos de que as pobres ervas necessitavam para subsistir.
Como se tal não bastasse no Outono as folhas caídas da Árvore Estado aterravam sobre as ervas criando uma camada, cada vez mais espessa, que as subterrava.
A pouco e pouco as ervas foram desaparecendo.
A Árvore do Estado ficou só, no meio do campo
Já ninguém percebia o sentido da sua existência.

terça-feira, outubro 16, 2018

Citação


sexta-feira, novembro 04, 2016

O Estado a que isto chegou


O Estado a que isto chegou
A esquerda tem no seu ADN o sonho de criar um tipo de sociedade radicalmente novo. Quando eu cheguei à política, há mais de 50 anos, a utopia estava ainda bem viva.
Se considerarmos as brutais transformações tecnológicas das últimas décadas tal ideia em vez de utópica pode até ser vista como necessária.
No entanto a ressaca do desmoronamento da URSS produziu uma evolução noutro sentido.
Os partidos anteriormente revolucionários foram-se submetendo à lógica social-democrata e aos encantos do "estado social".
Hoje já ninguém fala de uma nova sociedade.
Isso foi substituído pela invasão dos centros do poder político em troca da manutenção da sociedade capitalista tal como ela é.
Imbuídos de um espírito pretensamente vanguardista os partidos de esquerda tratam de gerir o sistema tomando medidas para que ele, apesar de anacrónico, não seja demasiado insuportável.
De caminho engordam as estruturas do Estado, quantas vezes com amigos e colegas do partido, sugando a sociedade com impostos.
Gera-se então uma contradição fatal; a economia nem é verdadeiramente capitalista nem é outra coisa qualquer.
Por essas e por outras a economia estagna e ninguém sabe muito bem como pô-la a crescer.
O Estado mete o bedelho em tudo e atabafa com os seus milhares de regulamentos grande parte das iniciativas e empreendimentos.
Meio dúzia de génios, inventados nas juventudes partidárias, sentam-se nas cadeiras do poder como se pudessem e soubessem manipular as alavancas de uma economia cada vez mais complexa.
É no Estado que se cruzam os grandes negócios e, com a desculpa da retórica republicana, põe-se os cidadãos a pagar rendas às corporações, falências dos bancos, e todo o tipo de fraudes que diáriamente aparecem nos jornais (hoje é na Força Aérea mas também no SNS às dezenas, na Segurança Social, etc).
Vende-se aos cidadãos a ilusão de que o Estado, e o que é do Estado (por ex. a CGD) garante por natureza a prossecução do interesse público. Apesar de a realidade andar há décadas a mostrar o contrário.

terça-feira, dezembro 15, 2015

O Factor Fantasma


O Factor Fantasma
Lembram-se certamente do tempo em que no Metro, em Lisboa – e nessa época só existia Metro em Lisboa – um funcionário viajava dentro das carruagens? O dito funcionário, em cada estação confirmava se já tinham saído e entrado todos os passageiros e, em seguida, accionava o fecho da porta. Dir-me-ão que isso acontecia no tempo em que a dona Gertrudes Tomaz inaugurava a árvore de Natal do São Jorge. Mais ou menos. Um bocadinho para menos do que para mais: esses funcionários designados factores sobreviveram até 1995. Ou seja os factores deixaram oficialmente de existir no ano em que Ieltsin e Clinton negociavam em Moscovo, se criava o Espaço Schengen, era lançado o Internet Explorer 1, Bobby Robson era o treinador do Futebol Club do Porto.
Como se vê o mundo mudou muito nestes vinte anos, nem sempre para melhor mas mudou. Excepção feita aos factores do Metropolitano de Lisboa, que se tornaram num caso de espiritismo no mundo dito do trabalho pois se algum ingénuo pensou que extinta a função se acabavam os encargos com novos factores desiluda-se: os maquinistas do Metro passaram a receber uma remuneração extra (entre 317 euros e 475,50 euros mensais) pela abertura e fecho das portas das composições.
Mas não só. Os desaparecidos factores são sempre invocados nos acordos de empresa para explicar porque hão-de trabalhar ainda menos tempo os maquinistas. É preciso ter em conta que o horário de trabalho dos maquinistas do Metro de Lisboa está dividido em dois turnos. Mas só num deles os maquinistas dirigem as composições. Na outra metade o maquinista fica na situação de reserva, e pode, quando muito, assegurar manobras das composições nos cais terminais. O que nos leva à pergunta: porque afecta então o Metro de Lisboa tanto maquinista exclusivamente a manobras quando tem todos os dias dezenas de maquinistas parados no cumprimento do seu segundo turno?

sexta-feira, junho 14, 2013

O PS, sem tirar nem pôr

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Um retrato fidedigno de Sócrates, TóZé, Soares e quejandos

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domingo, julho 15, 2012

O proletariado actual

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Afinal o funcionalismo público sempre é o proletariado da época actual. Agora percebo a atenção que o PCP lhes dedica.

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sexta-feira, dezembro 23, 2011

Shèng Dàn Jié Kuài Lè

Shèng Dàn Jié Kuài Lè ou, por outras palavras, BOM NATAL

quarta-feira, dezembro 07, 2011

Dr. Jekyll ou Mr. Hyde ?




Um certo discurso de esquerda, muito em voga, resulta contraditório e causa de desorientação sempre que se refere ao Estado. Umas vezes como médico e outras vezes como monstro.

Quando subtrai salários ou subsídios o Estado é um mau patrão que os sindicatos da função pública denunciam ásperamente. Mas também pode ser ladrão quando sobe impostos ou taxas. Neste caso Estado é sinónimo de Governo. É o monstro.

Mas quando se trata de evitar privatizações ou preservar a escola pública e o sistema público de pensões, então o Estado somos todos nós, o Estado é a mais pura expressão do interesse popular. É o médico.

No romance, como na vida real, foi o Dr. Jekyll que fabricou Mr. Hyde.
Mas para todos os efeitos são uma e a mesma pessoa.

terça-feira, outubro 25, 2011

CHARADA

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CHARADA:

-95 % das empresas portuguesas empregam menos de 10 pessoas
- 0,08 % das empresas portuguesas empregam mais de 250 pessoas
- 44 % das empresas portuguesas apresenta prejuizos
- 70 % das empresas portuguesas opera no sector dos serviços (produzindo bens não exportáveis ou até a vendendo produtos importados no nosso mercado)

Com uma economia assim como é que se pode equilibrar as contas com o exterior e gerar riqueza suficiente para amortizar a gigantesca dívida?

domingo, agosto 21, 2011

O capital não tem pátria



A maioria das empresas do principal índice da bolsa criou sociedades gestoras de participações sociais em Amesterdão, Luxemburgo e Dublin, que, de acordo com especialistas, trazem vantagens fiscais. 
O tema é manchete do jornal Público , que escreve que 20 maiores grupos económicos em Portugal têm 74 sedes no estrangeiro e que preferem abrir sedes em países europeus com menor carga fiscal e em paraísos fiscais.


Eu também posso escolher em que país pago os meus impostos?


O capital não tem pátria e, por causa disso, a pátria não tem capital.


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sexta-feira, agosto 05, 2011

Serviço público serve quem?

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A televisão pública beneficiou de uma subida de 2,7 milhões de euros, o equivalente a quase mais 2%, na indemnização compensatória para este ano. O valor de 145,9 milhões de euros já estava previsto no acordo complementar do contrato de concessão de serviço público de televisão para o quadriénio 2008-2011. Ao mesmo tempo, e até ao terceiro trimestre, a RTP tinha recebido 88,15 milhões de euros em dotações de capital. Tudo junto dá 234 milhões de euros de transferências do Estado, o que compara com os 205,5 milhões de euros pagos à RTP o ano passado. Em causa está uma subida de quase 14% nas transferências, ou de 28,5 milhões de euros.
A estes números serão ainda somados os 134,4 milhões de euros de receita da taxa audiovisual paga na factura eléctrica. O acordo entre a RTP e o governo contempla também uma subida de 2,3 milhões de euros na contribuição audiovisual em 2010, face a valores de 2009. 
Na resolução do Conselho de Ministros (presidido por José Sócrates) ontem publicada, o governo justifica os valores pagos à RTP com o cumprimento dos compromissos decorrentes do contrato de concessão assinado entre o Estado e a empresa para o cumprimento do serviço público de televisão, em particular no que respeita ao acordo de reestruturação financeira da RTP assinado em 2003. 

Jornal "I", 15.12..2010


A privatização da RTP vai ficar para melhores dias ou, como avisadamente escreveu o primeiro--ministro no programa do governo, para "tempo oportuno". Se, de facto, o "tempo oportuno" é um eufemismo usado e abusado em Portugal para atirar um problema para as calendas gregas, a recente intervenção do ministro das Finanças, Vítor Gaspar, em que nomeou expressamente a RTP como alvo a privatizar rapidamente, voltou a criar pânico nos "mercados".
Mas, segundo apurou o i, podem os "mercados" (as outras televisões privadas, as rádios e os jornais) ficar mais descansados: a privatização da RTP não será acelerada de maneira nenhuma e acontecerá, tal como prometeu o primeiro-ministro, "em tempo oportuno" - na melhor das hipóteses nunca; na pior das hipóteses na próxima legislatura, se o PSD voltar a ganhar as eleições.
Num momento de crise gigantesca nos media, abrir a RTP aos privados seria comprar uma guerra de proporções devastadoras. Até aqui, a mais visível face dessa guerra em curso é a oposição do militante número 1 do PSD, Pinto Balsemão, dono do grupo Impresa e feroz opositor da privatização do canal público que ameaça roubar receitas à SIC, neste momento já em perda. 

Jornal "I", 01.08..2011


Ao que parece este autêntico sorvedouro de dinheiros dos contribuintes vai continuar a prestar o tal "serviço público" que ninguém consegue perceber qual seja, se o governo não tiver a coragem de afrontar os interesses instalados nas televisões privadas que querem manter as suas posições no mercado da publicidade. 
Enquanto os cidadãos são forçados a apertar o cinto as televisões gastam rios de dinheiro a produzir conteúdos de baixo nível. Também elas só ganhavam com o emagrecimento, em qualidade e em lucros, se produzissem mais com menos.
Talvez não seja coincidência a mudança de tom por exemplo da SIC que, nas últimas semanas, desembestou furiosamente contra o governo de Passos Coelho. 
Para bom entendedor meia palavra basta.


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terça-feira, janeiro 18, 2011

Portugal é uma enorme Aldeia da Coelha

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O Diário de Notícias tem vindo há semanas a descrever, número a número, organismo a organismo, o enorme atoleiro de despesa em que se transformou o Estado. 
Ao longo dos anos, décadas, surgiram instituições que ninguém sabe para que servem, nem quem é que controla, nem se alguém controla. Foram empresas e institutos, obras de fachada, fundações, uma infindável maquia de estudos e às vezes estudos sobre estudos que alguém apropriadamente encomendou e claro: cargos, muitos cargos públicos.
Não vale a pena exprimir o embaraço que sempre se comunica nestas alturas em que o conhecimento da realidade surge ã superfície. Nem continuar a lamentar o atropelo ao contribuinte, tratado em Portugal como uma criatura de inesgotável paciência. As coisas são como são, ou como se imaginava que fossem. Não surpreende ninguém que os limites do Estado formem um continente oculto que ainda ninguém desbravou como devia, ou que ainda ninguém escrutinou como devia. O mais importante é perguntar como isto foi possível, como tem sido possível ou, além disso, como é que o país o tolera tranquilamente.
Vejam. Quando o Estado cria, por exemplo, uma empresa pública, ou quando um dos municípios-maravilha da nossa democracia dá à luz uma empresa pública municipal, alguém se deu conta de que tudo isto é feito e decidido livremente sem qualquer controlo sobre essa decisão? Basta que um político decida que o país, ou a sua circunscrição de interesses, precisa de uma nova empresa pública, para que esteja justificado mais um caso de natalidade empresarial.
Não admira que pululem por aí, entre as 1182 entidades do sector empresarial público, empresas sem objectivos claros, criadas sabe-se lá porquê e livres de qualquer controlo e racionalidade que expliquem sequer a sua própria existência. E quem diz empresas, diz também fundações e institutos. Não admira que, como também revelou o DN, essas empresas acabassem naquilo que hoje são: um pousio conveniente para a gula dos partidos.
Pedro Lomba no Público de 18.01.2011


Durante as campanhas eleitorais descobre-se infalívelmente uma Casa da Gaivota Azul, ou Amarela, ou Vermelha.
Isso é óptimo para esquecermos os milhares de casas que o desleixo e o compadrio terão entretanto pago aos amigos deles com o nosso dinheiro.
Concentramo-nos infantilmente na árvore para evitar ver a floresta.

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terça-feira, setembro 28, 2010

Palavras para quê?

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Segundo a edição de ontem do Correio da Manhã, actualmente há 5.581 pessoas com pensões acima dos 4 mil euros. Com os novos aposentados entre os meses de Janeiro a Outubro deste ano, contam-se 4.763 na Caixa Geral de Aposentações (Função Pública) e 818 na Segurança Social.
O recorde de crescimento nas reformas milionárias deu-se entre os funcionários públicos. No período analisado, aposentaram-se 230 pessoas com reformas acima dos 4 mil euros. Já os dados da Segurança Social, apontam para 67 novos aposentados neste período, com reformas superiores a 5.030 euros.
Este cenário contrasta com a realidade vivida pela maioria dos portugueses em situação de reforma, uma vez que recebem, em média apenas 397 euros.
Diário Digital, 27.09.2010

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terça-feira, agosto 17, 2010

Virtualidades privadas dos públicos vícios

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O Governo aumentou em 546 milhões de euros a despesa pública em relação ao tecto imposto no Orçamento de Estado, recorrendo às poupanças obtidas no ano passado para cobrir mais gastos pelos ministérios, institutos públicos e Assembleia da República.
De acordo com o Jornal de Negócios, as alterações ao Orçamento de Estado (OE) foram publicadas ontem em Diário da República. Por lei, o aumento da despesa tem de ser autorizado pela Assembleia da República (AR), mas tal não é necessário quando os gastos são cobertos por poupanças obtidas no exercício orçamental do ano anterior.
Segundo o mesmo diário, 94,5 milhões de euros são para despesas dos próprios ministérios, com destaque para o da Defesa (49,5 milhões) e para o dos Negócios Estrangeiros (13,8).
A grande maioria do aumento da despesa está relacionado com serviços e fundos autónomos dos ministérios, vulgo institutos públicos: 451,5 milhões. O da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior vai absorver mais 205,2 milhões, segundo o Jornal de Negócios, enquanto 102,4 estão em grande parte destinados a encargos gerais do Estado, nomeadamente a AR (90 milhões).
De destacar que, de acordo com o mesmo jornal, destes 546 milhões a despesa com serviços de apoio, estudos, consultoria e cooperação e relações externas vai absorver 25 milhões de euros.
Público 17.08.2010

Os vícios teimam em perpetuar-se. Quando uma certa casta se instala nos corredores do poder, com total impunidade, começa a olhar o país como sua propriedade privada.
São as virtualidades privadas dos públicos vícios.

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quinta-feira, julho 29, 2010

Fanfarronadas com a golden share



A 2 de Julho, depois de a golden share impedir a venda da Vivo, escrevi uma crónica aqui. Golden share, certa ou errada? Disse: 1) os capitalistas votaram, uns "sim" e outros "não", segundo os seus interesses; 2) o Governo votou "não" porque sendo o seu interesse o do País, havia argumentos nacionais para a PT guardar a ligação ao Brasil. Disse isso, mas acrescentei a hipótese de o Governo - que estivera certo em marcar uma posição - poder ter cometido um disparate financeiro. É que havia gente sábia, como Belmiro de Azevedo (que construiu a Sonae), que garantira: "É muito difícil haver outra oportunidade como esta para vender." E Ricardo Salgado (dono do BES), que dissera que a Telefónica, irritada por não comprar a Vivo, podia comprar a PT toda... Então, golden share, certa ou errada? Escrevi a 2 de Julho: "(...) daqui a dias, se a Telefónica pagar os 7,15 mil milhões já prometidos, a PT não perdeu nada e o Governo marcou uma posição. Se forem menos de 7,15 mil milhões arrecadados, então, o Governo errou. Daqui a dias vamos tirar a limpo." Tiramos a limpo: foram 7,5 mil milhões. E não foi só uma posição afirmada, a portuguesa PT vai mesmo continuar no Brasil. Passei um mês com a dúvida dos ignorantes. Se calhar bom é ter certezas, como Belmiro de Azevedo. Quando fez a OPA à PT disse que ia vender a Vivo à Telefónica. Foi há três anos e era por 2 mil milhões de euros.

Ferreira Fernandes, DN 29.07.2010

Este texto de Ferreira Fernandes condensa a maior parte dos equívocos que, desde ontem, se têm acumulado sobre o significado do negócio PT/Vivo/Ói.
Sócrates tem tido o desplante de insinuar que a golden share teve "um papel essencial na obtenção desta grande solução".

1.  É verdade que a Vivo foi vendida por 7,5 mil milhões em vez de dos 7,15 anteriores à golden share. Mas também é verdade que os 7,5 mil milhões de agora vão ser pagos durante mais de um ano e os 7,15 mil milhões de há um mês eram a pronto. A diferença é portanto muito menor do que parece.
Seja como fôr essa diferença é dos accionistas e não do Estado português.

2. O braço de ferro iniciado pela golden share, e mantido durante semanas, inflaccionou provavelmente o preço de compra da participação na Ói.  O BPI considera que o impacto do acordo é "positivo", embora afirme que, no caso da Oi, a PT vai pagar um "valor elevado por uma posição minoritária sem controlo accionista ou com controlo partilhado".
"Segundo os nossos cálculos, a posição que a PT está a adquirir vale 1,2 mil milhões de euros em valor de mercado, o que implica um prémio de 2,5 mil milhões de euros", acrescenta o BPI na nota hoje enviada aos investidores.

3. A entrada da PT na Ói sempre esteve disponível e para ser realizada não dependia da intervenção de Sócrates e da sua golden share. Quando muito poderá dizer-se que Sócrates exerceu a golden share contra os accionistas da PT (admitindo que eles queriam dar outro destino ao capital obtido pela venda da Vivo) e não contra os espanhóis da Telefónica como ele tentou fazer crer para efeitos eleitoralistas.
Em suma, o Estado português expôs-se ao ridículo na cena financeira internacional , invocando o "interesse nacional" em vão, em troca de nada. A Vivo acabou mesmo por ser vendida e a PT é agora um actor secundário na Ói.
 
Ao contrário do que pensa Ferreira Fernandes, o Governo nem sempre actua em nome dos interesses do país. Neste caso, pondo-se em bicos dos pés com a golden share, o que pretendia era escapar à derrota eleitoral que se perfila no horizonte.
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terça-feira, julho 06, 2010

A inocência dos espanhóis no caso PT-Vivo

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O discurso "patriótico" contra a venda da Vivo pela PT insinua, subliminarmente, que a Telefónica nos quer roubar as operações da PT no Brasil. Basta pensar dois segundos para perceber que se trata de um embuste.
A Telefónica está disposta a pagar, em troca da Vivo, uma fortuna superior a sete mil milhões de euros (dizem que dava para dois aeroportos de Alcochete).

O cidadão medianamente inteligente pergunta então: com esse dinheiro todo não podíamos realizar meia dúzia de projectos estratégicos no Brasil ou noutro lado qualquer ?
É claro que podíamos.
Toda a retórica anti-espanhola destina-se a ocultar que o verdadeiro problema reside no triste facto de os sete mil milhões não virem, se vierem, para os cofres do Estado Português. O verdadeiro problema é que os parceiros privados com que o engenheiro Sócrates pensava realizar o projecto estratégico da Vivo precisam, e preferem, em vez disso, vender a Vivo e usar o dinheiro de outra forma.

Portanto, a bem da nossa sanidade mental, esqueçamos os espanhóis e as suas pretensas culpas. Discutamos antes se faz algum sentido querer obrigar os accionistas privados a abdicar de um excelente negócio em nome de uma quimera cujo futuro, nestes tempos incertos, pode nunca se realizar.

É verdade que eles sabiam da existência da golden share quando se tornaram accionistas da PT. Mas também é verdade que certamente lhes prometeram enormes lucros em troca da sua fidelidade à causa.
A questão que se coloca é a seguinte: quando é que é o tempo certo para sacar o retorno de tais promessas ?  74% dos accionistas da PT consideram que o momento é agora pois as mais valias realizadas com a venda da Vivo à Telefónica, neste momento, são astronómicas.

Quem não quer submeter-se à lógica dos capitalistas não deve colocar-se na dependência do seu dinheiro.



quinta-feira, julho 01, 2010

Olho VIVO




Decorrem debates emocionados, e patrióticos, acerca do veto de Sócrates à tentativa de venda da Vivo pela PT.  Qual padeira de Aljubarrota brandindo uma golden share em vez de uma pá.
Todos parecem esquecer que a disputa diz respeito a uma empresa que funciona no Brasil e não na Ibéria.
O "nacionalismo" neocolonialista de Sócrates, se faz algum sentido no contexto das negociatas, é portanto exercido em detrimento do legítimo "nacionalismo" de Lula da Silva.
Muito me riria eu se tudo isto acabasse com a nacionalização da Vivo pelo governo brasileiro.

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sábado, maio 15, 2010

Lucidez até ao fim

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Fala-se muito, nos últimos tempos, em medidas para reduzir o défice. Medidas fiscais, diz-se até, de justiça fiscal. O aumento do IVA é compreensível e mais justificado do que a redução populista nas cadeiras dos bebés ou nos ginásios, que os consumidores nunca sentiram no bolso. Há pouco tempo foi a aprovação da tributação das mais-valias em IRS para acções detidas há mais de doze meses — medida justa, pois a não tributação era uma singularidade portuguesa. Para as acções alienadas antes da entrada em vigor da lei, a tributação é claramente retroactiva. Mas há na Constituição mais princípios do que o princípio muito tropical da não retroactividade da lei fiscal — ea possibilidade financeira de manter o Estado Social é apenas um deles.
Em qualquer caso, a justiça fiscal é uma questão que não se coloca só do lado da receita pública. Receita e despesa são o verso e o anverso do problema da justiça fiscal. É também muito provável que o esforço financeiro venha a atingir a segurança social, as pensões, as reformas.
Ora, de nada serve aumentar o IVA, ou tributar mais-valias, se o Estado continua a esbanjar recursos.
No esbanjadouro são muito claros dois tipos de papa-reformas: as obras públicas desnecessárias e os papa-reformas em sentido próprio.
O Estado (o Governo, o primeiro-ministro) vive agrilhoado a um conjunto de compromissos políticos, arranjinhos, promessas, vassalagens, dívidas que paga periodicamente em quilómetros de auto-estradas, túneis e, agora, em TGV com paragens em todas as estações e apeadeiros do poder local (desenhado em cima do mapa da volta a Portugal em bicicleta). Já todos sabemos que Portugal tem mais quilómetros de auto-estrada do que muitos países mais desenvolvidos, que não fazem sentido muitas dessas estradas e que é um absurdo havê-las sem custos.
O que é uma verdadeira esquizofrenia é que nada se faça neste momento de verdadeiro aperto das finanças públicas. E o discurso da oposição, que defende a suspensão das grandes obras públicas, mais parece um salivar em vésperas de poder, um repto para que se guarde o melhor vinho para depois de eleições — e não uma verdadeira preocupação com as finanças, ou seja, com os contribuintes.
Além das vassalagens, não podemos esquecer os outros papa-reformas, profissionais da acumulação de reformas públicas, semipúblicas e semiprivadas. Basta ver o caso do Banco de Portugal, ou outros menos imorais, que permitem que uma série de cidadãos — gente séria, acima de qualquer suspeita — se alimente vorazmente, em acumulações de pensões, reformas e complementos, que começam a receber em tenra idade. Muitas vezes até com carreiras contributivas virtuais, sem trabalho e com promoções (dizem que para isto são muito boas a Emissora Nacional / RTP e a Carris).
Tudo isto, como sempre, é feito ao abrigo da lei. É que isso dos crimes contra a lei é para os sucateiros. O problema é que a lei que dá é refém dos beneficiários

"Os papa-reformas", texto de Saldanha Sanches publicado já depois da sua morte, no Expresso de hoje.
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quinta-feira, março 04, 2010

O direito à greve

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Entre greves e manifestações, os governos de José Sócrates já enfrentaram cerca de 18 acções de luta da Função Pública. E a estas há ainda a somar os paralisações sectoriais - como dos professores e enfermeiros. Hoje, quinta-feira, a Administração Pública voltou a parar.
Tal não deixa de ser paradoxal quando se tem verificado em Portugal uma clara redução do recurso à greve como mostram os quadros, obtidos no PORDATA, que publicamos no topo deste post.
Cada vez mais instala-se a percepção de que no nosso país o grosso das greves é feito pela Administração Pública ou pelas empresas do Sector Empresarial do Estado. A extensão e impacto destas greves não tem paralelo em qualquer greve do sector privado.
Embora o direito à greve seja consensual na sociedade portuguesa cada vez são mais as vozes que se interrogam sobre as razões por que as greves "migraram" do sector privado para o sector público já que é do conhecimento comum que no primeiro há sub-sectores com níveis salariais e segurança de emprego, muito mais baixos.
As greves em empresas, em que o utente pode quase sempre recorrer a produtos ou serviços alternativos, resultam em claro prejuízo dos empresários. Pelo contrário as greves dos serviços públicos, quantas vezes essenciais, raramente permitem o recurso a fornecedores alternativos afectando no essencial os utentes de tais serviços.
Há no entanto uma outra ordem de questões que me parecem muito pouco esclarecidas.
O Estado, por acção do Governo ou da Assembleia da República, toma decisões legalmente válidas sobre as condições de trabalho dos funcionários.
Cabe perguntar mesmo com risco de ser mal compreendido: fará sentido a tradicional extensão do direito à greve, que foi criado para proteger a parte mais fraca, os trabalhadores, da ganância capitalista dos empresários, à Administração Pública que tem como "patrão" entidades supostamente defensoras do interesse comum ? Entidades que têm sobre os cidadãos o poder discricionário de cobrar impostos e de nos mandar combater numa qualquer guerra ?
Não se trata de impedir a discordância. Os trabalhadores da Administração Pública têm o direito de discordar das decisões do Governo como qualquer outro cidadão, mas devem dar voz a essa discordância como qualquer outro cidadão; manifestando-se e votando. Sob pena de haver na sociedade cidadãos de primeira e de segunda no que toca às relações com o poder do Estado.
Uns, de primeira, podem parar os hospitais para defender os seus salários afectados por decisões de política orçamental e os outros, de segunda, só lhes resta esperar pelas próximas eleições para castigar um governo que, com a mesma política orçamental, os levou ao desemprego e à ruína.
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domingo, novembro 15, 2009

Política e negócios sobre rodas RONAL


O empresário socialista Sobral de Sousa, acusado nos casos da Escola de Condução de Tábua e da mala de dinheiro entregue ao social-democrata António Preto, foi sócio de José Sócrates, Armando Vara e Rui Vieira (dirigente do PS e marido de Edite Estrela) na empresa Sovenco nos anos 90. António Preto conheceria Sobral mais tarde, em 1997, e garante: “Nunca me disse que conhecia Sócrates ou Vara”.
António Simões Costa, fundador do PS/Lisboa, foi o mentor da empresa e explica como nasceu a Sovenco e o que o aproximou dos demais sócios: “Conheci-os nas campanhas do partido e estivemos todos com Guterres”. No ano da fundação da Sovenco, 1989, Sócrates e Vara já eram amigos. E porquê entrar nos negócios? Simões lembra uma conjugação de factores: “Cavaco governava com maioria e os suecos, com quem tinha relações, pediram-me alguém que representasse os pneus Jislaved e as jantes Ronal”. Expresso 14.11.2009

Pode ser que me engane, mas o potencial de danos que Armando Vara pode vir a causar a José Sócrates é bem maior do que todos os outros casos ou pretensos casos que tanto desgastaram a imagem do primeiro-ministro e tão decisivamente contribuíram para a perda da maioria absoluta do PS. Armando Vara (e não a ‘Face Oculta’) tem a capacidade de, por si só, arrastar Sócrates para a queda num poço de que se desconhece a profundidade. Há amizades que matam, quando se misturam com outras coisas que não são misturáveis. Foi José Sócrates quem, em nome da amizade (porque competência ou qualificação para o cargo ninguém a conhecia, nem ele), fez de Armando Vara administrador do banco do Estado, três dias depois de este ter adquirido uma espécie de licenciatura naquela espécie de Universidade entretanto extinta — e porque uma licenciatura era recomendável para o cargo. E foi José Sócrates quem, indisfarçadamente, promoveu a transferência de Santos Ferreira e Vara da Caixa para o BCP, numa curiosíssima operação de partidarização do maior banco privado português, sobre as ruínas fumegantes do escândalo em que tinha acabado o case study da sua gestão ‘civil’.

Manda a verdade que se diga, porém, que estes dois golpes de audácia de José Sócrates em abono de um amigo e compagnon de route político foram devidamente medidos: aparentemente, Sócrates contava com o silêncio e aceitação cúmplice com que toda a classe empresarial e financeira recebeu a meteórica ascensão de Armando Vara aos céus da banca e o take-over do PS sobre o BCP, como se de coisa naturalíssima se tratasse. O escândalo não ultrapassou as fronteiras da opinião pública, de modo a perturbar o núcleo duro do regime. E isso foi um primeiro sinal do nível de promiscuidade aceite entre o político e o económico a que estamos agora a assistir. E, em silêncio sempre, toda a classe empresarial clientelar foi assistindo a uma série de notícias perturbadoras sobre operações bancárias a favor de algumas empresas ou investidores que, por acaso certamente, pertencem ao tal núcleo duro do regime, que goza do favor político da actual maioria.

...Junte-se então um governo cujo primeiro-ministro é dado a companhias comprometedoras, um sistema em que se fundem e confundem o político e o económico, o público e o privado, uma justiça que verdadeiramente se tornou cega e surda, mas não muda, um Presidente da República que se desautorizou a si próprio no pior momento, e um país onde as noções de interesse público e serviço público já quase se perderam por completo sem vergonha alguma, e tudo isto começa já a cheirar indisfarçadamente mal. Cheira a fim de regime e só os loucos ou os extremistas é que podem achar isso uma boa perspectiva para o futuro. Expresso 14.11.2009

No mesmo dia, no mesmo jornal, dois textos imperdíveis sobre a caldeirada política e comercial em que vivemos. Deve ser para nos poupar à total desmoralização que o Presidente do STJ quer destruir as cassettes. Bem haja.

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