Mostrar mensagens com a etiqueta anos 60. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta anos 60. Mostrar todas as mensagens

domingo, fevereiro 09, 2020

Maria Rosa


Maria Rosa
Guiné, 1968

sexta-feira, julho 05, 2019

sábado, junho 08, 2019

Crónicas de um Tenente





Lançamento das "Crónicas de um Tenente"
Na mesa contei com a presença dos amigos (da esquerda para a direita), Daniel Maymone, Osvaldo Cordeiro, Mário de Carvalho e Fernando Mão de Ferro.





quinta-feira, novembro 08, 2018

Rua Zaire




Rua Zaire
Era eu ainda garoto, há cerca de 65 anos, o meu pai estabeleceu-se na Rua Zaire. Com negócio de móveis "importados" de Paços de Ferreira e polidos, à força de brochas, em oficina própria na cave.
No fim dos anos setenta o negócio acabou, com o advento dos prensados e das Moviflores.
Passei por lá hoje, ao acaso.
A loja está fechada, debruada a azul. Em frente a mercearia do Ramiro é agora a Tasca do Junior, onde pontifica um simático jovem brasileiro.
O restaurante/tasca (essa sim) virou indiano e, na esquina, o café tem ao balcão uma nora do senhor Monteiro que Deus tenha.
Os fantasmas esvoaçavam por todo o lado nesta pacata paralela da Almirante Reis. E eu fora do tempo.

segunda-feira, novembro 05, 2018

Kubrik e a Web saloiice



Kubrik e a Web saloiice

Fui ontem ao CCB ver novamente "2001 Odisseia no Espaço", o filme do Kubrik.
Quando ele foi estreado em Portugal eu estava na guerra, na Guiné, por isso só pude vê-lo mais tarde, quando em 1970 entrei para a IBM.
As pessoas de hoje devem ter dificuldade em imaginar o impacto do filme naquela época, ao mostrar um computador que conversava com os astronautas e que acaba por "tomar o freio nos dentes".
Para se ter uma ideia desse impacto basta dizer que na IBM em Lisboa, na maior empresa do ramo das TIC, os computadores com que eu trabalhava eram alimentados com cartões perfurados, faziam (lentamente) uma tarefa de cada vez e comunicavam com o operador escrevendo na impressora (não havia qualquer terminal com écran).
O filme era assumidamente especulativo e, pelo que li, científicamente credível.
Quis o acaso que esta nova projecção do filme ontem no CCB coincidisse com o Web Summit, que os nossos tecnológicamente iletrados governantes cavalgam como "a última Coca-Cola no deserto".
Será que fazem ideia do número de coisas do género, muito em voga nos anos 80 e 90 do século passado, que já aconteceram por esse mundo fora?
Eu próprio frequentei alguns em Berlin, Nova York , São Paulo e São Francisco (por exemplo), o que era aliás comum para todas as pessoas profissionalmente envolvidas nas questões da computação.
A memória é curta embora a dos computadores não pare de embaratecer e expandir-se.
Algumas das buzzwords actuais têm barbas. Há décadas que se anuncia para breve a explosão da "inteligência artificial" e dos robots em casa a limpar o pó. Hoje a IA voltou a estar na moda embora, em muitos casos, não passe da mera exploração de gigantescos bancos de dados.
O mal destas coisas é o sensacionalismo com que são apresentadas não só pelos jornais, o que seria compreensível, mas até por pessoas com cargos importantes nas empresas de tecnologia e na política.
Fogem, uns e outros, do debate sério e fundamentado que nos faça compreender as consequências laborais e sociais da revolução tecnológica iniciada com a invenção da representação binária da informação.
Essa raiz digital da gigantesca árvore tecnológica que hoje presenciamos não é convenientemente explicada nas escolas, para que se perceba de onde surgiu tudo o que hoje nos maravilha.
Uma das coisas que mais me divertiu no filme do Kubrik foi ver como os objectos de uso comum em 2001 era imaginados em 1968.
Lá estava a video-chamada, mas não ao nível do telemóvel como hoje temos. A máquina fotográfica usada numa das cenas não tinha nada a ver com as que usamos desde o princípio do século XXI.
Isso não é de espantar num filme de ficção. A verdade é que ninguém previu alguns dos desenvolvimentos mais marcantes da nossa época; as redes sociais, o mapeamento do mundo conjugado com GPS e até o advento da maior fonte de automação actual os "utilizadores/funcionários". Quase todos nós acabamos por preencher formulários on-line para abastecer os bancos de dados das grandes corporações privadas e organismos públicos.

domingo, outubro 21, 2018

Em Vez de Balas


segunda-feira, outubro 01, 2018

Em vez de Balas - no Mocho




Em vez de balas
Fizemos anteontem um convívio à volta das memórias da Guiné, de há 50 anos, na Casa da Cultura de Sacavém.
Foi com enorme prazer que recebemos, com apoio da Câmara de Loures, amigos da Quinta do Mocho e não só.
Como tínhamos previsto houve um diálogo muito rico de culturas e gerações. Nunca esquecerei.
As fotografias publicadas neste post foram feitas pelo Carlos Almeida e pela Sonia Figueiredo, que deram uma ajuda inestimável à concretização deste projecto. O Kally Meru e a Emanuela Kalemba, como sempre, foram incansáveis. 
Quero também agradecer à Elsa Arruda e ao restante pessoal da CMLoures pelo apoio prestado.






domingo, agosto 19, 2018

19 de Agosto - Dia Mundial da Fotografia



19 de Agosto - Dia Mundial da Fotografia 
Eu e o homem que fotografei há 50 anos, em Farim na Guiné. 
É conhecido na sua terra por "120" já que, dizem, morreu com essa idade. 
A fotografia é isto; na tabanca mandinga onde ele viveu, 
o aparecimento das suas fotografias foi uma festa da memória colectiva.

quarta-feira, abril 11, 2018

1968-2018



11 de Abril 1968

domingo, março 25, 2018

A mochila




Os homens tinham descoberto uma nascente a cerca de 50 metros do rio. Do lado esquerdo do pontão onde atracavam as lanchas.
Começou por ser uma curiosidade naquele fim do mundo, onde pouco mais acontecia do que o rio a passar, umas vezes para juzante, durante a maré vazia, outras vezes para montante quando quando ela enchia. E à noite, claro, os ataques da chusma dos mosquitos.
Depois aguém se lembrou de fazer a “piscina”. Um nome megalómano que servia para designar um rectângulo, balizado por tijolos, onde a nascente empoçava nuns abissais setenta centímetros de profundidade.
Ao fim da tarde assistia-se sempre a um cortejo algo ridículo, de calções e toalhas de banho, que se propunha disputar um recanto da “piscina”. Mais do que refrescar-se o que eles pretendiam era ter a sensação de uns momentos de lazer, mesmo correndo o risco de ser mordido pelas sanguessugas, que arrancavam de perna alçada para gáudio dos colegas.
Naquele dia o tenente também lá foi. Que raio, não era por se misturar com os marujos que lhe caíam os parentes na lama. Ele já aprendera que a camaradagem não resultava, só por si, em faltas de respeito ou desobediências. Podia até reforçar a disciplina, por razões que não cabe aqui desenvolver.
Ouviu alguma piadas amistosas e lá meteu os pés na água morna, beneficiando da boa vontade devida a quem comandava aquele improvisado “aquartelamento”.
Tinham desembarcado ali um mês antes com toneladas de equipamento e víveres, debaixo de uma chuvada diluviana, e do nada que existia tinham feito nascer o “aquartelamento”. Adjacente ao rio e ao velho pontão, que ali ficara, dizia-se, dos tempos em que a CUF lá carregava a mancarra.
E lá ficaram a “ocupar a posição”, sem saberem bem porquê, ouvindo de quando em quando o canhão-sem-recuo do inimigo a fazer tiro de exploração a que o tenente não deixava responder. Na verdade, em termos de eficácia militar, nem tinham com que o fazer.
Foi então que surgiu a “piscina” e o referido banho do tenente.
Estava ele virado para o rio quando lhe pareceu ver um corpo vogando para montante. Saltou da água e aproximou-se da margem, fixando a vista. Não era a primeira vez que passavam animais, a boiar. Até um hipopótamo, inchado, se tal se pode dizer de um animal tão gordo, andara para baixo e para cima.
Farto daquela cena tétrica, meteu-se num bote de borracha e foi retirar o corpo da água. Era um guerrilheiro fardado e equipado.
Informado o QG, via rádio, ficou a saber-se que um grupo do PAIGC fora interceptado, quando atravessava o Cacheu numa piroga, e bombardeado. Ordenaram que se procedesse a uma tentativa de identificação do cadáver. O tenente recebeu ordens para comunicar o que encontrasse e guardar o cadáver até que chegasse o helicóptero para o levar.
Na mochila o tenente encontrou uma máquina fotográfica e muitas fotografias de reuniões políticas nas tabancas. O morto, percebia-se pelas imagens, seria uma espécie de comissário político que teria vindo fazer o seu trabalho de recrutamento e organização da resistência armada.
Num outro compartimento, encharcado, surgiu um livro: "Filosofia Marxista - Compêndio Popular", V. G. Afanassiev, Editorial Vitória, Rio de Janeiro. Nada mais nada menos que o último livro que o tenente andara a ler antes de embarcar para a guerra.
Um livro que ficara na sua casa de Lisboa. Um livro que ainda está na sua casa de Lisboa.

sexta-feira, março 16, 2018

Foi neste mesmo cais do Cacheu



Foi neste mesmo cais do Cacheu
que se passou a história que eu vou contar.
Chegáramos extenuados depois de andar a fugir aos baixios na foz do Cacheu. Que já lá tínhamos encalhado das outras vezes.
Logo por azar fomos encontrar o cais sobrecarregado de lanchas e batelões. Tivemos que atracar ao último, que chegara antes de nós, e para ir a terra era preciso saltitar de embarcação em embarcação.
A noite veio depressa e depressa se foi a janta à roda do tabuleiro comunitário, de onde toda a tripulação picava o seu pedaço de frango comprado na tabanca.
Não havia disposição para serões e não tardou que cada um armasse o respectivo "burro" de lona e pés de madeira, e se cobrisse com uma manta que prevenia o frio noturno e algum ataque da mosquitada.
Noite alta soou o brado "fujam...fujam..." que em tais paragens, e circunstâncias bélicas, resultava ainda mais urgente do que é normal. Só sei que abri os olhos e deparei com labaredas a cerca de três metros.
Saltei como uma mola, atirei com a manta, e lá fui como os outros aos pinotes por cima dos batelões na direcção da terra firme. Metros adiante lembrei-me que deixara para trás a minha amada e fiel Pentax e voltei a buscá-la, aos encontrões dos que ainda fugiam.
Acabámos todos no pontão a ver a lancha arder e logo percebemos que era necessário tirá-la dali, para não propagar o fogo às outras embarcações.
Lá fomos, receosos, soltámos amarras e atirámos a lancha contra o lodo da margem uns cem metros mais para juzante. As chamas iam alteando e não tínhamos com que apagar.
O sargento foi mandado em busca de uma bomba de água e por milagre voltou com ela. Começou então o trabalho de a pôr a chupar a água do rio, de um lado, e a lançar a água sobre as chamas do outro.
A chapa queimava-nos os pés, mesmo calçados com sola, e não sabíamos quanto tempo teríamos antes que o combustível ou as munições provocassem alguma explosão.
Estivemos naquela luta até ao nascer do dia, com o credo na boca, até que finalmente murcharam as últimas labaredas. A lancha estava devastada e dos nossos pertences pouco havia sobrado.
Mas não podíamos sossegar pois os cunhetes fixos de munições, em ferro, tinham sido sujeitos a enormes temperaturas.
A tampa fechava sob pressão e, depois de forçar a mola, espreitámos para o interior. Havia granadas de mão, projécteis de 20mm da peça Oerlikon, e munições de G3. Fumegavam.
Tínhamoss consciência da imprevisibilidade da situação. E também da inevitabilidade de encontrar uma solução.
Começámos então um tráfico sinistro.
Enchíamos um caixote com granadas, passávamos o caixote para um bote de borracha e íamos despejá-lo no meio do rio. Uma vez e outra.
Confiando na sorte.
À cabra-cega com a morte.

quinta-feira, março 15, 2018

Imagens com história

Imagens com história - Mudar de Vida
No princípio de 1967, com 21 anos, eu cursava Economia no antigo ISCEF e dava aulas na Escola Comercial Patrício Prazeres em Lisboa.
Era também membro da direcção do Cineclube Universitário de Lisboa.
Impressionado pelo filme "Mudar de Vida", do Paulo Rocha, decidi fazer uma reportagem, no Furadouro, para o Boletim do Cineclube.
Chegámos ao Furadouro debaixo de mau tempo, talvez nas férias da Páscoa, e alguém teve que ir abrir o Hotel para nos alojar.
Andei por lá dois dias, a fotografar os palheiros e os barcos. Entrevistei crianças, pescadores e lojistas para um pequeno gravador.
Junto ao areal destacava-se este edifício em ruínas, a que chamam "Chalé do Matos", cuja construção parece ter ocorrido em 1914. Foi usado como cenário neste retrato de um garoto com pistola de pau.
O material recolhido foi também publicado no Diário de Lisboa Juvenil, a 20 de Junho de 1967, tendo ganho um prémio de reportagem.

domingo, março 11, 2018

Um violino no Cacheu



Um violino no Cacheu
Era uma daquelas intermináveis subidas do Cacheu. As lanchas ronronavam rio acima, quase paradas quando a corrente da maré era vazante.
Uma outra parte do combóio de batelões ainda não nos alcançara e foi decidido fazer uma paragem e pernoitar, fundeando, onde pudessem mais tarde encontrar-nos.
Escolhemos uma curva do rio onde o tarrafo era alto e denso; as margens despidas das clareiras eram locais de emboscadas e tiroteios. Só suicidas se atreveriam a fazer um ataque a partir da precariedade das raízes inclinadas do tarrafo. Ou quem nunca as tivesse experimentado.
Lançámos então o ferro e a corrente virou-nos a proa para a foz. Assim ficámos no silêncio que só as aves cortavam e sem acender gambiarras. Uma vez desligados os motores, sinal que dávamos a contra gosto, a nossa presença devia ser ocultada por todas as formas. Até tínhamos o cuidado de esconder as pontas dos cigarros.
O Cacheu é um rio avantajado e o mar sobe por ele quando a maré enche, como era o caso. Sentíamos um grande volume de águas passar por nós, rio acima, pondo à prova a firmeza do ferro no leito do rio.
A mais de cem metros estava a Canopus, que era comandada pelo meu amigo Henrique. Eramos ambos daquela geração de 60 que partiu muitos tabús e que fazia frente à ditadura. Quizera o acaso que a guerra nos fizesse reencontrar no Cacheu depois de nos termos conhecido nos convívios universitários de Lisboa.
Estava eu com os meus pensamentos quando percebi que a Canopus lançara um bote à água. Fiquei alertado, pelo inusitado, e vi o bote aproximar-se com o grumete a acenar e a dizer “o senhor comandante manda perguntar se o senhor tenente quer ir beber um café à Canopus”.
A Canopus era um navio de maior envergadura e, apesar de tudo, com mais habitabilidade e espaço do que a lancha em que eu viajava. Por isso, e especialmente pela conversa saborosa que me esperava, não demorei a aceitar o convite e a saltar para o bote de borracha.
O Henrique recebeu-me com bonomia, como era do seu natural, e instalámo-nos num compartimento da proa a beber um café e a conversar. O navio oscilava docemente e parecia que estávamos numa bolha, muito longe de um teatro de guerra.
A certa altura o Henrique propôs que víssemos um filme feito por ele. Lá montou um pequeno ecran e as imagens surgiram. O que elas mostravam eram apenas as águas de um rio, paradas como um espelho, e as margens deslizando, à esquerda e à direita, interminávelmente.
As imagens, belíssimas, eram quase hipnotizantes. Foi então que reparei que para tal contribuía também a maravilhosa música de violino que as acompanhava.
Foi assim que descobri o concerto do Tchaikovsky.
Ainda hoje, passados cinquenta anos, sempre que encontro o Henrique nunca deixo de lhe agradecer.

domingo, fevereiro 25, 2018

Escrito no avião



Escrito no avião
de regresso à Guiné 50 anos depois

O avião levantou ao fim da tarde, com frio e núvens magníficas em Lisboa.
A maioria dos passageiros aparenta ser guineense e transporta incontáveis volumes como quem regressa a casa atulhado de presentes.
Há 50 anos tive alguns dias no mar para me adaptar ao calor de Bissau; agora vou ser despejado ao fim de quatro horas numa temperatura que deve ser o triplo da que sofria no ponto de partida.
Não sei bem como vou reagir a este reencontro.
As imagens que me chegam da internet desmentem a memória, que fixou uma cidade quase aldeia, com ritmos suaves e sem multidões.
Aos "ajuntamentos" festivos chamavam-lhes "ronco" e os batuques voavam da tabanca até aos bairros de vivendas dos brancos. Algumas vezes saí de casa, com a câmara na mão, por não resistir ao chamamento.
Pergunto-me se tal coisa ainda hoje acontece.
Eu morava numa transversal da avenida principal, numa casinha modesta para os padrões de Lisboa. Sem televisão, ou internet, os dias corriam naturais e coleccionávamos bicharada; como se não bastassem os que andavam à solta.
Tivemos cães, gatos, periquitos, camaleões, tartarugas e sei lá que mais.
O camaleão até serviu para decorar uma improvisada árvore de Natal. Depois o gato Rom-Rom trespassou-o com os seus temíveis caninos.
O Rom-Rom também caçava grandes lagartos, que trazia para debaixo da nossa cama, e até morcegos.
O pior eram os pombos que o vizinho tanto estimava. O vizinho já andava de olho no Rom-Rom e dizia-se que treinava com uma pressão de ar.
O Rom-Rom, uma autêntica fera, foi o nosso primeiro gato de uma longa série. E o mais dócil de todos apesar da sua costela selvagem. Trouxemo-lo para Lisboa onde nunca se adaptou e acabou por desaparecer.
Pergunto-me se ainda haverá gatos daqueles, e tantas outras coisas tão autênticas que nos encantavam, a nós que íamos de um país subdesenvolvido e pobre.
Será que o plástico invadiu a Guiné como aconteceu com as nossas feiras da província?
Vou de espírito aberto, à procura não sei bem de quê. Talvez daquela juventude que não tinha a consciência de o ser, que se limitava a usufruir da sua robustez intacta, do desplante da sua saúde sem mácula.
Ou então vou à procura daquele espírito ainda tão próximo da poesia e da utopia, que nenhum desgosto ou núvem conseguia perturbar.
Preciso de voltar a pisar aquela terra onde passei, psicológicamente incólume, os perigos da guerra e as tortuosidades do colonialismo.
A Guiné é uma terra avermelhada onde rareiam as pedras mas onde os bichos proliferam. Quantidades inimagináveis de caranguejos, mosquitos, ostras, sapos e escaravelhos.
Os varredores lançavam-nos contra os muros, onde faziam pilhas que davam pelo joelho. Louva-a-Deus e baratas voadoras atingiam-nos por vezes mal abríamos a porta da rua.
Com os sapos cheguei a fazer corridas no tampo da mesa de oficial de serviço, em longas noites de modorra sem zaragatas.
Ao dealbar, no silêncio da parada os jagodis, abutres locais de nariz adunco e andar pomposo, procuravam algo que se comesse e disputavam entre eles qualquer achado.
Nem de propósito estalou um bru-á-á no avião quando os passageiros descobriram que teriam direito, como jantar, apenas a uma sandes.

quinta-feira, fevereiro 01, 2018

Em vez de balas




Parto para a Guiné no dia 6 de Fevereiro, para percorrer os lugares de há 50 anos e fotografar com a mesma máquina que então usei.

EM VEZ DE BALAS
No dia 1 de Maio de 1968, larguei do Tejo, rumo à Guiné, a bordo da fragata Corte Real. Era então um jovem tenente dos fuzileiros, com 22 anos, recém casado, que interrompera os estudos de Economia na Universidade de Lisboa.

Em Bissau integrei a 6ª Companhia, aquartelada no INAB, junto ao Geba. A nossa missão consistia essencialmente na escolta de combóios de embarcações que levavam abastecimento aos quartéis do Exército.

Subi e desci os principais rios da Guiné comandando, conforme os casos, uma ou duas lanchas de desembarque médias (LDMs). Em ocasiões apoiado por lanchas de fiscalização pequenas (LFPs).

Naveguei no Cacheu até Farim, no Mansoa, no Geba e no Rio Grande de Buba. Liguei por mar a foz desses grandes rios e também fui a Bolama e a Bubaque.
A guerra era uma realidade penosa para quem como eu, jovem militante comunista, se opunha ao domínio colonial e defendia a independência das colónias. Partilhei esse drama pessoal com a minha mulher, Maria Rosa, que trabalhou como professora de História no Liceu Honório Barreto.
A fotografia constituiu para mim um paliativo. Ao fotografar a dignidade do povo guineense, a beleza das suas mulheres, o porte dos seus homens e o encanto das suas crianças, eu tinha a impressão de estar a fazer um gesto de amizade no contexto da guerra. A disparar fotografias em vez de tiros.
É significativo que pouco tenha fotografado da guerra e dos temas militares.
2018 é o cinquentenário da minha chegada a Bissau.
Sinto-me na obrigação de comemorar essa fase tão marcante da minha vida de jovem adulto. Tal como os outros jovens da minha geração aprendi, "no terreno", a grande lição da relatividade da nossa própria cultura.
No dia 6 de Fevereiro parto para a Guiné e percorrer os locais por onde passei, e fotografei, há 50 anos. E voltarei a fotografar lá com a mesma câmara Pentax Spotmatic que então usei.
Está a ser organizada uma exposição das minhas fotografias, feitas em 1968/69, que terá lugar no Centro Cultural Português de Bissau, em 2018. O acervo deverá também ser exposto em Lisboa, no mesmo ano, estando em curso um processo de viabilização no Museu Nacional de Etnologia.
Uma espécie de tributo, pela restituição da memória de uma realidade que em grande medida já não existe.
Fechar-se-á então o ciclo. Como experiência pessoal é uma grande emoção.
Num plano mais geral creio que propiciará reflexões sobre a guerra colonial e sobre a forma como a viam tantos jovens que politicamente a contestavam.

Ver o programa Fotobox aqui:

https://vimeo.com/253468657?ref=fb-share&1




terça-feira, janeiro 02, 2018

LDM



LDM
ao deambular pela margem esquerda do rio Gilão, em Tavira, dei de caras com esta LDM (Lancha de Desembarque Média).
Emocionante. Foi numa coisa destas que eu subi e desci os grandes rios da Guiné, foi numa coisa destas que me brindaram com umas bazookadas (que por sorte falharam o alvo).
Noites inteiras a ouvir ronronar o seu motor, sem acender sequer um isqueiro, atentos aos baixios de lodo e à muitas curvas da água.
50 anos saltados num instante.
Disseram-me depois que esta LDM pertence à edilidade que a usa para transportar contentores de lixo.
Foi o anti-climax.

sábado, julho 08, 2017

1964


1964
A primeira vez que vi Paris, com 19 anos.
Imaginem o que era um puto daquela idade sair do Portugal salazarento e chegar a Paris. 
Ver casais a beijarem-se na rua, ver os filmes proibidos em Lisboa e ir ao Folies Bergére e ao Pigalle


sexta-feira, setembro 02, 2016

Há 49 anos



faz hoje 49 anos que entrei na Escola Naval para o curso da Reserva Naval.
Depois de passar pela Escola de Fuzileiros parti, no primeiro de Maio de 1968, para uma comissão na Guiné.

segunda-feira, novembro 02, 2015

Juvenil, 2 de Novembro 1965



Passaram exactamente 50 anos

segunda-feira, setembro 21, 2015