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segunda-feira, junho 14, 2010

A bola é um espelho

Deve-se a um único facto este comportamento quase histérico com a selecção: ela representa todo o nosso país. Cada uma das personagens que a compõem tem uma equivalência óbvia naqueles que a pátria designou para altos cargos. Vejamos, pois, essa tabela de equivalências:

Carlos Queiroz - Cavaco Silva
Há quem diga que ele é muito bom, mas tirando umas coisas na década de 90 nunca mais fez nada que se registasse. E há ainda os que o odeiam, apesar de ele não ter, precisamente, feito nada que se registasse.


Cristiano Ronaldo - José Sócrates
Parece que é muito bem visto no estrangeiro, é especialista em reviengas e em não deixar cair a bola no chão, mas por Portugal ainda fez muito pouco ou nada, ao contrário de Eusébio. Pode ser que ainda venha a fazer, mas duvida-se...


Eduardo - Teixeira dos Santos
Ninguém o conhecia, ninguém percebe bem quem é ele, mas já nos tem safado de alguns apertos. Não é muito seguro, mas se calhar é o melhor que se arranja.


Ricardo Carvalho - Pedro Passos Coelho
Joga muito à defesa e é pouco sarrafeiro (o Ricardo). Se lhe pedem para avançar fica cheio de dúvidas. Para passar do meio-campo é preciso que a bola esteja segurinha lá à frente, como num canto ou num livre. Caso contrário, volta lá para trás à espera que a bola venha ter com ele.


Duda - Francisco Louçã
Joga pela esquerda, mas parece que não faz falta nenhuma, ou então é o único que há. A verdade é que quando se pensa numa selecção a sério ninguém se lembra dele.


Daniel Fernandes - Jerónimo de Sousa
Faz parte da selecção, mas se não fosse eu pôr aqui o nome dele ninguém dizia: “Então e o Daniel Fernandes?”


Simão Sabrosa - Paulo Portas
É pequenino, tem jeito, mas já cá anda há tantos anos que toda a gente lhe conhece o jogo. O seu passado fazia-lhe augurar um futuro muito melhor.


Deco - Luís Amado
É discreto, mas funciona.


Raul Meireles - Augusto Santos Silva
Tem uma fama bastante pior do que o proveito que dela tira.


Liedson - Marcelo Rebelo de Sousa
Surge onde menos se espera, é capaz de fazer coisas geniais, mas nunca ganhou nada de jeito na vida (salvo dinheiro).


BES - BES
É o patrocinador. Fica-se sempre com a ideia de que, independentemente do resultado, fica a ganhar com a operação.


Vuvuzela - António Mendonça
Faz sempre o mesmo som, ninguém percebe para que é que serve, mas é um símbolo de que jamais nos esqueceremos.


E aqui vêem como as principais personagens do nosso país estão representadas na bola.

Comendador Marques de Correia, Expresso 12.06.2010


Neste tempo saturado de bola não resisto a publicar esta crónica engraçadíssima.
Para quem não tenha lido o Expresso.
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sábado, agosto 30, 2008

Democracia no avião

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O caso do avião Airbus A330 da companhia aérea de baixo custo Orbest, retido em Cancun por avaria, parece estar a estabelecer um novo padrão nas viagens aéreas; descolagem de aviões com problemas a pedido dos passageiros depois de plenário com voto por braço no ar. Oiça AQUI o relato de um passageiro.


Mais um sinal do enlouquecimento do mundo.

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terça-feira, julho 29, 2008

MMS

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O Público noticia que "O Movimento Mérito e Sociedade (MMS) defendeu hoje a aplicação da taxa Robin dos Bosques aos políticos pedindo, para isso, a revisão imediata das regras de despesa pública assim como a redução das reformas dos ex-deputados, dirigentes de empresas e de instituições públicas que não tenham atingido a idade mínima de reforma (65 anos)."(ver o resto aqui)

Esta proposta hilariante e descaradamente populista tem o grande mérito de provocar a pergunta "por que é que nem o Francisco Louçã se tinha lembrado disto antes ?" ou então "já chegámos àquele ponto em que se formam partidos capazes de fazer propostas assim ?".

Li algures que Eduardo Correia, o dirigente máximo do MMS, propôs também a publicação pelo governo da lista "Top 500" com informação sobre os reformados mais bem reformados do nosso país. É a cereja em cima do bolo.

Estas coisas podem não resolver nada e não têm qualquer hipótese de aprovação, mas lá que dão gozo isso dão.

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quarta-feira, junho 25, 2008

Instituto Nacional de Emergência Social



O PSD, no seu último Congresso, colocou a "emergência social" definitivamente na agenda política. Estamos em posição de revelar que, já no próximo Outono, o partido irá apresentar uma proposta para que as verbas destinadas ao TGV sejam desviadas para financiar uma rede nacional de distribuição de bifanas e hamburgers.
A emergência social não pode ficar atrás da emergência médica.
Por isso dentro em breve talvez vejamos nas nossas estradas, lado a lado com as ambulâncias do INEM, as elegantes carrinhas do recém-criado INES, Instituto Nacional de Emergência Social, cujo projecto de logo traz bem vincadas as setas dos seus promotores.


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segunda-feira, novembro 26, 2007

A melhor da semana passada - 15

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Um bocadinho mais para a esquerda ?



O primeiro-ministro Sócrates é uma pessoa que me surpreendeu muito positivamente. Quando entrou no Partido Socialista, jovem, era eu líder do partido. Pensei que ele fosse uma criatura do Guterres... Era a minha ideia, mas era uma ideia falsa. Estava errado. Ele não é uma criatura do Guterres. Ainda agora em Madrid disse isso ao Guterres.
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É assim: eu acho que passados estes dois anos - ele [José Sócrates] tem mais quatro até às próximas eleições em 99 [Mário Soares engana-se pois quereria dizer mais dois anos, até 2009] -, deve ter grandes preocupações, a partir de agora, com o mundo do trabalho. Deve dialogar com o mundo do trabalho.
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Bem, os grupos económicos são necessários. Mas eu acho que houve uma vaga neoliberal vinda da América. E essa vaga neoliberal é uma ideologia. Quando disseram que acabaram as ideologias... realmente acabou o comunismo por implosão, acabou o nazi-fascismo porque foi derrotado, mas veio o neoliberalismo, que é uma outra ideologia perniciosa para a América, em especial, e para o mundo, também para a Europa. Houve uma vaga que entrou...
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Não fui, não fui eu, porque eu nunca aceitei que tenha metido o socialismo na gaveta. Quem inventou isso, claro, foi o Partido Comunista, que disse que eu estava a meter o socialismo na gaveta. Porque, realmente, há tempos para tudo.
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E eu respondi-lhe: "Olhe, ó meu caro amigo, o senhor governador faça favor, para a próxima vez, não me acorde às duas da manhã, porque se é a bancarrota eu tenho de estar lúcido amanhã de manhã e, portanto, preciso de dormir agora. Deixe- -me lá dormir." Bem, não houve bancarrota. Mas estivemos muito próximo, realmente.
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A China preocupa-me mais do que a Rússia, curiosamente. Porque a China, infelizmente, é a combinação de dois regimes, os piores. Tirou o pior do comunismo, que é um comunismo duro e puro, dominado pelo Politburo. E tirou do capitalismo o pior que tem, que é o capitalismo selvagem que não se interessa pelas pessoas. Só se interessa em que a taxa de crescimento suba.
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E depois há outra coisa: é que os chineses apostaram e puseram a sua economia a comprar os títulos de dívida pública dos EUA. E isso parece muito inteligente à primeira vista. Mas a verdade é que eles agora estão cheios de títulos do Tesouro dos EUA, mas os EUA entrando numa situação difícil, de crise financeira, de crise de inflação, de aumento do desemprego, e, com o dólar a descer todos os dias, é evidente que isso cria um problema à China imenso.
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Acho que o aparecimento de novos partidos é possível. Apareceu o Bloco de Esquerda, pode aparecer outro bloco de direita. Podem estar em gestação muitas coisas, não sei se estão. Relativamente ao PS, eu gostaria que o PS agora se voltasse um bocadinho mais para a esquerda.
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Considero que tem sido uma figura discreta (refere-se a Cavaco) e que tem tido bastante bom senso na sua actuação. Aliás, era de esperar que assim acontecesse. Tem feito o seu papel com discrição. E bem. Até aqui.
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Ficámos (MS e Chavez) com relações bastante cordiais.Até posso dizer, talvez, de simpatia e de amizade. E eu falei uma vez nisso com o presidente da GALP, o engenheiro Ferreira de Oliveira. Ele é que foi verdadeiramente o cérebro e o herói desta coisa. Fez realmente a negociação e muito bem. É um grande técnico de petróleos e eu não percebo nada de petróleos,como é evidente.
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A Fundação Mário Soares tem as suas contas em dia mas não recebe dinheiro público. Ou, por outra, já tem recebido algum de empresas públicas mas não recebe propriamente dinheiro...A Fundação precisa de subsídios.
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Nós temos várias empresas, bancos e não bancos, que ou nos dão coisas pontuais ou se comprometem e dão um tanto por mês para a Fundação. A GALP está nesta categoria.

Extractos da entrevista de Mário Soares ao DN de 25 de Novembro 2007

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Se, como dizem, o Mário Soares é o pai da democracia portuguesa então confirma-se o velho ditado: "Tal pai, tais filhos..."

segunda-feira, novembro 19, 2007

A melhor da semana passada - 14



Dilemas do pão
Público 16.11.2007


Passam a vida a assustar-nos e muitas das vezes com razão. Então não é que agora se descobriu que o pão, o nosso pão, a vulgar carcaça que há muito nos povoa as mesas e as mais variadas dietas, pode ser uma ameaça à nossa saúde? É verdade. Não tanto pelo pão, mas pelo excesso de sal com que o carregam. O dobro do que é habitual nos países europeus, esses nossos imaculados vizinhos de continente, todos eles plenos de regras, normas, medidas, padrões sadios e recomendações cumpridas a preceito. Portugal não, habituámo-nos a excessos e adoramo-los. Não nos basta andar tensos, também temos que ser hipertensos e como isso nem sempre nos está na massa do sangue, como é hábito dizer-se, foi parar à massa do pão. Pãezinhos sem sal, nunca. Por aqui, só com muito sal. Um estudo apresentado ontem, e a que o PÚBLICO já se referiu no início da semana, conclui que a maior parte do pão vendido em Portugal tem cerca de dez gramas de sal por quilo, o que significará que qualquer criatura que coma duas carcaças atinge facilmente a dose máxima de sal recomendada pelos médicos: 5,5 gramas. Como junto às carcaças vai sempre mais qualquer coisa (fiambre, presunto, queijo, manteiga) e como nas refeições mais substanciais do dia há quem chocalhe o saleiro com o vigor de um sino a toque de rebate, escusado será dizer que é como se bebêssemos directamente dos oceanos. Sal, na verdade, não nos falta. Fosse ele dinheiro e seríamos riquíssimos. Falando em dinheiro: parece que é por causa dele que o pão tem mais sal. Assim, retém mais líquido na fabricação, exige menos farinha e pode exibir o requerido peso sem grandes gastos. Por outro lado, também dá jeito a quem vende cerveja ou afins. Um dia ainda o põem em cubinhos ao lado dos tremoços. Quanto ao dinheiro poupado nestes artifícios, pode sempre ser gasto em cardiologistas. Se ainda se for a tempo, claro. "Ó pão salgado, quanto do teu sal são doenças de Portugal?" O jeito que nos dá a poesia...Jeito não é coisa que possa ser invocada para o problema que se segue, também ele relacionado com o pão. Por causa dos nossos imaculados vizinhos de continente, os tais das regras, medidas & etc., vai ser um problema continuar a fazer açorda. Uma norma qualquer, decerto higiénica e ponderada, proíbe que se deixe pão a secar de um dia para o outro e que se faça comida com ele. Por causa disso, e de outras normas igualmente severas, a Misericórdia de Faro teve de deixar a dieta mediterrânica e aderir à cozinha "plástica", onde tudo tem carimbo e certificado de garantia, pode não saber a nada, mas ao menos tem inscrita a validade. Os idosos, que remédio, lá tiveram que habituar-se. O problema é que havia o hábito semanal de fazer açorda. Mas como, se o pão seco vai contra as normas? Ou fazem açorda com pão mole ou deixam de comê-la.O sal é um problema, já se sabe. Mas banir a açorda ou as migas é uma calamidade cultural sem nexo. Um conselho: tirem sal ao pão mas deixem-no secar.E não digam a Bruxelas.

Nuno Pacheco

segunda-feira, novembro 05, 2007

A melhor da semana passada - 12

CADA CIDADÃO DEVIDAMENTE CERTIFICADO





A ideia arrisca-se a ter filhotes. Basicamente trata-se de atestados de cidadão. Propõe-se que cada carro tenha um distintivo com cores que classificam o perigo do seu condutor: verde (pouco), amarelo (médio) e vermelho (muito). Porquê só o condutor? Devia anunciar-se, com dísticos, outros comportamentos. Em casas de violência doméstica deveria ser obrigatório, à porta de entrada, um letreiro com uma moca. E o caloteiro deveria ter ao peito um zé-povinho e o lema: "Queres fiado? Toma!"... E assim por diante. Acabava-se com esse aborrecimento de não sabermos nada sobre os indivíduos que nos cercam. Às vezes, vou no elevador e pergunto-me: será que este tipo à minha esquerda tem os impostos em dia? É horrível a dúvida. Saber tudo de todos é o futuro. Felizmente já há quem se adiante. Vejo Luís Filipe Vieira na TV e, em rodapé, a legenda respectiva: "No Benfica só têm lugar excelências". Esse afixa nas suas frases o que é: mais excelência era impossível.
Ferreira Fernandes, DN 3 de Novembro 2007

segunda-feira, outubro 29, 2007

A melhor da semana passada - 11

QUENTES E BOAS, MAS AGORA TODAS HIGIÉNICAS
DN, 27 de Outubro 2007


É o Outono que traz os vendedores de castanhas, ou são os vendedores de castanhas que chamam o Outono? Este Verão tardio está a custar a acabar e não convive bem com os primeiros alfinetes de frio outonais. Nem com as castanhas assadas. Quem é que já ouviu falar em comer castanhas assadas quando o termómetro ainda insiste em trepar até aos 25 graus, e o sol força a despir o blazer, o casaquinho de malha, o blusão de marca, a mudar o passo do lado luminoso da rua para o lado da sombra, a começar a dar ouvidos aos matracas do aquecimento global?

Castanhas assadas pedem friagem a apetecer abafo grosso, céu cinzento a pensar em pôr luto, vento daquele que nos pega à traição nas esquinas, aguaceiros de guerrilha, ora chove a potes ora deixa de chover, conversa fiada de transporte público sobre tirar os pulôveres da gaveta, limpar o pó aos radiadores, experimentar o edredão de penas novo, o escuro que já faz quando se sai do emprego, a vontade de chegar depressa a casa em vez de ficar a flanar nas esplanadas.

Tudo a fazer rima com as castanhinhas saídas do assador de barro do carro escalavrado do vendedor e embrulhadas num molho de folhas das Páginas Amarelas, mesmo assim ainda a aquecer-nos as mãos através do papel, até nos faz esquecer do preço que sobre de um Outono para o outro. Tanto poeta que fez versos com tanta gente e a tanta coisa em Lisboa, das varinas aos vendedores ambulantes, dos donos de tabacarias aos estivadores, e não houve nenhum que se lembrasse do assador, do carro, das castanhas e das páginas das listas telefónicas? É que agora já é tarde de mais.

Este Outono, Lisboa perdeu os carros com a chapa a pelar, os assadores fumarentos, o cartucho denso de nomes e números de telefones de lisboetas a acomodar as castanhas. Porque assim o decidiu a Câmara Municipal, e porque parece que é mais higiénico, mais moderno, mais vistoso e mais europeu, os carros das castanhas passaram a ser todos artilhados de inox e até faíscam quando o sol lhes bate em cheio; e as listas de telefone tão amigas das castanhas foram substituídas por uns sacos de papel com dois compartimentos, um para as castanhas que ainda não se comeram, outro para as cascas das que já foram comidas.

Dizem que assim as mãos já não ficam tão sujas e as ruas vão ficar mais limpas, francamente não sei. No saco lê-se: "Castanhas: mantenha a tradição" (eu preferia ler como dantes: Casa de Pasto Adega dos Lombinhos, R. Dourad, 218 864 887, ou A Reparadora Vidreira, Ger. R Grilo, 218 610 190, foi assim que descobri quem me emoldurou os quadros cá para casa durante bastante tempo, é verdade), mas tradição, agora, parece que só mesmo as castanhas em si, "quentes e boas" como dizia o fado, porque já mais ninguém o diz. É o Outono que traz os vendedores de castanhas, ou são os vendedores de castanhas que chamam o Outono? Este ano, um veio com calor ainda agarrado, e os outros a empurrar carros frios de inox.
Eurico de Barros

segunda-feira, outubro 22, 2007

A melhor da semana passada - 10



A justiça criminosa

Por uma vez gostava que em Portugal alguma coisa tivesse um fim, ponto final, assunto arrumado. Não se fala mais nisso. Vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada.

Desde os Templários e as obras de Santa Engrácia que se sabe que nada acaba em Portugal, nada é levado às últimas consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado. Da morte de Francisco Sá Carneiro e do eterno mistério que a rodeia, foi crime, não foi crime, ao desaparecimento de Madeleine McCann ou ao caso Casa Pia, sabemos de antemão que nunca saberemos o fim destas histórias, nem o que verdadeiramente se passou nem quem são os criminosos ou quantos crimes houve. Tudo a que temos direito são informações caídas a conta-gotas, pedaços do enigma, peças do quebra-cabeças. E habituámo-nos a prescindir de apurar a verdade porque intimamente achamos que não saber o final da história é uma coisa normal em Portugal e que este é um país onde as coisas importantes são «abafadas», como se vivêssemos ainda em ditadura. E os novos códigos Penal e de Processo Penal em nada vão mudar este estado de coisas. Apesar dos jornais e das televisões, dos blogues, dos computadores e da Internet, apesar de termos acesso em tempo real ao maior número de notícias de sempre, continuamos sem saber nada, e esperando nunca vir a saber com toda a naturalidade. Do caso Portucale à Operação Furacão, da compra dos submarinos às escutas ao primeiro-ministro, do caso da Universidade Independente ao caso da Universidade Moderna, do Futebol Clube do Porto ao Sport Lisboa e Benfica, da corrupção dos árbitros à corrupção dos autarcas, de Fátima Felgueiras a Isaltino Morais, da Bragaparques ao grande empresário Bibi, das queixas tardias de Catalina Pestana às de João Cravinho, há por aí alguém que acredite que algum destes secretos arquivos e seus possíveis e alegados, muito alegados crimes, acabem por ser investigados, julgados e devidamente punidos? Vale e Azevedo pagou por todos. Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção. Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo «normal» e encolhem os ombros. Quem se lembra dos doentes infectados por acidente e negligência com o vírus da sida? Quem se lembra do miúdo electrocutado no semáforo e do outro afogado num parque aquático? Quem se lembra das crianças assassinadas na Madeira e do mistério dos crimes imputados ao padre Frederico? Quem se lembra que um dos raros condenados em Portugal, o mesmo padre Frederico, acabou a passear no Calçadão de Copacabana? Quem se lembra do autarca alentejano queimado no seu carro e cuja cabeça foi roubada do Instituto de Medicina Legal?

Em todos estes casos, e muitos outros, menos falados e tão sombrios e enrodilhados como estes, a verdade a que tivemos direito foi nenhuma. No caso McCann, cujos desenvolvimentos vão do escabroso ao incrível, alguém acredita que se venha a descobrir o corpo da criança ou a condenar alguém? As últimas notícias dizem que Gerry McCann não seria pai biológico da criança, contribuindo para a confusão desta investigação em que a Polícia espalha rumores e indícios que não substancia. E a miúda desaparecida em Figueira? O que lhe aconteceu? E todas as crianças desaparecida antes delas, quem as procurou? E o processo do Parque, onde tantos clientes buscavam prostitutos, alguns menores, onde tanta gente «importante» estava envolvida, o que aconteceu? Arranjou-se um bode expiatório, foi o que aconteceu. E as famosas fotografias de Teresa Costa Macedo? Aquelas em que ela reconheceu imensa gente «importante», jogadores de futebol, milionários, políticos, onde estão? Foram destruídas? Quem as destruiu e porquê? E os crimes de evasão fiscal de Artur Albarran mais os negócios escuros do grupo Carlyle do senhor Carlucci em Portugal, onde é que isso pára? O mesmo grupo Carlyle onde labora o ex-ministro Martins da Cruz, apeado por causa de um pequeno crime sem importância, o da cunha para a sua filha. E aquele médico do Hospital de Santa Maria suspeito de ter assassinado doentes por negligência? Exerce medicina? E os que sobram e todos os dias vão praticando os seus crimes de colarinho branco sabendo que a justiça portuguesa não é apenas cega, é surda, muda, coxa e marreca.

Passado o prazo da intriga e do sensacionalismo, todos estes casos são arquivados nas gavetas das nossas consciências e condenados ao esquecimento. Ninguém quer saber a verdade. Ou, pelo menos, tentar saber a verdade. Nunca saberemos a verdade sobre o caso Casa Pia, nem saberemos quem eram as redes e os «senhores importantes» que abusaram, abusavam, abusam e abusarão de crianças em Portugal, sejam rapazes ou raparigas, visto que os abusos sobre meninas ficaram sempre na sombra. Existe em Portugal uma camada subterrânea de segredos e injustiças, de protecções e lavagens, de corporações e famílias, de eminências e reputações, de dinheiros e negociações que impede a escavação da verdade. Este é o maior fracasso da democracia portuguesa e contra isto o PS e o PSD que fizeram? Assinaram um iníquo pacto de justiça.

Clara Ferreira Alves, Expresso, 20 de Outubro 2007

segunda-feira, outubro 15, 2007

A melhor da semana passada - 9

Peregrinos perderam a paciência com a espera para entrar na nova igreja.
A vaia foi monumental à porta da nova Igreja da Santíssima Trindade, em Fátima. Os peregrinos perderam a paciência com as autoridades eclesiásticas, que mantinham as portas do templo fechadas, ontem, já passava das 13.30, quase 24 horas passadas após a inauguração.

Gritos, assobios e gente a reivindicar que "isto foi construído com o nosso dinheiro", ensombraram o brilho da cerimónia oficial da véspera. Porque a nova "Basílica", como lhe chamou o cardeal Bertone em conferência de imprensa ontem à tarde, foi um dos motivos que levou muitos fiéis a ir ao Santuário nesta peregrinação.

Ainda não eram 09.00, Alfredo Ribeiro, 40 anos, já tinha contornado a Igreja da Santíssima Trindade (IST). A viagem de Marco de Canavezes a Fátima havia sido longa e queria ver o monumento antes das celebrações habituais, no Santuário, às 10.00. Não conseguiu. "Já sei que não a vou ver, porque à tarde poucos vão conseguir entrar e nós voltamos hoje para casa".

A hora prevista para a abertura das portas apontava, de manhã, para as 13.00. Três guardas impediam a aproximação do pórtico principal, uma entrada esplendorosa, em bronze, com 64 metros quadrados. Alguns peregrinos lá conseguiam tocar-lhe e tirar a fotografia desejada.

Diário de Notícias, 14.10.2007

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Foi uma espécie de "inti-fátima"...
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segunda-feira, outubro 08, 2007

A melhor da semana passada - 8



MACHADADA FATAL NO GERUNDISMO






Há dias, José Roberto Arruda, governador de Brasília, decretou (decretou mesmo, não foi decretando), o seguinte: "Decreto n.º 28314. Art. 1º - Fica demitido o Gerúndio de todos os órgãos do Governo do Distrito Federal."

Medida acertada. O gerúndio é a modos que um tempo verbal que não faz, vai fazendo. "- Você está pronta, meu bem? - Estou indo..." O gerúndio apanha uma carroça ronceira de cada vez que vai a algum lado. Aliás, já vimos, não vai. Vai indo.

Daí o movimento "Chega de Gerundismo" que se criou no Brasil e de que o cortante decreto foi expressão. Que um governante rape da caneta para acabar com as modorras é de aplaudir. Sou a favor do combate a todas as muletas que arrastam a palavra (reparem, não abri esta crónica com "Há dias atrás...").

E não venham com "a língua não vai lá com decretos", eu e o governador sabemo-lo. O facto é que uma provocação - que vai direito ao assunto - muda. Não vai mudando.

Ferreira Fernandes
Diário de Notícias, 4 de Outubro 2007

segunda-feira, outubro 01, 2007

A melhor da semana passada - 7


Diário de Notícias, 24 de Setembro 2007
Feministas polacas desafiam irmãos gémeos Kaczynski
Partido das Mulheres despe-se para chamar a atenção dos eleitores

Insatisfeita com o rumo do país e com a liderança dos gémeos Jaroslaw e Lech Kaczynski, o primeiro-ministro e o Presidente da Polónia respectivamente, a escritora Manuela Gretkowska fundou o Partido das Mulheres (PM) e despiu-se para chamar a atenção dos eleitores que, a 21 de Outubro, votam em legislativas antecipadas para escolher um novo Parlamento. Ela e mais seis das 1 500 apoiantes que o partido já ganhou desde 2006. No cartaz que o PM criou para a campanha eleitoral lê-se a inscrição: "O Partido das Mulheres.

A Polónia é uma mulher". E o slogan: "Tudo pelo futuro... e nada a esconder". Transparência, é o que defende, numa altura em que a vida política polaca aparece totalmente dominada pela luta contra a corrupção e pela perseguição a antigos comunistas. No sábado, Jaroslaw Kaczynski avisou, num comício em Varsóvia, que uma vitória dos liberais e do centro-esquerda nas eleições seria um golpe de Estado comparável ao que o general comunista Wojciech Jaruzelski fez a 13 de Dezembro de 1981. O líder do partido conservador Direito e Justiça (PiS) referia-se a uma possível aliança pós-eleitoral entre a Plataforma Cívica (PO), de Donald Tusk, e a nova coligação Esquerda e Democracia (LiD), cujo candidato a primeiro-ministro será o antigo presidente polaco Aleksander Kwasniewski.

Há, no final de contas, uma espécie de ajuste de contas com o passado em curso na Polónia. Recusando-se a entrar nele, o PM prefere olhar para o futuro e defender que as mulheres sejam tratadas como cidadãs de direito e passem a usufruir, por exemplo, de mais maternidades, exames periódicos de saúde, contraceptivos e tratamentos para problemas de infertilidade. As sondagens revelam um desfecho eleitoral imprevisível na Polónia. Mas a luta final não será, com certeza, travada entre o partido dos Kaczynski e o de Gretkowska. O PiS conta actualmente com 26% das intenções de voto e a formação liberal de Donald Tusk com 33%, aparecendo o LiD na terceira posição. O Partido das Mulheres, que na sua lista de apoiantes tem nomes como o da campeã do mundo de boxe feminino Agnieszka Rylik, conta apenas com 3% e, para eleger deputados, precisa de obter no mínimo cinco pontos percentuais.
Mas mesmo que não consiga entrar no Parlamento, pelo menos um dos seus objectivos terá cumprido: desafiar o conservadorismo dos irmãos Kaczynski e provocar a sociedade de um país que é maioritariamente católico.

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Isto traz-me irresistivelmente à memória o juiz Azdak, do "Círculo de giz caucasiano", que dizia a certa altura:
"Faz bem à justiça ser feita ao ar livre. O vento levanta-lhe as saias e a gente vê o que ela traz por baixo."

segunda-feira, setembro 24, 2007

A melhor da semana passada - 6





Público, 22 de Setembro 2007, clique no texto do artigo para ampliar.

segunda-feira, setembro 17, 2007

A melhor da semana passada - 5




O cão pisteiro português

Meu caro Ministro da Justiça

Como sabe, a PJ contratou um cão pisteiro para detectar mais facilmente o odor a cadáver. E, na primeira semana, a contratação foi totalmente bem sucedida. O Bóbi conseguiu não só encontrar 27 cheiros a cadáver em criminosos diversos, como 31 cheiros a cadáver político na beca doutoral do prof. Marcelo, 457 indícios na estátua do Marquês de Pombal e, pelo menos, um falecido de tédio, que terá passado à condição de cadáver adiado depois de ter contactado o ministro Nunes Correia e um cadáver exquisito, cuja complexidade cultural é demasiada para lhe explicar o que é.
Na segunda semana, o cão pisteiro afirmou que estava farto de viver na sede da PJ, na Gomes Freire, como se fosse um detido nos calabouços e exigiu um pequeno apartamento com ar condicionado, televisão de plasma e uma aparelhagem mp3. Apesar de tudo ainda farejou vagamente um ou dois cadáveres bancários na farpela do eng.º Jardim Gonçalves, 100 mortos de indignação num discurso do dr. Alberto João Jardim e resolveu seis crimes considerados insolúveis, além de passear com insistência olfactiva entre as redacções do «24 Horas», do «Correio da Manhã» e do «Diário de Notícias», onde o cheiro de cadáver tem sido intenso esta época.
Na terceira semana, o Bóbi confessou que não tinha condições e aderiu a uma jornada de protesto da CGTP. Não obteve mais do que um ou dois cheirinhos e num deles nem soube dizer se era cadáver ou bagaço do mau.
Na quarta semana, o cão pisteiro português ameaçou fazer greve, disse que o Governo era incompetente e responsabilizou o ministro da Administração Interna pelo fracasso da política de segurança (além de ter contado uma anedota cifrada sobre o senhor primeiro-ministro, a qual foi devidamente anotada e está neste momento a ser descodificada).
Na quinta semana, o Bóbi passou a entrar, não às nove, como era seu hábito, mas por volta das 10h30 e passava a manhã toda a ler a imprensa, nomeadamente a gratuita, que aproveitava depois para as suas necessidades fisiológicas. Na hora do almoço demorava uma eternidade e quando voltava queixava-se de não ter uma viatura com ar condicionado à disposição. Não farejou um único cadáver de jeito, ainda que tenha descoberto as ossadas de Luís de Camões num local de que já nem o professor José Hermano Saraiva se lembrava.
Na sexta semana, o cão meteu baixa de três dias e decidiu faltar outros dois por assistência à família, embora ninguém saiba (e ele faça disso mistério) se tem família. Farejou um cadáver, mas quando o seguiram, os agentes verificaram que estavam no Cemitério dos Prazeres.
Na sétima semana, o director da PJ decidiu colocá-lo no quadro de supranumerários, facto a que ele resistiu dizendo que com 60 por cento do salário não pode comer o salmão indispensável ao seu apurado faro.
Parece que agora é comentador de uma televisão.
Aqui fica o relatório que me pediu.
Receba um abraço do seu

Comendador Marques de Correia
Expresso, 15 Setembro 2007

segunda-feira, setembro 10, 2007

A melhor da semana passada - 4




SUECA PROIBIDA DE FUMAR NO SEU JARDIM

Um tribunal da Suécia proibiu uma mãe de 49 anos, que fumava no jardim para não expor os seus filhos ao fumo passivo, de fumar qualquer cigarro na sua propriedade.
O fundamentalísmo do vizinho, que pôs a acção em tribunal, ditou que apenas numa área mínima do seu jardim, marcada com um x, a mulher possa de facto fumar...


Expresso, 7 Agosto 2007

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Os novos cruzados estão por toda a parte; nos cigarros, nos transgénicos e nos radares que vigiam o trânsito. Deixam-se obcecar por uma ideia válida que depois exageram até se tornar absurda.
Estão convencidos de que a sua missão é salvar os infiéis, mesmo contra a sua vontade.

segunda-feira, setembro 03, 2007

A melhor da semana passada - 3



DN, 29 de Agosto
ZONA AÉREA EXCLUSIVA DO VATICANO

O Vaticano abriu uma linha área juntando lugares de peregrinação. Na segunda-feira, partiu o voo inaugural, Roma-Santuário de Lurdes. Os outros destinos são: Terra Santa, Monte Sinai (Egipto), Santiago de Compostela, Guadalupe, Czestochowa (lugar de aparição da Virgem, na Polónia) e Fátima (um apoio miraculoso ao vizinho aeroporto da Ota). As armas da Santa Sé nos uniformes das hospedeiras e nos encostos de cabeça das cadeiras, mensagens religiosas... Não me vou pronunciar sobre a coisa íntima que é a fé, mas aplaudo a iniciativa comercial. Se há lugar onde o homem mais invoca o Senhor sem ser em vão - "oh, meu Deus", durante uma turbulência - é no interior de um avião. Os filmes que vão passar são desses comuns na Semana Santa. Dou o pormenor para não haver confusão: os voos são fretados à Air Mistral, companhia que foi fundada pelo actor Bud Spencer (actor das séries Trinitá, que nada têm a ver com a Santíssima Trindade, se bem me lembro).
Ferreira Fernandes

segunda-feira, agosto 27, 2007

A melhor da semana passada - 2


Fotografia de Eduardo Gageiro
in «Lisboa no Cais da Memória»


"Se António Costa quisesse verdadeiramente fazer alguma coisa de útil pelo Terreiro do Paço, tratava de dar ao Metro um prazo impreterível para terminar ou desistir das eternas obras do túnel à beira-Tejo, cuja necessidade imperiosa, aliás, está por provar. Terminar com aqueles vergonhosos tapumes que escondem o rio, pôr fim àquela incompetente empreitada que dura há uma década e devolver à cidade o Cais das Colunas e o Terreiro do Paço tal como ele era, isso sim, era um serviço prestado a Lisboa."

Miguel Sousa Tavares, Expresso 25 Agosto 2007

segunda-feira, agosto 20, 2007

A melhor da semana passada - 1



Expresso, Única 18/8

Silly season
Zita renega SMS e opta por comunicar via reza


... Mas enquanto Menezes e Mendes deram o «salto» para o séc. XXI, diz-nos o «24 Horas» que Zita Seabra deu o salto para a Eternidade: baptizou-se. Pormenor? Nem pensar. Zita tem uma particular capacidade para falar com velhos omnipotentes e inacessíveis de cabelo branco. Este, agora, em vez de sobrancelhas pretas e gabinete na Soeiro Pereira Gomes, pode ter barbas brancas e assento no Reino dos Céus, mas ela é bem capaz de lhe fazer passar a sua mensagem num SMS curto: «Se xgar a 1ª mnistra Ptgal publiko borlix Tdas encíclicas Papa Ratz. ÁmenZita».

O Revisor