terça-feira, março 09, 2010

Os Óscares de Pequim

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A distribuição dos Óscares em Hollywood ofuscou completamente as referências mediáticas à Assembleia Popular Nacional da China, que se iniciou no dia 5 de Março.
Perante quase três mil delegados, Wen Jiabao afirmou que o crescimento do Produto Nacional Bruto em 2010 vai ser de “aproximadamente” oito por cento. Um valor menos ambicioso que o alcançado noutros anos e que surge como meta para um ano que o primeiro-ministro descreveu como “complicado”.
Leu um discurso que delineia os pontos principais dos próximos meses. Gastar menos em projectos megalómanos e investir em novas energias e na protecção ambiental foram alguns dos avisos que ficaram.
Com o plano de facilitar o acesso ao crédito em zonas rurais e favorecer as pequenas e médias empresas, o governo calcula criar mais nove milhões de empregos para fazer face à entrada de jovens no mercado. O desemprego urbano não deve ultrapassar os 4.6 por cento e a inflação vai ficar à volta dos três por cento.
A política de facilidade ao crédito vai focar-se nos que mais necessitam e, aqui, Wen salientou o plano de aumentar o poder de compra de quem vive no meio rural, seja com subsídios, como através do acesso a empréstimos.
A necessidade de alterar o modelo de desenvolvimento, uma ideia que já tinha sido referida, voltou a caracterizar o discurso. Mais consumo interno é uma forma de criar um crescimento económico mais seguro.
A criação de emprego é a “prioridade máxima” e o governo central vai destinar 43 mil milhões de Renminbis para estimular o mercado de emprego. Ao lado dos jovens licenciados, Wen referiu os trabalhadores migrantes e os militares desmobilizados como as classes a não esquecer.
Caracterizado pelas medidas sociais, o discurso à nação referiu também o hukou, o registo de nascença que diferencia cidadãos urbanos de rurais. Mas apesar de, na semana passada, um editorial conjunto em treze jornais ter referido a necessidade de acabar com esta herança maoísta, Wen Jiabao disse apenas que nas aldeias e pequenas e médias cidades, o sistema vai tornar-se menos exigente de forma a facilitar a mobilidade social e geográfica. Mas nas grandes cidades como Pequim, Xangai, Chongqing, entre outras, os milhares de trabalhadores migrantes não vão ter a situação alterada quanto à ilegalidade de residência por falta de um contrato de trabalho.
Maria João Belchior em HojeMacau
Não há dúvida que as medidas mais importantes serão as que modifiquem o sistema de autorização de residência, ou "hukou", pelo qual todos os cidadãos chineses estão ligados legalmente ao seu lugar de nascimento e que abrange cerca de 230 milhões de migrantes internos. Para que tenham acesso aos serviços educacionais ou de saúde nas mesmas condições que os moradores das cidades onde trabalham.
O facto de ainda recentemente 13 jornais chineses terem publicado, no mesmo dia, textos iguais sobre o "hukou" constitui uma iniciativa inédita e mostra a sensibilidade social perante este tema.
A magnitude e relevância destas questões, cujas ondas de choque se sentirão em todo o mundo, não conseguiu no entanto sobrepor-se à luta de "Avatar" e de "Estado de Guerra" na disputa das estatuetas.
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