segunda-feira, maio 31, 2010

A fileira namoro-casamento-divórcio

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O presidente da associação Opus Gay, António Serzedelo, considerou hoje que o Presidente da República "ajudou Portugal a dar um passo em frente" ao promulgar a lei que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Jornal I, 17.05.2010

Conhecendo nós a preocupação de Cavaco com os "bens transaccionáveis" podemos intuir que a Presidência vai patrocinar uma "indústria matrimonial", especializando o país na produção de tudo o que envolve o acto de dar o nó.
Quando no último discurso Cavaco falou da "estratégia do mar" estaria provavelmente a pensar nos enormes barcos de cruzeiro que podem trazer até ao Tejo os milhares de felizes casais que nos vão tirar da crise, pela aposta na fileira namoro-casamento-divórcio.
Há que rentabilizar o facto de sermos um dos poucos países do mundo em que é legal o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
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domingo, maio 30, 2010

Carocha bike killer

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Dizem que este monolugar está pronto para ser lançado para venda em Shanghai, em 2010, por apenas 4.000 yuans, qualquer coisa como 500 euros.
Atinge os 100-120 Km/hora, com um consumo inacreditável de 0.99 litros aos 100 km.
Lá vão os chineses deixar definitivamente as bicicletas. Fazem mal pois pedalar é um excelente exercício.



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quinta-feira, maio 27, 2010

Desmaterializar o peso eleitoral

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Desmaterialização do nariz de Nero, Salvador Dali

 
Está online uma petição a favor da redução do número de deputados na Assembleia da República e que já conta com milhares de assinaturas.
Defendem os signatários que Portugal deveria optar pelo número mínimo de representantes dos cidadãos no Parlamento, 180, previsto pela legislação ou, pelo menos, pelo número médio.
O número máximo, 230, como acontece actualmente não é para quem assina a petição a opção mais correcta ou mais racional.

Quanto a mim a solução devia ser ainda mais radical e passar pela separação entre o peso eleitoral dos partidos e o número de deputados de cada partido na Assembleia da República.
Todos os partidos teriam o mesmo número de deputados, por exemplo 20, mas no momento da votação pesariam na decisão com o peso correspondente à votação obtida nas eleições.
Exemplo: o partido X obteve 35% dos votos nas eleições, logo quando os seus vinte deputados se levantarem para votar são esses 35% que a sua escolha pesa na decisão. O partido Y obteve 15% dos votos, então quando os seus 20 deputados se levantam para votar pesam exactamente 15%  para efeitos da votação.
Como se sabe os grupos parlamentares raramente não votam em "manada", e quando isso acontece é em questões menores, por isso escusamos de fingir que a liberdade de voto dos deputados existe.

Há que "desmaterializar" a influência de cada partido fazendo dos grupos parlamentares equipas de trabalho constituídas por competências; a solução actual só serve para os chefes partidários distribuirem benesses aos seus "fiéis" independentemente da competência ou motivação para o cargo.

Nesta lógica não faz sentido haver círculos eleitorais, e muito menos uninominais, pois não é benéfica a perda de proporcionalidade nem a tendência para influenciar o parlamento nacional com bairrismos ou lógicas regionais.
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quarta-feira, maio 26, 2010

A vitória é certa...

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A Associação Renovação Comunista vai apoiar a candidatura presidencial de Manuel Alegre, excluindo qualquer apoio ao candidato a anunciar pelo PCP, disse à Lusa o antigo dirigente comunista Carlos Brito.
Cerca de oito anos após a sua saída do PCP, Carlos Brito mantém-se na vida política, como presidente do Conselho Nacional da Associação Renovação Comunista, que declara o seu apoio à candidatura de Alegre às eleições presidenciais.
Questionado sobre se a associação admitiu ficar ao lado do candidato a anunciar pelo PCP, Carlos Brito - que fez parte da comissão política de Manuel Alegre nas últimas eleições - referiu que os elementos da Renovação Comunista «nem pensaram, nem sabiam quais eram as intenções do PCP», apesar de considerar «previsível» que este partido decidisse avançar com um candidato próprio.
«Pensamos que a candidatura de Manuel Alegre é uma candidatura para ganhar. Não íamos para outras soluções que não têm esse objectivo e têm outros objetivos, respeitáveis, contudo», referiu.
Para o antigo líder comunista, «o facto de a candidatura de Manuel Alegre poder apresentar-se como uma candidatura vencedora vai ter uma influência positiva em todos esses movimentos de opinião que o Alegre representa e que representou muito bem na sua anterior candidatura».
Manuel Alegre, acrescentou, «deu voz a esses movimentos e agora vai confirmar-se de uma maneira mais substancial ainda».
Questionado sobre o peso actual da Renovação Comunista, Carlos Brito justificou que este movimento «não optou por ser um partido político».
«Se o tivesse feito, tivesse feito um trabalho de proselitismo, de recrutamento, naturalmente teria muito mais adesões do que tem no quadro político em que se colocou, de uma associação política. Essa circunstância limita o seu desenvolvimento e crescimento», disse Carlos Brito, referindo que o movimento cultiva «muito a vertente ideológica e de debate», com «um acento muito forte no marxismo», ao mesmo tempo que mantém «um pé na actualidade política do país».
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TVI24 online, 22.05.2010
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terça-feira, maio 25, 2010

O bezerro de oiro

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O bezerro de oiro na sua catedral, onde escasseia o dinheiro mas abunda a fé.
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segunda-feira, maio 24, 2010

Um prédio chamado Portugal

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Os portugueses devem mais de 200 milhões de euros em despesas de condomínio com mais de seis meses, num fenómeno que tenderá a agravar-se com a crise económica e o aumento do desemprego. Além da crise, a venda de casas com dívidas ocultas de condomínio e a falta de cultura de preservação dos espaços semi-públicos são outras razões para o avolumar da dívida, num problema que sobrecarrega as famílias cumpridoras e rouba verbas para a conservação dos edifícios. Jornal I, 24.05.2010


Antes de comprarmos casa cuidamos sempre de saber se a vizinhança é civilizada e se o condomínio tem um valor adequado. Outro tanto não podemos fazer com o país.
Descobrimo-nos para a vida neste belo país que é Portugal mas, à medida que envelhecemos, constatamos que a prestação para o condomínio é cada vez mais insuportável.
A administração do condomínio envolve-se um obras de duvidosa utilidade, para as quais não há dinheiro suficiente, apenas para honra e proveito dos seus membros. Como se tal não bastasse pactua com inúmeros condóminos que não cumprem com os devidos pagamentos fazendo recair as despesas sobre os incautos que insistem em satisfazer as suas obrigações.
Se não fosse cá por coisas mudava-me...
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sábado, maio 22, 2010

Obra feita

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Em média, o Estado português vai endividar-se a um ritmo diário de €30 milhões até ao final de 2013. São mais €44,2 mil milhões de dívida pública total entre 2010 e 2013. As contas são do BPI, num estudo a publicar em breve, onde actualiza as projecções de endividamento público já com as medidas de austeridade apresentadas pelo Governo. Dentro de três anos, a dívida estará acima dos 200 mil milhões e, se nada for feito, ultrapassa 600 mil milhões em 2040. Esta factura inclui não apenas dívida directa do Estado, mas também empresas públicas, regiões autónomas e municípios. São tidas em conta as parcerias público-privadas e as privatizações.
Expresso, 22.05.2010

Sou só eu que acho esta situação caricata ?
Andamos a discutir em tom dramático os recentes aumentos de impostos e os seus efeitos nos nossos bolsos em vez de discutir que, apesar desses nossos sacrifícios, o país vai continuar a afundar-se em dívidas.
Já que ninguém percebe como e quando vamos pagar o que devemos não seria altura de exigir que o Estado fizesse as adaptações necessárias para que a dívida, ao menos, deixasse de crescer ?
Não devíamos andar todos a discutir o que tem que ser feito para o Estado gastar, em cada ano, apenas o montante equivalente às suas receitas ?
Os governantes que, nos últimos 15 ou 20 anos, se têm gabado da "obra feita", que andaram a financiar as suas próprias carreiras sobrecarregando com dívidas as gerações futuras, não deveriam ser investigados e responsabilizados ? 
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sexta-feira, maio 21, 2010

O mundo mudou muito

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A estação de Rabat pronta a entrar em funcionamento

Como disse o primeiro ministro José Sócrates, na TV, o mundo mudou muito em apenas duas semanas.
Tanto assim é que o TGV já não vai para Madrid, como estava planeado, mas sim para Marrocos.
Em 2013 teremos, finalmente, a estratégica ligação em alta velocidade Poceirão-Rabat.
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quinta-feira, maio 20, 2010

O Estado Mitómano

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Extraído de "O Estado mitómano", Manuel Maria Carrilho, Diário de Notícias 20.05.2010


... Quanto à democracia, fala-se muito do desajuste dos parlamentos com a sociedade mediática actual, da descredibilização dos partidos políticos, ou da impotência que cresce ao nível nacional. Tudo isto é verdade, merece reflexão e exige respostas.

Mas há um outro aspecto que merece mais atenção do que tem tido, e que é o cada vez maior abismo que existe, nas sociedades contemporâneas, entre as características que definem um bom candidato, e as qualidades que são a condição sine qua non de um bom governante. Um abismo que tem aumentado constantemente, entre o circo das campanhas eficazes e o ascetismo da necessária preparação, entre a excitação que os períodos eleitorais exigem e a competência que o responsável exercício do poder requer.

Mais - na evolução recente das democracias, há uma sofisticação tanto maior em relação aos modos de chegar ao poder, e de se manter lá, como há descuido e o desleixo em tudo o que se refere à reflexão sobre o que fazer depois, quando se ganham eleições. Não admira que, quando isto acontece, depois não se cumpra o que se prometeu, não se antecipe o que não se conhecia, não se responda ao que não se previu.

E quando falta preparação, já se sabe o que lá vem: idolatra-se o concreto, recorre-se ao activismo e invoca-se, claro, o pragmatismo. Esquecendo-se, todavia, que há um bom e um mau pragmatismo. E que são muito diferentes: o bom é o que é capaz de ligar o conhecimento, a acção e as suas consequências, de uma maneira coerente e responsável. O mau é o que esconde a ausência de estratégia e de visão, atrás das mil faces do calculismo táctico.

As sociedades tornaram-se, de facto, extremamente complexas. Mas isto, em vez de estimular, parece que assusta os candidatos, que cada vez mais se limitam a declinar entre si pequenas variações de cartilhas idênticas, perante (é preciso dizê-lo) a passividade e a cumplicidade dos cidadãos. Não admira assim que não se tenha dado qualquer atenção a quantos anteciparam as dificuldades que atravessam hoje os Estados, com problemas a acumularem-se há uma década, entalados entre ilusões eleitorais e impotências governamentais.

Foi neste ponto verdadeiramente nevrálgico que Jacques Attali (que acaba de publicar um vigoroso alerta Tous ruinés dans dix ans? ) tocou, ao falar do Estado mitómano que tem vindo a criar-se nos últimos tempos, nomeadamente na Europa. Chegou-se, diz Attali, a uma situação em que, "incapaz de fazer respeitar as normas que estabelece, de cobrar as receitas de que tem necessidade para desempenhar as suas funções, o Estado mente a todos, produzindo textos inaplicáveis e distribuindo dinheiro largamente imaginário. Como todos os mentirosos, acaba a mentir a si próprio: torna-se num Estado mitómano, que acima de tudo não quer saber se o que diz é ou não é verdade. (…) O Estado, não tendo já meios reais para agir sobre o mundo, contenta--se em produzir textos e em gastar o dinheiro que não tem. Ocupado a mentir a si e aos outros, torna-se num Estado mitómano. E, como todos os que são atingidos por esta doença mental, mente cada vez mais - a inflação legislativa e o défice público são as formas que toma, na política, o delírio verbal do mitómano". (L'Express, 29/04).

Vale a pena reler, e pensar - porque o Estado do século XXI está, sem dúvida, por inventar.

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quarta-feira, maio 19, 2010

Histórias da Idade de Oiro

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Fui ver o filme "Histórias da Idade de Oiro" ou, em romeno, "Amintiri din epoca de aur".

Os últimos 15 anos do regime de Ceausescu devem ter sido os piores na história da Roménia. No entanto, a máquina de propaganda referiu-se a essa época como os anos de oiro… Mitos urbanos surpreendentes, cómicos, bizarros abundavam, mitos que derivavam de acontecimentos por vezes surreais do quotidiano.

Cinco histórias anedóticas, da autoria de Cristian Mungiu, tratadas por cinco diferentes realizadores, compõem este filme divertidamente amargo.
Nós, os mais velhos, sabemos que a Roménia destes tempos era um regime repressivo, em que imperava o culto da personalidade do "grande líder".
Mas o quadro só fica completo se acrescentarmos a penúria geral, e a geral interiorização da repressão. Um regime baseado no faz de conta.
Os cidadão faziam de conta que amavam o "grande líder", as aldeias faziam de conta que estavam alfabetizadas a 99%, os jornais faziam de conta que Ceausescu era mais alto do que Giscard d'Estaing e todos fingiam ir a caminho do Comunismo.
O problema é que, num regime destes, mesmo um ingénuo estratagema de sobrevivência fácilmente se transforma num enorme crime.

A penúria, a auto-repressão, o incensar do líder, e o fazer de conta continuam infelizmente, em dosagens variáveis, a surgir nas mais insuspeitas situações, mesmo quando o verniz democrático ainda não estalou.
Vendo bem só passaram vinte anos sobre a execução de Ceausescu.
Moral da história: há que estar atento aos fundamentos de qualquer engenharia social que nos proponham. Os nossos projectos de futuro já se terão libertado completamente do  Ceausescu que existe por trás de cada esquina, senão mesmo dentro de cada um de nós ?


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terça-feira, maio 18, 2010

Quem faz parte do problema não faz parte da solução

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Quem tenha acompanhado as intervenções recentes do primeiro ministro, com destaque para a entrevista de hoje na RTP e para as actuações de "stand-up comedy" ontem em Madrid (ver sons aqui e vídeo aqui), começa a perceber que a sua permanência à frente do governo do país é insustentável.
O governo foi eleito na base de um programa que a realidade obrigou a substituir pelo programa do principal partido derrotado. É demasiado inverosímil para poder funcionar.

Toda a retórica sobre a impossibilidade de substituir o governo neste momento cai pela base quando percebemos que a nossa incapacidade para o fazer, essa demonstração de impotência, constitui o pior sinal que podemos dar aos famigerados "mercados".
Um país que não consegue sequer encontrar uma alternativa política para Sócrates, e para o que ele representa, perde só por causa disso qualquer credibilidade internacional no que toca à sua capacidade para regenerar a economia e pagar o que deve.

A imprescindível mobilização do povo português é impossível enquanto for conduzida por quem demonstrou total incapacidade para antecipar os problemas e para começar a responder-lhes antes que se tornassem críticos.
Sem uma renovação convincente do quadro político não haverá saída para a crise económica e social.

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domingo, maio 16, 2010

O tempo de todas as ficções

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Hoje fui, pela primeira vez este ano, à "minha praia". Areia deserta a perder de vista e este OPNI (Objecto Pousado Não Identificado).
Uma espécie de disco voador com cinco metros de diâmetro ? Sinal indecifravel de uma civilização galáctica nestes conturbados tempos de bancarrota ?
Deixemo-nos de ficções. Para isso temos o Senhor Engenheiro.
Deve ser apenas uma bóia marítima de sinalização que se soltou do fundo e o mar trouxe.
Ou então...




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sábado, maio 15, 2010

Lucidez até ao fim

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Fala-se muito, nos últimos tempos, em medidas para reduzir o défice. Medidas fiscais, diz-se até, de justiça fiscal. O aumento do IVA é compreensível e mais justificado do que a redução populista nas cadeiras dos bebés ou nos ginásios, que os consumidores nunca sentiram no bolso. Há pouco tempo foi a aprovação da tributação das mais-valias em IRS para acções detidas há mais de doze meses — medida justa, pois a não tributação era uma singularidade portuguesa. Para as acções alienadas antes da entrada em vigor da lei, a tributação é claramente retroactiva. Mas há na Constituição mais princípios do que o princípio muito tropical da não retroactividade da lei fiscal — ea possibilidade financeira de manter o Estado Social é apenas um deles.
Em qualquer caso, a justiça fiscal é uma questão que não se coloca só do lado da receita pública. Receita e despesa são o verso e o anverso do problema da justiça fiscal. É também muito provável que o esforço financeiro venha a atingir a segurança social, as pensões, as reformas.
Ora, de nada serve aumentar o IVA, ou tributar mais-valias, se o Estado continua a esbanjar recursos.
No esbanjadouro são muito claros dois tipos de papa-reformas: as obras públicas desnecessárias e os papa-reformas em sentido próprio.
O Estado (o Governo, o primeiro-ministro) vive agrilhoado a um conjunto de compromissos políticos, arranjinhos, promessas, vassalagens, dívidas que paga periodicamente em quilómetros de auto-estradas, túneis e, agora, em TGV com paragens em todas as estações e apeadeiros do poder local (desenhado em cima do mapa da volta a Portugal em bicicleta). Já todos sabemos que Portugal tem mais quilómetros de auto-estrada do que muitos países mais desenvolvidos, que não fazem sentido muitas dessas estradas e que é um absurdo havê-las sem custos.
O que é uma verdadeira esquizofrenia é que nada se faça neste momento de verdadeiro aperto das finanças públicas. E o discurso da oposição, que defende a suspensão das grandes obras públicas, mais parece um salivar em vésperas de poder, um repto para que se guarde o melhor vinho para depois de eleições — e não uma verdadeira preocupação com as finanças, ou seja, com os contribuintes.
Além das vassalagens, não podemos esquecer os outros papa-reformas, profissionais da acumulação de reformas públicas, semipúblicas e semiprivadas. Basta ver o caso do Banco de Portugal, ou outros menos imorais, que permitem que uma série de cidadãos — gente séria, acima de qualquer suspeita — se alimente vorazmente, em acumulações de pensões, reformas e complementos, que começam a receber em tenra idade. Muitas vezes até com carreiras contributivas virtuais, sem trabalho e com promoções (dizem que para isto são muito boas a Emissora Nacional / RTP e a Carris).
Tudo isto, como sempre, é feito ao abrigo da lei. É que isso dos crimes contra a lei é para os sucateiros. O problema é que a lei que dá é refém dos beneficiários

"Os papa-reformas", texto de Saldanha Sanches publicado já depois da sua morte, no Expresso de hoje.
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quinta-feira, maio 13, 2010

PEC 1, PEC 2, PEC 3 - Mentiras persistentes

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Europa, de Ludmila 100 x 80 cm, óleo sobre tábua (via LEITURASFAVRE)

Os portugueses têm vindo a ser sucessivamente enganados quanto à real situação económica do país e quanto ao que se pode esperar no futuro, se não houver mudança radical de atitude.
Ainda em Setembro passado, na campanha eleitoral, houve quem omitisse pura e simplesmente a amplitude do endividamento público e privado. Depois disso tem-se vindo a reconhecer as dificuldades e a tomar medidas, sempre a reboque dos acontecimentos.

Agora mesmo, ao anunciar o pacote que de novo revê o famoso PEC, tenta-se fazer crer que se trata de medidas muito duras e insinua-se que, com elas, teremos ultrapassado finalmente os nossos problemas. Nada mais falso. Aquilo que hoje foi anunciado é uma ponta do iceberg de dificuldades e de renuncias a que seremos submetidos nos próximos anos.
Não é por acaso que não tem surgido, por entre as polémicas técnicas sobre as medidas anunciadas, a discussão essencial sobre as causas e os processos da decadência europeia. Mesmo que consigamos debelar a crise actual, se nada for feito, continuaremos a ver definhar as nossas economias e empobrecer as nossas empresas e as nossas famílias. Essa é que é a nossa verdadeira doença, o resto são sintomas.

Há tempos um professor chinês, a viver em Portugal, disse-me que a mais notável diferença que encontrava entre a nossa sociedade e a dele residia no facto de entre nós toda a gente viver a pensar nas próximas férias e/ou a falar das férias passadas. Coisa que a um chinês médio, segundo ele, parece muito estranho.
Criámos na Europa uma sociedade de direitos adquiridos sem dúvida notável mas quiçá inconsciente de que nasceu de um estatuto europeu e ocidental que beneficiou do colonialismo, ainda que indirectamente, ou pelo menos do seu lastro económico.
Recursos naturais baratos e a vantagem do avanço, ou exclusividade, cultural e técnica permitiram aos europeus, no século XX, um desafogo económico ímpar.
As atrapalhações económicas actuais eram impensáveis na Europa dos anos noventa.

O problema é que o mundo muda. Os países dominados tornam-se ciosos das suas matérias primas, os povos bárbaros e incultos acedem à educação e às tecnologias, os trabalhadores sem exigências atraem as empresas e estas arrastam consigo o know-how, multidões gigantescas convertem-se em mercados onde as empresas autóctones obtêm crescimentos brutais, países outrora dependentes tornam-se credores das superpotências e compram empresas e marcas por todo o planeta. Nestas condições de turbulência nenhuma forma de riqueza pode garantir, sem luta, a sua própria imunidade.

A Europa tarda em admitir que está em muito maus lençóis. Os políticos europeus continuam a funcionar como se o mundo não estivesse em revolução. Os aparelhos burocráticos dos Estados e da UE pululam de funcionários, institutos e organizações que não acrescentam qualquer valor e que custam uma fortuna aos cidadãos, não só em ordenados mas também em confusões.
Se não tiver a coragem de responder ao desafio económico global a Europa, ou seja nós, iremos de cedência em cedência perdendo todos os direitos que nos foram garantidos tão irresponsavelmente, até ficarmos na mais apagada e vil pobreza.

A esta luz, meus amigos, o aumento de 1,5% do IRS, ou o ridículo corte de 5% nos ordenados sibaríticos dos gestores públicos, são apenas episódios anedóticos que veremos repetirem-se uma e outra vez.

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quarta-feira, maio 12, 2010

O inglês eclesiástico

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Sócrates encontrou-se hoje, em privado, com o Papa a quem divertiu com o seu inglês eclesiástico.
Tal como fizera rir meia Europa com o seu inglês técnico

terça-feira, maio 11, 2010

Custa muito (a nós) servir o povo

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O ex-secretário de Estado da Administração Interna e da Agricultura no primeiro Governo de José Sócrates vai ganhar um salário mensal bruto de 14 198 euros como vogal da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos – ERSE. Com a nomeação de Ascenso Simões para este cargo pelo Executivo na passada quinta-feira, este é o segundo socialista próximo de Sócrates a ser colocado num organismo regulador desde Novembro de 2009.

Ascenso Simões era membro do secretariado nacional do PS. O salário de cada vogal da ERSE corresponde, segundo esta entidade reguladora, "a 85 por cento do vencimento do presidente da ERSE, sendo actualmente de 14 198 euros". Já o líder da ERSE, Vítor Santos, secretário de Estado no tempo de António Guterres, ganha 16 704 euros por mês. Em Novembro de 2009, Filipe Baptista, então chefe de gabinete de Sócrates, foi nomeado vogal da ANACOM, com salário de 14 198 euros.
Correio da Manhã, 10.05.2010
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segunda-feira, maio 10, 2010

Parafraseando Bocage

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“É uma aceleração, uma intensificação do processo de consolidação que exigirá, não uma mudança na orientação política, mas sim a antecipação de medidas e a tomada de medidas adicionais. Não haverá quebra de compromissos eleitorais”, afirmou o dirigente socialista no final da reunião do secretariado nacional do PS.

Santos Silva aplica às promessas eleitorais a famosa frase de Bocage: "O pum que esta senhora deu, não foi ela fui eu".
Numa reedição do famoso "jamais" informa-nos que afinal o PEC, por razões alheias à sua vontade, não será executado na Ota mas sim em Alcochete. 

É o grau zero da credibilidade. A última coisa que um governo, e um partido, deveriam perder quando se trata de conduzir o país no meio de uma enorme borrasca.

Capacidade de previsão, zero. Prudência na resposta aos "mercados", zero. Congruência entre as bravatas e a capacidade para resistir, zero. Humildade no reconhecimento e correcção dos erros, zero. Preservação da imagem de seriedade e de apego à verdade, zero.

Quase todos dizem que não nos podemos dar ao luxo, neste momento, de mudar de governo. Eu cada vez mais considero que não podemos correr o risco de o manter.  
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domingo, maio 09, 2010

Música antiga

A igreja matriz está a abarrotar de gente para assistir ao concerto. Sucedem-se os oradores.
O senhor prior, muito coloquial, faz as honras da casa.
O senhor bispo da diocese, com os seus olhos pequeninos, desenrola umas matreirices.
O senhor presidente da câmara entra nas frases mas percebe-se que não sabe muito bem como há-de sair.
Cada orador tenta ultrapassar o anterior na lista dos agradecimentos. Começam sempre em "sua eminência" e vão descendo até chegar aos "prezados concidadãos".
Os bancos de madeira da vetusta igreja já esgotaram o tempo em que não se dá por eles e começam a provocar formigueiros e incómodos.
Entra em cena o responsável pela organização que a todos esclarece sobre a história do local em que nos encontramos. Várias gerações de beatos, confrarias e brasonados fizeram da matriz da vila um repositório de tesouros, insuspeitados nesta remota província.
Para ilustrar o discurso o sacristão transporta, penosamente, a custódia de prata dourada que um conde qualquer ofereceu à vila no século XVIII, e pousa-a com orgulho numa peanha do altar-mor. Uma peça preciosa que só se mostra em momentos lustrosos.
O estimado público é feito de engenheiros da câmara e de notários locais, gente que precisa de ali ser vista. Contém igualmente o volátil turista de segunda habitação, mal trajado e que faz gala do seu cosmopolitismo agitando o rabo nas cadeiras de pau.
Mas chegou finalmente a hora da música. Os virtuosos vão revelar-nos a devoção barroca do senhor Heinrich Schütz.
Acabam de se lançar no motete quando irrompe o estrondo de uma mota (inevitavelmente de alta cilindrada). Cruzou o adro, com os seus dois ocupantes, estancou à porta da matriz, e enquanto um aguarda o outro irrompe na nave e grita, abrutalhado:
- Todos com as fuças no chão !
A ordem, dada de supetão, aterroriza o estimado público que fisicamente não tem onde cair morto, salvo seja. Não há mármore que chegue para deitar tantos corpos, ainda por cima com a dificuldade adicional dos bancos corridos e do genuflexório.
O brutamontes, no intuito de dominar a algazarra, dispara a fusca e atinge S. Sebastião no altar da epístola numa premonitória coincidência. Gastando desnecessariamente munições num santo que já se encontrava suficientemente crivado de setas.
E o brutamontes, um bronco que parece não perceber que as peúgas são para enfiar nos pés e não na cabeça, avança pela coxia direito à custódia. Percebe-se que está prestes a convidá-la, sem direito a escusa, para dar uma volta na Suzuki.
Eis senão quando o careca lhe afinfa com o braço da tiorba. Metro e meio de madeira e cordas, num ruído plangente que precede na partitura o estrondo do brutamontes a cair no tabuado do altar-mor.
O virtuoso instrumentista foi de tal afinação que deixou o encapuçado sem conserto. Ele e o resto do estimado público.

sábado, maio 08, 2010

A eficiência britânica

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A Inglaterra, no escasso prazo de um mês, elegeu um novo Parlamento e um novo primeiro-ministro, David Cameron. Uma eficiência notável mas não isenta de fragilidades.

O sistema eleitoral inglês, baseado no tão incensado método dos círculos uninominais, produziu mais uma vez uma chocante disparidade entre o número de votos obtido por cada partido e o número de deputados conseguido.

Mas há um outro problema que é quase sempre omitido.
Os círculos uninominais, tal como as nossas eleições municipais, deslocam as escolhas do terreno das ideias para o das "personalidades". Desequilibram a relação entre as questões nacionais e os temas locais.

Temo que a ligação dos eleitos aos votantes, que costuma ser apresentada como a grande vantagem dos círculos uninominais, acabe por redundar numa subordinação das questões nacionais às lógicas do interesse local.
Por isso não me parece que seja essa a panaceia com que podemos salvar a nossa debilitada democracia.

sexta-feira, maio 07, 2010

Aferir o futuro


Mais de 230 mil alunos realizam hoje a Prova de Aferição de Matemática, teste que visa a recolha de dados relevantes sobre os níveis de desempenho dos estudantes.

Aqui fica um exemplo dos exercícios apresentados aos nossos jovens.

Enunciado
Sendo x o valor em euros do gigantesco endividamento do Estado Português, sendo y o enorme investimento exigido pelas "grandes obras" propostas pelo governo e sendo z a taxa de juro cobrada pelos especuladores dos mercados financeiros:

Descreva a sequência dos cálculos necessários para estimar a sua taxa de IRS quando atingir os 35 anos de idade não usando nunca, na sua resposta, qualquer variante ou sinónimo do termo "emigrar".

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quarta-feira, maio 05, 2010

Saída da crise é um túnel estreito e escuro

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Primeiro-ministro mostra-se “muito confiante” com a evolução da economia portuguesa no próprio dia em que a Moody’s coloca sob análise o rating português e admite corte.
“O que nós temos de fazer é uma política e uma acção política baseada na confiança, confiança em nós próprios e confiança no futuro”, disse ainda Sócrates aos jornalistas antes de abandonar o estaleiro das obras do futuro túnel do Marão, cuja construção esteve interrompida durante seis meses devido à apresentação de uma providência cautelar.

Esta foi também a mensagem que Sócrates deixou na intervenção que fez no interior do túnel, durante a qual reafirmou a importância deste empreendimento. “Trata-se de uma obra que tem uma visão política e uma visão de futuro”, frisou.

SNS - Sucedem-se Notícias do Saque



A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) está a passar a pente-fino os rendimentos de 333 gestores e dirigentes de topo dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde e de intitutos públicos do sector. Segundo a notícia publicada hoje no Correio da Manhã, foram detectados 3,1 milhões de euros em despesas ilícitas no sector.
Ionline 05.05.2010

Cerca de 70 funcionários do Hospital de S. João, no Porto, estarão envolvidos num esquema de fraude à ADSE, com prejuízos para o hospital superiores a 100 mil euros. As irregularidades foram detectadas pela Administração, que apresentou queixa à PGR e abriu um inquérito.
Jornal de Notícias 05.05.2010

Pois é. Escândalos sucessivos mostram que por trás da retórica da defesa do Serviço Nacional de Saúde se escondem muitos interesses e falcatruas.
Sempre que alguém defende a moralização dos gastos públicos é imediatamente acusado de querer destruir o SNS. Mas como repetidamente se comprova há muitas despesas que podiam ser cortadas sem que os cuidados aos utentes sofressem qualquer degradação.
É precisamente esta gente, que faz do SNS uma coutada e uma fonte de lucros fáceis, que se bate desesperadamente contra qualquer racionalização e que, em última análise, provocará a sua destruição.

terça-feira, maio 04, 2010

Descubra as diferenças




Há 40 anos

um jovem consciente, revoltado com as injustiças sociais:
- aderia ao PCP
- militava clandestinamente com risco da sua segurança e da sua liberdade
- propunha-se criar uma nova sociedade que erradicasse a miséria

Hoje

um jovem consciente, revoltado com as injustiças sociais:
- adere a uma causa no Facebook
- colabora num peditório lançado pelo Continente na TV
- arranja finalmente um emprego numa ONG, financiada pelo Estado, que distribui cobertores aos "sem abrigo".

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segunda-feira, maio 03, 2010

O outro rating que faltava

(clique a imagem para ampliar)

Gostava de ter sido eu a inventar esta.
Saíu no Expresso em 01.05.2010
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domingo, maio 02, 2010

E a Grécia aqui tão perto


No dia 4 de Outubro, o PASOK (social-democrata), de Papandreou, venceu as legislativas antecipadas, tomou posse e descobriu que o défice público era de 12,7 por cento do PIB - e não seis, como tinha anunciado o governo conservador da Nova Democracia, de Kostas Karamanlis. A Grécia entrou na espiral da crise.
Entre gregos - e não só - não é com discursos de Cassandra que se ganham eleições. Karamanlis convocara eleições antecipadas para responder à contestação social, avisando que a crise financeira colocava a Grécia em situação difícil. Propunha uma "austeridade temporária", com o congelamento dos salários e das pensões por um ano. Estava sob forte pressão da UE para reduzir o défice e a mais elevada dívida pública da zona euro.
Inversamente, Papandreou fez um discurso optimista, apostando no "crescimento verde" e num ambicioso plano de investimento nas energias renováveis. Prometeu subir salários e pensões. Era a música que os eleitores queriam ouvir.
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De quem é a culpa? Há uma teoria da conspiração: os especuladores estrangeiros e as agências de notação têm o euro como alvo e atacam a Grécia como elo mais fraco. Nos últimos 30 anos, todos os partidos gregos abusaram da retórica "anti-imperialista" para explicar os desastres da Grécia pelas "maquinações neoliberais" ou dos "americanos", escreve o Eleftherotypia (próximo do PASOK).
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Papandreou reconhece agora que é preciso refazer tudo "de alto a baixo". Após o "milagre económico" que se seguiu à entrada no euro e culminou nos triunfais (e ruinosos) Jogos Olímpicos de 2004, o problema vai muito para lá do défice.
A economia grega deixou de ser competitiva e pouco exporta, o que agrava a pressão sobre a dívida. A questão fiscal é aguda. Por tradição histórica, as receitas do Estado sempre assentaram nos impostos indirectos. A fuga ao fisco é generalizada. A corrupção política, patente nos anteriores governos do PASOK, subiu exponencialmente com Karamanlis. A economia subterrânea vale de 30 a 40 por cento do PIB. Serve de amortecedor social, mas à custa das finanças públicas. Os armadores gregos têm a primeira frota mundial, ganham fortunas com as mercadorias chinesas, mas a sua sede fiscal não é em Atenas.

Jorge Almeida Fernandes, Público, 01.05.2010

Estas histórias soam assustadoramente familiares. Onde é que eu já ouvi isto ?

sábado, maio 01, 2010

Sou a favor do TGV

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Não entendo a polémica. Eu sou a favor do TGV e mesmo do novo Aeroporto.
Se, de qualquer modo, quem vai pagar as nossas dívidas são os alemães, também não lhes custa nada fazer mais um esforçozinho para nós ficarmos equipados com essas estratégicas infraestruturas.
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