segunda-feira, outubro 31, 2005

O Cavalheiro da Alegre Figura



O Cavalheiro da Alegre Figura trespassou, inadvertidamente, o seu compagnon de longa route, San Chupança.

Há quem diga que tal se deveu à precipitação na luta contra os moínhos de vento do Alto do Cavaco.

Outros dizem que não passou da dificuldade em distinguir moínhos de vento, de parques eólicos e de parques jurássicos.


(veja AQUI outros cartoons)

sexta-feira, outubro 28, 2005

Os poderes do Professor KAWAKU






Os poderes do Professor KAWAKU


As sondagens recentes mostram uma tendência inelutável para o fim do “Tempo dos Ilusionistas” e a emergência do “Tempo dos Feiticeiros”.

Os Ilusionistas, diz-se, tiveram as suas glórias mas já não são o que eram.
Calhados nas artes do faz de conta prometiam fazer desaparecer isto e aquilo mas toda a gente sabia que as promessas eram a mangar.

Enchiam urnas com votos e depois, numa guinada da batuta, tudo se esfumava sem que eles soubessem explicar para onde.

Com as cartas, baralhavam e tornavam a dar e só saíam duques.

Anunciavam que fariam desaparecer o pântano Dunoçoatrazo mas afinal quem desaparecia eram eles (diz-se que vagueiam agora, como almas penadas, em Bruxelas e Nova York).

Em vez de tirar os pombinhos das cartolas, com o pretexto da gripe das aves, passaram a tirar coelhones o que se converteu numa grande seca.

Há já algum tempo deixaram de serrar as suas partenaires e começaram a serrar presunto.

Aquilo em que ainda tinham algum sucesso, apesar de tudo, era em pegar num manjerico qualquer e, zás !, fazê-lo aparecer num Conselho de Administração.

A gota de água que fez transbordar o copo da impaciência popular foi a promessa recente de fazer desaparecer o défice; quando se foi a ver o que realmente tinha desaparecido eram as reformas, os abatimentos fiscais, os aumentos dos vencimentos e o “diabo a quatro”.

Vendo a tenda do circo a claudicar saltou para a arena o Grande Suarez, o decano dos Ilusionistas, e garantiu que mostraria a quem quisesse ver que a ilusão tudo pode e tudo vence. Prometeu fazer dormir tranquilamente toda a plateia e até mesmo as feras nas jaulas.

Em vão. O povo desanimado ansiava pelo Professor KAWAKU, feiticeiro recém-chegado. A fama dos seus poderes fora mais célere do que a vassoura que o trouxe de Bole-e-Queima.

E tudo isto porquê ? Porque o povo agora quer truques a sério.

O povo está farto do tom coloquial dos ilusionistas popularuchos e quer uma atitude hirta, hierática, e as poucas palavras que sejam abracadabras.

O povo está-se literalmente marimbando para os poderes constitucionais; o que lhe interessa são os poderes do Professor KAWAKU (que ele diz que exercerá activamente).

O povo não quer políticos adiposos como o aparelho de Estado. A única gastronomia que interessa é a poção mágica que mantém KAWAKU elegante e em grande forma.

Quando engolir um sapo o povo quer mesmo que apareça um príncipe encantado que resolva mesmo todos os seus problemas.

(veja AQUI outros cartoons)

quarta-feira, outubro 26, 2005

O Mário Soares que eu receava



"Tenho condições únicas para evitar a crispação política e a grande conflitualidade social. Todos os portugueses sabem que, comigo em Belém, podem dormir tranquilos, passe a expressão, quanto às suas liberdades, direitos, garantias e haveres."
_________________________________________

Na apresentação do seu Manifesto tivemos o Mário Soares que eu receava;

Maniqueísta : "comigo em Belém" é completamente diferente do "Outro em Belém"

Messiânico : "comigo em Belém" podem dormir tranquilos

Malabarista : "Sou a favor das mudanças racionais que a experiência torne necessárias. Não sou, nem nunca fui, situacionista. E também compreendo, com todo o realismo, que o modelo social português não pode abstrair do grau de desenvolvimento do país."

Matreiro : "O Presidente da República (...) é ainda, por assim dizer, o "ouvidor" dos portugueses, assegurando a voz das minorias, dos mais fracos, dos desprotegidos e dos excluídos."

Quando é que Portugal terá a esquerda que merece: rigorosa e não ilusionista, competente e não facilitista, com projectos inovadores e não a jogar à defesa, solidária mas não por compadrio, humanista mas não lamecha, falando do futuro em vez do passado ?

A última coisa que devemos fazer nas presentes circunstâncias é "dormir tranquilos".

(veja AQUI outros cartoons)

sexta-feira, outubro 21, 2005

Os Sonhos de Einstein



Os Sonhos de Einstein
Estreia mundial no Teatro da Trindade


Estreia hoje no Teatro da Trindade, o musical "Os Sonhos de Einstein" baseado no livro "Einstein's Dreams", adaptado por Joshua Rosenblum e Joanne Sydney Lessner.


( edição portuguesa - edição brasileira )

Preso a um casamento infeliz e a um emprego muito aquém das suas capacidades intelectuais, o jovem Albert Einstein deixa-se levar pelos seus sonhos, seduzido pelo canto de sereia de Josette, uma mulher bela e esquiva. Josette deslocou-se do seu lugar no futuro e Einstein é a única pessoa que pode ajudá-la, pois será ele quem desvendará em breve os mistérios do tempo e do espaço. Não se deixando intimidar pelos protestos de Einstein, que se diz mais interessado na electricidade e no magnetismo, Josette convence-o de que deverá dedicar a sua atenção ao tempo e continuar a sonhar com ele até o entender. Só então poderá Josette retomar o seu lugar no universo. Einstein começa realmente a ter uma série de sonhos sobre o tempo e Josette aparece em todos eles. Cada sonho apresenta uma versão diferente da maneira como o tempo poderia funcionar (por exemplo, andando para trás ou permanecendo parado) e, à medida que Einstein começa a apaixonar-se por Josette, as limitações do mundo de cada tempo impõem obstáculos imprevisíveis ao romance entre eles.


(ilustração da PLAYBILL)

Gradualmente, os sonhos de Einstein começam a parecer-lhe mais autênticos do que a vida real e o seu amigo Besso tenta trazê-lo de volta à realidade, embora reconheça a importância potencial dos devaneios de Einstein sobre o tempo. Quando Einstein tem um sonho em que o tempo está parado, é como se ele e Josette tivessem encontrado uma forma de estarem juntos para sempre. Mas Josette apercebe-se de que Einstein nunca fará a sua descoberta a menos que ela o liberte dessa eternidade imóvel, o que acaba por fazer.
Na abertura do segundo acto, Einstein encontra-se num mundo de sonho em que o tempo se move tanto mais devagar quanto mais depressa a pessoa se desloca. Este é, numa versão simplificada, um dos elementos fundamentais daquela que virá a ser a sua Teoria da Relatividade Restrita. Encontrou-a! Mas não encontrou Josette, de quem andava à procura. Lança-se numa série de sonhos caleidoscópicos e quando consegue voltar a encontrar Josette não lhe revela a sua nova teoria; a Relatividade Restrita implica a possibilidade de viajar no tempo e, se ela souber disso, ele perdê-la-á. No sonho seguinte, quando o tempo passa a uma dimensão visível, Josette conduz Einstein ao seu futuro e ele envelhece diante dos nossos olhos até se tornar o emblemático velho das fotografias mais célebres. Nesta altura encontra Josette ainda menina, que o leva a escrever a famosa carta ao Presidente Roosevelt defendendo a exploração da fissão nuclear. Perante a hesitação de Einstein, Josette afirma que não devemos ocultar nenhuma parte do que verificámos ser verdadeiro.
Einstein envia a sua carta a Roosevelt e o tempo começa a andar rapidamente para trás, catapultando Einstein até ao momento em que recebe o seu prémio Nobel, passando pelo nascimento do seu filho e pelo primeiro encontro com a sua mulher, Mileva, ainda recém-apaixonados. Vai parar a um sonho em que o futuro não existe, o que indica que ele e Josette poderiam finalmente ficar juntos. Mas apercebe-se de que deve aconselhar-se com ela e não lhe ocultar qualquer parte da sua teoria do tempo, ainda que isso signifique perdê-la. Com a mesma ausência de egoísmo com que ela o libertou do lugar onde o tempo é imóvel, cabe agora a Einstein deixá-la ir. Ele conta-lhe da sua descoberta e ela desaparece. Mas há algo que ela diz que o faz debater-se com a dúvida: seria ela realmente alguém que apareceu vindo do futuro ou, na verdade, o próprio Tempo?
Einstein acorda e, embora seja ainda um mero administrativo numa repartição de patentes preso a um casamento infeliz, é agora capaz de converter tudo o que aprendeu com os seus sonhos numa nova teoria do tempo e do espaço – a sua Teoria da Relatividade Restrita.
E o mundo nunca mais voltará a ser o mesmo.



Música e Letras - Joshua Rosenblum
Argumento e Letras - Joanne Sydney Lessner
Baseado no romance de - Alan Lightman
Versão Portuguesa - César Viana
Encenação - Cláudio Hochman
Movimento - Jean Paul Bucchieri
Cenografia - José Manuel Castanheira
Figurinos - Rafaela Mapril

Interpretação

Josette - Sara Belo
Einstein - Mário Redondo
Besso - Miguel Coelho
Peter Klausen - Pessoa Júnior
Josie - Alexandra Filipe
Marta, Mileva - Margarida Marecos
Johannes - Paulo Carrilho
Anna - Isabel Campelo
Hilda - Sílvia Filipe

Produção Teatro da Trindade/INATEL

quinta-feira, outubro 20, 2005

Vivemos sempre duas vezes ?

__________________________ Attic Memories, Norman Rockwell


Vivemos sempre duas vezes ?

por Miguel Poiares Maduro


Estas últimas semanas temo-nos repetido tanto: as mesmas personagens, as mesmas histórias, os mesmos dramas. E porque nos repetimos? Descobrimos que queremos viver o mesmo outra vez, imaginamos de forma diferente a vida que vivemos ou queremos viver o mesmo mas de forma diferente? Às vezes há momentos na vida em que parece que nos falta a inspiração para algo diferente. Portugal, por ex., vive um desses momentos. Sentimo-nos prisioneiros da memória em vez de nos inspirarmos nela.
Nos últimos anos da sua vida o poeta irlandês Yeats sentiu-se sem inspiração. Foi na memória que a reencontrou. No poema Circus Animal´s Desertion começa por notar como a falta de inspiração o leva a confrontar-se com a sua vida:

Procurei um tema e procurei em vão
Procurei diariamente, seis semanas ou algo assim
Talvez, agora, sendo apenas um homem desgastado
Tenha de estar satisfeito com o meu coração,
Embora Inverno e Verão até à velhice se tenham iniciado
Os meus animais de circo estavam todos em exposição
(…) Que posso fazer senão enumerar velhos temas

Só que Yeats compõe a partir destes velhos temas um retrato original da sua vida. Não sei é se Yeats está a revisitar a sua vida ou a basear-se nela para construir uma nova. É por isso que o regresso de que fala no fim também aparece como um novo princípio:

Aquelas imagens de mestre porque completas
Cresceram numa mente pura, mas de onde vieram?
Um monte de lixo, o varrer das valetas
Velhas chaleiras, velhas garrafas, e as latas que se partiram,
Velhas pedras, velhos ossos, velhos trapos, a velha
Que mantém a contabilidade
Agora que a minha escada se foi
Tenho de me deitar onde todas as escadas principiam
No ferro velho do coração

Yeats não se repetiu. Inspirou-se na memória. Numa altura em que assistimos a tantas repetições talvez seja bom lembrar que a memória não tem que ser sinal de repetição mas de um novo conhecimento. A memória é o que transporta o passado até ao presente. Ao fazê-lo, no entanto, deixa espaço à interpretação. Esta é moldada pelo tempo e a dúvida é saber se o tempo apura a memória ou, ao contrário, a engana.
Parece que o nosso cérebro organiza dois tipos diferentes de memória: a memória de curto prazo (ligada ao aspectos sensoriais: som, olhar, cheiro, tacto) e uma memória de longo prazo. Qual estará mais próxima da verdade? Será que conhecemos verdadeiramente alguém ou alguma coisa quando estamos na sua presença ou quando damos tempo à nossa memória para seleccionar o que essa pessoa ou facto têm realmente de importante. Será que a distância temporal nos torna mais objectivos ou, simplesmente, mais selectivos?
Tendemos a ver a memória como o registo da nossa vida. Mas a memória não é um processo de gravação mas sim de edição. É que a memória é finita e, logo, temos de seleccionar o que merece fazer parte dessa memória. Editamos o nosso passado para construir a nossa memória das coisas e das pessoas. Por vezes, exacerbamos o que elas tiveram de negativo, outras vezes exaltamos o que tiveram de positivo. Só que não sabemos se devemos acreditar na nossa nova história ou na história que nos lembra a memória da nossa memória. Há até quem mude de memória consoante muda de história. É nossa, no entanto, a responsabilidade do que cabe na nossa memória. É por isso que não se podem justificar certas falhas de memória com os limites da memória: "- Esqueceste-te do nosso aniversário!" "Desculpa querida mas já não tinha memória disponível…".
A verdade é que uma boa memória não é uma grande memória (que se lembra de muita coisa) mas sim uma memória crítica. Mais relevante que a informação que nos transmite a memória é a curiosidade que ela pode promover. Nada tem mais memória ou informação que um computador mas não diremos que um computador é culto ou faz bom uso da memória. O conhecimento não se esgota na memória. Ao contrário, a memória deve ser um incentivo ao conhecimento. Mais do que como uma base de dados devemos conceber a memória como um instrumento de juízo crítico e fonte de inspiração. A razão não nos permite controlar a memória mas permite-nos discutir com ela. Emoção e razão de novo juntas… Como diz Kaufman (o argumentista de um filme chave sobre a memória: The Eternal Sunshine of the Spotless Mind): "A história é sobre emoções e sobre a memória e ambas estão no cérebro. Se a centrasse no coração seria apenas sobre bombear sangue".
É por isso que não concebo memória mais importante que a memória emocional. Neste caso, o que conta não é tanto se a memória reproduz uma verdade histórica mas sim a inspiração que pode resultar dessa memória. É assim com a memória da mulher que se ama: não é visual mas emocional. A emoção que me transmite a sua memória revela-me a sua beleza mas não me permite descrevê-la. Será esta memória verdadeira? Pouco importa, o que é importante é que ela mereça essa memória. Há memórias assim, em que o que nos fica gravado é a emoção que algo nos provocou. Só que a memória também nos provoca novas emoções: a tristeza é a memória dos maus momentos; a melancolia é a forma como a memória se recorda dos momentos felizes.
Hoje, no entanto, as pessoas parecem menos preocupadas com a sua memória do que com a memória com que os outros ficam delas. Os diários e as autobiografias têm, frequentemente, pouco de memória e muito de tentativa de implantação de uma certa memória nos outros. E o que será pior: ser uma má memória ou não fazer parte da sua memória?
Também se diz que há pessoas sem memória: é o caso dos chefes que nos despedem ou das mulheres que nos deixam! Claro que a razão, frequentemente, é outra: é que elas não partilham das nossas memórias…
Hoje em dia, até a memória parece ser a prazo. Recentemente, ouvi na rádio que a qualidades das novas formas de impressão das fotografias digitais é muito superior a anterior mas que apenas durarão 100 anos. Aparentemente isto é comum a outros meios de gravação actuais. Já pensaram bem: daqui a 100 anos não existirá memória de nós. É verdade que há muitas coisas que se passam hoje das quais, provavelmente, preferíamos que não restasse memória, mas o que me preocupa não é tanto preservar a nossa memória mas assegurar o futuro dos outros: é que sem memória podem bem vir a repetir os nossos erros. Um povo que não faz bom uso da memória fica preso à sua História. Pensando bem, temo que hoje já seja comum repetirmo-nos sem memória. Portugal parece estar sempre a repetir o mesmo filme com actores diferentes. Falamos tanto da nossa memória colectiva mas parece que não aprendemos nada com ela. O problema da memória colectiva é que se já é difícil aprender com a nossa memória (quantas vezes repetimos os mesmos erros) ainda é mais difícil aprender com a memória dos outros (de pouco serve conhecermos os seus erros). Daí que sejamos herdeiros de uma História mas não tenhamos memória.
Será que alguém se lembra de quando perdemos a memória?

Vivemos sempre duas vezes?
por Miguel Poiares Maduro

segunda-feira, outubro 17, 2005

Norte, para os amigos



Ser quer ver as fotografias que fiz no Douro, Porto e Minho clique na foto.

quinta-feira, outubro 13, 2005

As eleições em FelgOeiras e GondoMarco


As eleições em FelgOeiras e GondoMarco

A histeria comunicacional instalou-se durante a campanha para as Autárquicas como se os únicos candidatos do país fossem o Fataltino e Valentorres.

As Entidades Oficiais, os Comentadores Certificados e os Dirigentes Partidários fizeram um corrupio de apelos para que o povo votante resolvesse nas urnas aquilo que as leis e os tribunais não tinham querido, ou sabido, resolver em tempo útil.
O povo foi até subtilmente ameaçado de conivência com os crimes que os “arguidos” possam ter cometido.

Este verdadeiro torção à separação entre a política e a justiça, que o povo recusou liminarmente, seria justificado pela “dignificação do sistema político”. Ora o povo sabe que o Fataltino e o Valentorres foram “nados e criados” nos partidos, a quem deram bons dividendos eleitorais e foram afastados, só agora, por receio de que os salpicos viessem a atingir esses mesmos partidos.

Os partidos e todos os que mistificaram esta questão, ocultando as suas responsabilidades atrás da “moralização”, ajudaram a dar mais uma forte machadada no nosso regime democrático. Os eleitores mostraram que reprovam esse sacudir da água do capote.

As votações, no geral, mostram que a população decidiu deixar à justiça a punição de eventuais crimes e votar nos candidatos que, bem ou mal, julga servirem melhor os seus interesses. Não votou nos candidatos por eles serem arguidos mas, sem dúvida, votou neles APESAR de serem arguidos.

Isso mostra que, para além de não dar crédito a todos os que apresentaram a eleição de Fataltino e Valentorres como um perigo para a democracia, os votantes entenderam que não tinham que ser eles a corrigir a inépcia e morosidade do sistema judicial. Também disseram que cabe aos eleitores, e não aos partidos, penalizar politicamente aqueles que o mereçam.

O funcionamento errático e obscuro do sistema judicial e político leva à relativização das situações; foi só aquele que fugiu aos impostos ? será condenável fugir a uma prisão preventiva que ninguém sabe quanto tempo vai durar ? dar, pela porta do cavalo, uns cobres para o clube da terra é mais grave do que gastar muitos milhões em estádios sem préstimo ? por que é que o autarca de Ponta do Sol, na Madeira, só foi acusado um dia depois das eleições ? é mais grave preferir os amigos nos fornecimentos à Câmara ou nomear os amigos para cargos e reformas chorudas mesmo que para tal seja preciso indemnizar os demitidos ? quantos autarcas estão a ser investigados pela polícia em todo o país ?
Esta moral relativista pode ser criticável mas mais ainda o serão aqueles que pela sua acção, ou omissão, permitiram que o incumprimento se generalizasse.

Os poderes instituídos detestam ser postos em causa e não é de excluir que os vencedores de FelgOeiras e de GondoMarco venham a pagar, nos tribunais, um preço muito elevado pela sua ousadia.

O sistema político tentou usar quatro casos de contornos rocambolescos, protagonizados por figuras frágeis, para limitar as veleidades dos cada vez mais numerosos que tentam fazer funcionar a democracia à margem dos partidos, apesar dos partidos e mesmo contra os partidos. Alcanena, Redondo, Alvito e Sabrosa são exemplos de vitórias de quem “correu por fora”.

FelgOeiras e GondoMarco não são casos isolados e, muito menos, aberrantes.
Tudo leva a crer que os eleitores desses locais são tão bons, ou tão maus, como quaisquer outros. Tudo leva a crer que os mesmos comportamentos ocorreriam, em circunstâncias equivalentes, em qualquer outro concelho de Portugal.
Que se saiba o Engenheiro Sócrates não enjeitou os votos maioritários (entre os 40 e os 50 por cento) que teve em FelgOeiras e GondoMarco em Fevereiro de 2005. Muitos dos votantes em Fataltino e em Valentorres votaram também em José Sócrates.

É caricato que aqueles que se dizem preocupados com a democracia se atrevam a qualificar os resultados eleitorais em função das motivações que presumem para os eleitores.
O crime dos FelgOeirenses e dos GondoMarquenses seria o de pôr os interesses locais acima do interesse nacional. Quem nos garante que foi o interesse nacional que motivou os votos que dados a Sócrates em Fevereiro ?
É preciso ser muito limitado para não perceber que por este caminho é que se põe a democracia em cheque.

As motivações dos eleitores, quaisquer que sejam, são uma questão íntima, inviolável e um direito soberano. As autarquias são apenas mais uma organização “corporativa” de interesses organizados com base na vizinhança em vez de serem definidos pela profissão ou qualquer outro identificador/diferenciador. As “corporações” são, no essencial, instrumentos para dar expressão e potenciar os interesses individuais.

É lugar-comum considerar que os eleitores, ao votar, estão a fazê-lo com o intuito de promover o Interesse Público. Nada permite confirmar tal crença.

Se tomarmos em consideração a forma como têm reagido às medidas de austeridade de Sócrates os farmacêuticos e os enfermeiros, os juízes e os polícias, os funcionários e os professores teremos que concluir que a maioria absoluta de que ele dispõe não resultou de um mandato patriótico para “salvar as finanças públicas” mas sim de cálculos pessoais interesseiros baseados na ambiguidade quanto aos sacrifícios exigíveis aos portugueses e na promessa, feita durante a campanha, de não aumentar os impostos. É sempre mais fácil esperar que a solução resulte do sacrifício dos outros.

Em conclusão, não faz sentido irem a correr alterar a lei eleitoral para fingir que estão a “proteger a democracia”. Para salvar o Regime basta fazer funcionar a Justiça de forma expedita e corrigir os comportamento dos partidos e dos políticos, deixando de prometer o que não podem cumprir e deixando de gastar o dinheiro que não têm.

P.S. (ao cuidado de Mário Soares) – A eleição em Lisboa de um tipo feio, pouco mediático e sem pedigree partidário, e no Porto de um teimoso, quase-bronco que não se coíbe de mandar o Pinto da Costa “à fava” leva a pensar que o tempo dos ilusionistas está a chegar ao fim.

terça-feira, outubro 11, 2005

A Voz do Dono ?



Eu sou um leitor assíduo do DN e sei que este jornal tem um historial triste de "colagem" ao poder vigente em cada momento.

Mesmo assim considero muito grave esta primeira página (7/Out/2005) onde se vaticina a vitória de Carrilho e de Assis com o intuito, ao que parece, de "moralizar" os respectivos votantes.

A distância da realidade é tão grande que a hipótese da incompetência, que também seria grave, parece improvável.

Este episódio que ocorre pouco tempo depois de uma recomposição da direcção do DN autoriza todas as dúvidas sobre seriedade das nomeações que tiveram lugar.

quinta-feira, outubro 06, 2005

Ouvindo os silêncios

_______________________________________________ 2002 - FPR



Ouvindo os silêncios
por Miguel Poiares Maduro

E se desta vez eu não escrevesse nada? O que quereria dizer o meu silêncio? O que é que quis dizer não dizendo nada? Ou será que simplesmente não tinha para dizer? Será que o silêncio é, como diz um personagem de Shakespeare em Tanto Barulho por Nada, a única forma de realmente exprimir a felicidade pois pequena seria a nossa felicidade se a pudéssemos descrever em palavras? Ou será que o silêncio, como defendeu George Steiner ao falar do holocausto, é antes a única forma de exprimir o que é tão terrível que não é susceptível de ser revelado através das palavras? Não podiam ser mais diferentes estas duas leituras do silêncio e, no entanto, partilham algo: a noção de que o silêncio é o único recurso que temos quando as palavras já não chegam.

Na verdade, o silêncio pode ter mais sentidos que todas as palavras. Pode ser uma forma de acção ou um instrumento de reflexão. Pode servir para esconder um segredo ou revelar um estado de alma. Pode ser uma forma de cumplicidade mas também pode ser o único instrumento de resistência. Pode ser sinal de ignorância ou, ao contrário, ser o reflexo da curiosidade. Pode ser uma forma de distanciamento como pode, igualmente, ser uma forma de comunicação.
Seja em que sentido for o silêncio é a única linguagem que apenas a nós pertence. Mas é um instrumento para nos refugiarmos em nós mesmos ou uma forma de dizermos algo aos outros? E o silêncio deve servir para pensar ou para sentir? É o silêncio o caminho para escutar o que pensamos ou será que, como diria o Caeiro de Fernando Pessoa, o silêncio deve ser antes utilizado para procurar sentir sem pensar pois pensar é não compreender um mundo que apenas foi feito para se sentir?

Não falarás!

Tenho uma certeza: existe hoje um crescente desconforto com o silêncio (quantas pessoas não vão pelas escadas para evitar os silêncios do elevador…). Não é que exista menos silêncio, existe é um outro uso do silêncio. O silêncio pode ser sinal de intimidade (sentir-se confortáveis a partilhar um momento de silêncio) mas, mais frequentemente, é hoje sinal de indiferença ou mesmo de quase intolerância. Hoje, quando não se fala não é porque se quer estar em silêncio mas porque não se tem nada para dizer ou, pior ainda, se teme o que se possa vir a dizer. Sempre me impressionou o número de casais, em restaurantes e outros locais públicos, que passam horas sem falar um com o outro Não creio que estejam a desfrutar do silêncio… Aliás, acho que escolhem locais bem ruidosos para terem a certeza de que o barulho dos outros os deixa, sim, desfrutar do silêncio do outro! (o que é algo bem diferente de desfrutar do silêncio). O que pretendem é libertar-se da "obrigação" de comunicar. Saem não para estar juntos mas para evitar terem de se suportar ou descobrir que não têm nada para conversar. Há imensos casais para quem as vidas sociais intensas são na realidade uma forma de escaparem ou do outro. Nestes casos, estar em silêncio é apenas um estratagema para evitarem ficar a saber que apenas teriam coisas inconvenientes a dizer… Estes casais não estão em silêncio. Estão é a procurar fugir do seu silêncio.

Seja como for, hoje não convivemos bem com o silêncio. Há sempre uma música de fundo onde quer que estejamos. Até nas igrejas, local onde o culto se associava tantas vezes ao silêncio, é hoje frequente entrarmos e ouvirmos em fundo música sacra, como se as pessoas temessem ficar a sós com Deus. Parecemos obcecados em preencher o silêncio como se o silêncio não contivesse vida e, desta forma, um momento de silêncio fosse um momento perdido. Quando nos falam de uma vida intensamente vivida nunca pensamos numa vida vivida em silêncio.

Talvez isto esteja associado ao que o sociólogo Zygmunt Bauman chamou de "vida liquida", a vida moderna feita de constantes mudanças, a um ritmo alucinante, dirigida pela procura de tudo experimentar e consumir que se traduz em permanentes novos começos. Só que, o outro lado desta vida, como nota Bauman, são os constantes e dolorosos fins, a insatisfação permanente e uma vida permeada pelo receio da incerteza. Talvez seja também por isto que há tanta gente que acaba afinal por se refugiar no mais absoluto silêncio. Cada vez sei de mais casos de pessoas que abandonam tudo por uma vida de isolamento e meditação. O silêncio é neste caso uma outra opção de vida. Parece que a única alternativa a uma vida sem silêncio é uma vida em silêncio.

Compondo com o silêncio
Para mim o silêncio não é uma forma de vida, nem sequer uma pausa na vida. É antes uma pausa que muda a vida. Recentemente vi um documentário sobre Abbado intitulado "Ouvindo o silêncio". Nele, o maestro italiano realçava a importância do silêncio no contexto de uma música: para Abbado, o silêncio não serve apenas para assinalar o fim de uma frase musical e o início de outra mas é antes parte da música alterando a nossa percepção do que estava antes e condicionando o que vem a seguir. Com a vida é o mesmo.

A arte é aliás paradigmática de como se pode utilizar o silêncio para condicionar a vida. Basta notar em como no cinema o silêncio é o melhor instrumento de tensão. No cinema, tempo narrativo e tempo real raramente coincidem. Num contexto em que anos passam em poucos minutos, um instante de silêncio é realmente uma eternidade. Perturba o espectador, suscita-lhe dúvidas e ansiedade, antecipa o desconhecido e, quando nada se segue, deixa apenas uma enorme tensão por resolver. Gerir o silêncio é uma arte. O silêncio pode ser mesmo o melhor instrumento da narração.

Na literatura, também há silêncio.
Pausa
Ele reforça a importância de uma frase.
Pausa.
É uma pista deixada ao leitor.
Pausa

O silêncio também pode ser entendido como um alerta para ouvir outros sons da vida. O compositor John Cage escreveu uma música denominada 4 33' que é apenas… silêncio. Mas o objectivo de Cage não é impor-nos o silêncio mas provar que o silêncio não existe e que há sempre alguns sons que escutamos. Só que, como ele próprio referia, os sons do silêncio têm tanto de real como de imaginário. É por isso que, por vezes, o silêncio também nos engana. Quantas vezes não associamos o silêncio de alguém a uma personalidade observadora e inteligente ("saber estar calado") para depois descobrirmos que afinal o mistério não tinha nada de misterioso: era apenas alguém sem nada de interessante para dizer. Quantas falsas reputações não foram adquiridas através do silêncio? Como notava Eça, em Portugal, há muitos génios que passam a vida em silêncio: "Toda a gente diz que é um génio". "Mas já ouviste ou leste alguma coisa dele?". "Não, mas toda a gente sabe que é um génio. É um génio tão grande e tão insatisfeito que prefere, não escrever nada". Há silêncios que merecem ser criticados ou, pelo menos, ignorados.

Eu não sou do tipo silencioso mas aprecio o silêncio. Tudo depende do silêncio. Há coisas que se apreciam melhor em silêncio mas há outras perante as quais não devemos ficar calados. Há momentos para trocar palavras e há outros para viver em silêncio. Neste instante, quero oferecer-lhe um pouco de silêncio…

Ouvindo os silêncios
por Miguel Poiares Maduro

sábado, outubro 01, 2005

2014

__________________________________ Inorganic Love Affair, Emell

1984 em 2014 ?

O "Big Brother" 30 anos depois ?

Um mundo de criatividade generalizada e de partilha da informação ?

Sem alarmismos devemos considerar e tentar analisar o mundo que estamos a construir, com a nossa acção ou com a nossa omissão.

Veja um futuro possível (provável ?) clicando na foto.

Trata-se de um "documentário flash" de Robin Sloan obtido a partir do site da LighOver Media.

Se tem uma ligação lenta prepare-se para esperar pois vale a pena.
A "banda sonora" é muito importante.