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O manual da política europeia para lidar com a crise da dívida soberana estabelece um primado contra-intuitivo: uma verdade é sempre mentira até prova em contrário. O governo da Grécia jurava não precisar de assistência externa até ao dia em que a pediu. Chegou em Maio de 2010. Ocorreu o mesmo na Irlanda e em Portugal.
A crise sistémica da dívida soberana passou agora à segunda fase. Depois da estabilização financeira na zona euro, é preciso começar a resolver os problemas económicos. E é aqui que entra a "reestruturação da dívida", uma hipótese que todos negam mas que está no horizonte. O haircut, ou corte de cabelo, significa uma renegociação com os credores privados para reduzir o valor líquido da dívida.
Os credores privados estão a pressionar a reestruturação da dívida grega. Um estudo do Citigroup permite perceber porquê: "Acreditamos que a maioria [dos credores] admite a necessidade do haircut, sobretudo porque a austeridade não está a produzir os efeitos desejados. Neste ponto, os credores querem racionalmente minimizar as perdas. Por exemplo, para baixar o rácio da dívida para 90% do PIB, o haircut teria de ser de 52% em 2011, 63% em 2012 e 68% em 2013 - 70% em 2014 e 2015". Quanto mais esperam, mais se acumula dívida e maior a probabilidade do haircut necessário ser maior. "Uma das lições das economias emergentes é a de que, se for necessário reestruturar dívida, é melhor fazê-lo mais cedo do que tarde", afirma Athanasios Vamvakidis do Bank of America/Merril Lynch, "mas no caso de haver risco de contágio e vulnerabilidades no sector financeiro é melhor esperar". Jürgen Stark, economista-chefe do Banco Central Europeu, concorda: "Uma reestruturação de dívida num país do euro arriscaria desencadear uma crise bancária que, em último caso, excederia os efeitos do Lehman Brothers", cuja falência custou 150 mil milhões de dólares e provocou a crise financeira global. A maior falência da história foi a da Argentina: 90 mil milhões de dólares.
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Nenhum país com um endividamento superior a 150% do PIB resistiu, com excepção do Japão, à reestruturação: o que pode significar extensão dos prazos de pagamento, redução dos juros e/ou cortes no valor líquido da dívida.
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A UE está a encorajar o reforço de capital da banca europeia com novos testes de stresse (apesar de os bancos continuarem a esconder nos balanços perdas com potenciais falências periféricas). O objectivo é evitar uma crise bancária sistémica na zona euro. Sem bancos preparados não haverá haircut na dívida soberana. Mas pode haver reescalonamento dos prazos de pagamento até 2013, data em que mudam as regras do jogo.
Jornal I, 26.04.2011 (ver o texto completo)
Com o barbeiro da dívida tudo muda de figura. Se os credores- esses gananciosos- forem forçados a perdoar uma parte substancial da dívida "para minimizar os prejuízos" vamos ter que rever as nossas concepções políticas.
Os políticos irresponsáveis e gastadores dos últimos anos podem afinal revelar-se brilhantes e visionários estrategas. As vacas gordas já ninguém nos tira. Tudo o que esbanjaram será pago pelos odiosos especuladores ou seja, recuperando o famoso slogan, "os especuladores que paguem a crise".
O único problema desta estratégia é que eles, os desumanos mercados, tão depressa não caiem noutra. Quem é que vamos engrupir entretanto?
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O manual da política europeia para lidar com a crise da dívida soberana estabelece um primado contra-intuitivo: uma verdade é sempre mentira até prova em contrário. O governo da Grécia jurava não precisar de assistência externa até ao dia em que a pediu. Chegou em Maio de 2010. Ocorreu o mesmo na Irlanda e em Portugal.
A crise sistémica da dívida soberana passou agora à segunda fase. Depois da estabilização financeira na zona euro, é preciso começar a resolver os problemas económicos. E é aqui que entra a "reestruturação da dívida", uma hipótese que todos negam mas que está no horizonte. O haircut, ou corte de cabelo, significa uma renegociação com os credores privados para reduzir o valor líquido da dívida.
Os credores privados estão a pressionar a reestruturação da dívida grega. Um estudo do Citigroup permite perceber porquê: "Acreditamos que a maioria [dos credores] admite a necessidade do haircut, sobretudo porque a austeridade não está a produzir os efeitos desejados. Neste ponto, os credores querem racionalmente minimizar as perdas. Por exemplo, para baixar o rácio da dívida para 90% do PIB, o haircut teria de ser de 52% em 2011, 63% em 2012 e 68% em 2013 - 70% em 2014 e 2015". Quanto mais esperam, mais se acumula dívida e maior a probabilidade do haircut necessário ser maior. "Uma das lições das economias emergentes é a de que, se for necessário reestruturar dívida, é melhor fazê-lo mais cedo do que tarde", afirma Athanasios Vamvakidis do Bank of America/Merril Lynch, "mas no caso de haver risco de contágio e vulnerabilidades no sector financeiro é melhor esperar". Jürgen Stark, economista-chefe do Banco Central Europeu, concorda: "Uma reestruturação de dívida num país do euro arriscaria desencadear uma crise bancária que, em último caso, excederia os efeitos do Lehman Brothers", cuja falência custou 150 mil milhões de dólares e provocou a crise financeira global. A maior falência da história foi a da Argentina: 90 mil milhões de dólares.
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Nenhum país com um endividamento superior a 150% do PIB resistiu, com excepção do Japão, à reestruturação: o que pode significar extensão dos prazos de pagamento, redução dos juros e/ou cortes no valor líquido da dívida.
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A UE está a encorajar o reforço de capital da banca europeia com novos testes de stresse (apesar de os bancos continuarem a esconder nos balanços perdas com potenciais falências periféricas). O objectivo é evitar uma crise bancária sistémica na zona euro. Sem bancos preparados não haverá haircut na dívida soberana. Mas pode haver reescalonamento dos prazos de pagamento até 2013, data em que mudam as regras do jogo.
Jornal I, 26.04.2011 (ver o texto completo)
Com o barbeiro da dívida tudo muda de figura. Se os credores- esses gananciosos- forem forçados a perdoar uma parte substancial da dívida "para minimizar os prejuízos" vamos ter que rever as nossas concepções políticas.
Os políticos irresponsáveis e gastadores dos últimos anos podem afinal revelar-se brilhantes e visionários estrategas. As vacas gordas já ninguém nos tira. Tudo o que esbanjaram será pago pelos odiosos especuladores ou seja, recuperando o famoso slogan, "os especuladores que paguem a crise".
O único problema desta estratégia é que eles, os desumanos mercados, tão depressa não caiem noutra. Quem é que vamos engrupir entretanto?
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3 comentários:
Vacas gordas? A mim não me calhou nenhuma.
Não estás no partido certo.
razão tinham os Gregos que tinham a profissão de cabeleireiro/barbeiro como profissão de risco e assim podiam reformar-se mais cedo....
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