O Senado italiano adiou para hoje à noite ou amanhã de manhã a votação final do Orçamento do Estado, de que depende a sobrevivência do Governo de Romano Prodi. A coligação de centro-esquerda tem uma maioria tangencial e está dependente da incerta coesão dos seus senadores. Se a Lei Financeira passar, será uma derrota para Silvio Berlusconi. Se for chumbada, a demissão de Prodi é inevitável. Deverá suceder-lhe um governo "técnico" e um período dominado pelo debate da reforma da lei eleitoral. A fragilidade da maioria governamental foi ilustrada na terça-feira, quando os três liberais-democratas, do antigo primeiro-ministro Lamberto Dini, fizeram aprovar uma emenda da oposição sobre o financiamento da investigação universitária. Dini ameaça agora chumbar outra disposição, a limitação do salários dos gestores das empresas públicas, por a considerar antiliberal. Mantém em segredo o voto final sobre o orçamento.Também entre os aliados comunista há ameaças veladas. Todos têm presente a queda do anterior executivo de Prodi, numa votação sobre a política externa, em Fevereiro passado, graças à "deserção" de três senadores da maioria.
"Uma lei não escrita da política italiana diz que os governos nunca caem no dia do juízo. (...) A emboscada, para ser eficaz, deve ser inesperada e fulminante: se foi anunciada, perde subitamente grande parte da sua força". Por isso, os bookmakers apostam na vitória de Prodi sobre Berlusconi
A campanha de Berlusconi para fazer cair Prodi nesta votação pode transformar-se num bumerangue contra ele. O seu partido, Força Itália, convocou manifestações em várias cidades para obter cinco milhões de assinaturas a exigir eleições antecipadas. Mas os seus aliados, Gianfranco Fini, da Aliança Nacional, e Pierferdinando Casini, da União dos Democratas Cristãos e do Centro, não estão interessados em eleições antes da aprovação de uma nova lei eleitoral, que reduza a dispersão do leque partidário e o poder de chantagem dos micropartidos sobre o primeiro--ministro, de direita ou de esquerda. Mas permanecem em desacordo sobre o sistema a adoptar.A revisão da lei eleitoral interessa também ao novo Partido Democrático (centro-esquerda), que tem estado refém do impasse, pois o seu líder, Walter Veltroni, só se poderá afirmar depois do desfecho da questão orçamental.
O debate decorre num certo tom de farsa, pois o que está em causa não é propriamente o orçamento, ou as reformas, mas subtis jogadas para ganhar vantagens políticas.
"Uma maioria deficiente, uma oposição estéril. O Parlamento é o reflexo de uma política inerte".A opinião pública está obcecada por outros temas. Um é a questão dos imigrantes ilegais romenos, acusados de fazerem subir a criminalidade. Outro é a violência e a crescente politização das claques desportivas: foi ontem o funeral do jovem Gabriele Sandri, morto pela polícia durante um confronto entre adeptos da Lazio e da Juventus.
Esta trapalhada respigada da imprensa dá-me vontade de parafrasear o dixote que os ingleses aplicam aos franceses: "ao menos não somos italianos".
Abre-se no entanto outro campo de dúvidas, estudos e previsões: quanto tempo demoraremos em Portugal a atingir um caos semelhante ?
Em defesa dos chulos
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*cional*parece haver seis juízes
cavernícolas
*«O Tribunal Constitucional recusou legalizar o proxenetismo, mas os juízes
do Paláci...
Há 27 minutos
1 comentário:
Já toda a gente o disse: a semana passada, mais do que um debate sobre o Orçamento, tivemos um debate sobre história. O que ninguém disse foram duas coisas. Em primeiro lugar, que com a actual classe política é fatal que todos os debates políticos
tenham um sabor antigo. Em segundo lugar, que para o PSD, ao contrário do que ensina a sabedoria, é fundamental falar do passado.
Aparentemente, entre os políticos, só Santana Lopes e Paulo Portas parecem ter o privilégio de representar o passado. É uma grande injustiça para os outros. José Sócrates foi ministro do Governo fugitivo de António Guterres. Jerónimo de Sousa é há quase 30 anos (desde 1979) membro do comité central do PCP e foi o célebre candidato presidencial dançante do partido em 1996. Francisco Louçã já dirigia a Liga Comunista Internacionalista em 1974 e foi a cara das desesperadas tentativas do Partido Socialista Revolucionário (nova encarnação da LCI) para eleger um deputado em Lisboa nas décadas de 1980 e de 1990.
Dir-me-ão: todos temos um passado. Mas o que caracteriza os nossos actuais políticos é que eles não parecem ter mais nada. Os líderes do Bloco de Esquerda são "jovens" há 30 anos. As suas ideias para o país continuam resumidas ao refrão da União Democrática Popular na década de 1970: os "ricos que paguem a crise". No caso do PCP, só a biologia impediu que tenha a mesma direcção de 1941. No entanto, ao contrário do que se diz, evoluiu muito, mas neste sentido: em cada momento, desde 1976, foi sempre o último defensor da legislação que tinha sido o primeiro a atacar. É o partido conservador por excelência deste regime: o passado, para o PCP, é sempre melhor do que o futuro. De resto, para perceber as esquerdas da oposição vale a pena ler a serenata de saudade ao comunismo no suplemento do PÚBLICO da passada quarta-feira. No que respeita à esquerda que nos governa, basta ouvi-la falar do futuro: o PS continua fiel à "paixão da educação", que já em 1995 era a garantia de que seríamos em 2007 um país próspero. Em suma, se o filme à esquerda é o mesmo, com os mesmos personagens e as mesmas ideias, porque é que haveria de ser diferente à direita?
Quanto à insistência de Meneses e de Santana em falar do Orçamento de 2005, em vez de discutir o de 2008, faz todo o sentido. O PSD que eles representam não deseja ser uma alternativa diferente ao PS: quer ser apenas o seu herdeiro natural. Daí a fúria com que Meneses, o suposto "populista", puxou brilho às medalhas do seu sentido de Estado em matéria de impostos e de referendo europeu. No fundo, os líderes do PSD gostariam de ter feito o que o PS fez nos últimos anos, e sobretudo gostariam de fazer o que suspeitam que o PS vai fazer nos próximos. Daí a confusão das suas investidas contra Sócrates: exigem cortes da despesa, mas criticam os cortes na despesa; lamentam a subida dos impostos, mas pedem garantias de que os impostos não vão descer. Acusam o Governo de insensibilidade social, e logo a seguir de eleitoralismo. Convinha-lhes que as coisas estivessem a correr mal de um modo mais óbvio.
Como a realidade não os ajuda, os líderes do PSD propõem-se ajudar a realidade. "Desmontar" é, hoje, a palavra que mais se ouve na boca da gente desta direita. Querem desmontar tudo: o Orçamento, o défice, as reformas. Provar que as propostas estão erradas, os resultados são falsos e as mudanças mais urgentes foram adiadas. Por detrás deste desconstrutivismo furioso está a esperança de convencer os portugueses de que o PSD, feitas muito bem as contas, é preferível ao PS. É a estratégia que convém a quem não quer nem pode separar-se das políticas do PS. Daí que muita gente, à direita, acredite que o PSD se devia concentrar na "desmontagem" da actualidade e que é um erro voltar ao passado.
Só que a história recente não é, para estes líderes do PSD, uma opção: é uma fatalidade. Não chega provar que o PS é mau. É necessário ainda provar que o PSD foi bom. Porque o crédito do PS foi feito à custa do descrédito do PSD em 2002-2005 - e que não afectou apenas Santana. Pior: o PS não vai deixar o passado descansar, tal como Durão Barroso não deixou em 2002-2004. Para Barroso, o "pântano" de Guterres foi o maior trunfo em todos os debates - exactamente como agora a "trapalhada" é para Sócrates. Meneses e Santana sabem que a possibilidade de êxito em 2009 depende da sua capacidade para "desmontarem" também a história de 2002-2005. Preparem-se, portanto, para ouvir falar do passado nos dois anos que aí vêm. Com esta classe política, que outra coisa esperar?
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