segunda-feira, novembro 26, 2007

O Regresso do Malabarismo





O simples facto de Mário Soares ter sido figura proeminente do regime explica quase tudo sobre o sistema político português e o estado a que chegou.

Trata-se de alguém que maneja muito bem a cartilha dos direitos humanos, quando isso lhe dá jeito, mas a quem não me lembro de ter ouvido alguma vez uma ideia que fosse simultâneamente interessante e original.

A falta de rigor, a inconsistência, a volubilidade, a malbaratada capacidade para cavalgar os ares do tempo fizeram dele um monumento que os portugueses só em 2006 foram capazes de apear.

Só ele poderia dissertar sobre o "comunismo duro e puro" da China, tão puro que segundo ele se mistura com o já famoso "capitalismo selvagem", na mesma entrevista ao DN em que relata como agenciou negócios do petróleo, a partir de relações políticas, em favor de uma empresa que paga uma avença à sua Fundação.

Só ele "gostaria que o PS agora se voltasse um bocadinho mais para a esquerda" frase que é, só por si, um verdadeiro tratado de oportunismo e de falta de rigor. Se fosse proferida por Santana Lopes daria chacota durante um mês. Assim se compreende porque não o incomodam as relações "de simpatia e de amizade" com Chavez.

Como se isto não bastasse temos agora a "reacção" do PS, pela voz do inacreditável Vitalino Canas: "À medida que os problemas forem sendo ultrapassados, é claro que a dimensão à esquerda poderá ser mais visível, isso virá com o tempo".

Duma penada, aprofundando a tese de Soares, confirma que a resolução dos problemas do país só pode ser obtida com "políticas de direita" e que depois, quando já houver recursos, cabe às "políticas de esquerda" desbaratá-los.

Que é esta a teoria vigente, em surdina, já todos sabíamos. Infelizmente não é só no PS e na direita tradicional.
Agora dizê-lo com esta candura, com esta inconsciência... é obra.

É o regresso do Grande Malabarista. A verdade é que chegou a época dos circos de Natal...

3 comentários:

Joana Lopes disse...

Comento ou não – dúvida que me ataca há mais de uma hora. Mas aí ai sem grande preparação.

«Soarista» nunca fui e a proximidade do 25 de Nov. que «se festejou» ontem lembra-mo bem. Mas acho, sem qualquer espécie de dúvida, que ele foi E É o único grande estadista da nossa democracia.
Penso também que tem hoje uma distância lúcida e reflectida que o faz «acertar» / intuir muitas coisas que, de modo algum, se podem reduzir a resultados de malabarismo.
Por isso, no teu texto, desagrada-me sobretudo o tom, o que pode parecer secundário mas neste caso não é.

Mas tudo bem: há mais vida para além de Soares..

F. Penim Redondo disse...

Como deves ter reparado eu não neguei o brilhantismo da carreira de Soares.
O que eu digo é que ele para o bem, e talvez mais para o mal, marcou demasiado o sistema (se calhar porque as características dele são aquelas que mais apetecem ao sistema).
Detesto a forma errática com que escolhe amigos e inimigos, relativizando o que antes era absoluto, à medida dos seus humores e interesses.
Não lhe reconheço esse direito e muito menos que se assuma, e o assumam, como referência.

Anónimo disse...

Não percebo a posição da Joana.

Acha que por MS ser um "grande estadista" não pode ser criticado ?

O autor do post não gosta de MS, isso é óbvio. Mas qual é o problema do tom ?

Se eu tivesse escrito o texto provavelmente iria perguntar porque é que MS lutou tanto contra Vasco Gonçalves, que por fazer espalhafato nos discursos até foi chamado de louco, e agora acha tanta piada ao espalhafato de Chavez.

Um mistério.