quarta-feira, agosto 19, 2009

No Dia Mundial da Fotografia



Hoje é o “Dia Mundial da Fotografia” e, também por isso, retomo o texto “Uma imagem ou mil palavras?” com que, semanas atrás, confrontei as imagens e os textos.

Como disse então, esquecemos demasiadas vezes que as imagens nos acompanham desde que nascemos e que ninguém nos ensina a ver. Nessa fase não conseguimos comunicar seja com quem for e a nossa principal forma de aprender é vendo.
Orientamo-nos no mundo pelas imagens e pelos sons “naturais”. Como não há textos “naturais” só mais tarde, lentamente, começamos a coleccionar e agrupar palavras.

Pode dizer-se que uma coisa é ver o mundo e outra, bem diferente, é apreciar imagens que outros homens fizeram expressamente para que as víssemos, como é o caso da fotografia. Tentemos então compreender o que há de diferente no olhar de quem observa a fotografia começando por analisar o olhar de quem faz a fotografia.

O visor da câmara é um orifício por onde se espreita o mundo que todos partilhamos mas serve também para, desse mundo, escolher um pedaço (seleccionar uma parte do todo é uma das operações mais basilares na formação do conhecimento).

O que nos move na fotografia é essencialmente a curiosidade. Porque é que o fotógrafo escolheu isto? o que é que ele viu de interessante nisto? o que é que havia para além disto?

Nós até podemos saber para que parte do nosso mundo comum o fotógrafo “olhou” mas não sabemos o que ele realmente viu. A fotografia é uma espécie de certidão em que o fotógrafo diz: “quando olhei para ali o que eu vi foi isto”. E nós comparamos o que ele viu com o que nós próprios vimos ou imaginámos.
O jogo pode terminar aqui ou, se quisermos, complicar-se com a pergunta: e quem nos garante que o fotógrafo vê na fotografia que produziu o mesmo que os seus observadores?

As imagens “naturais” estão em pemanente transformação mas as imagens produzidas pelo homem são imutáveis (excepto no que toca à degradação do suporte material de que estão feitas). Por isso a observação das fotografias é sempre o regresso ao que já passou, uma repetição que nos pode dar prazer mas que não passa de uma repetição.

A explosão da publicidade no espaço público tornou penosa essa repetição, porque involuntária, e transformou de forma irremediável a relação das pessoas com a fotografia. Hoje o nosso olhar está marcado pela estética, pela opulência e pelas dimensões dos painéis publicitários, quase sempre de autor desconhecido.
O pior de tudo é que eles insinuam a coincidência entre imagem e mercadoria tornando a fotografia algo que, desconfiamos, está sempre a tentar vender-nos alguma coisa.

Num outro plano o fotojornalismo, omnipresente na comunicação social, conduziu o gosto do público para a necessidade de encontrar no objecto fotográfico o excepcional, o sensacional ou a catástrofe.

A publicidade e o fotojornalismo balizam portanto a fotografia e delimitam, por exclusão de partes, o que resta para os “artistas”. A fotografia como arte refugia-se em espaços codificados e procura as técnicas e as estéticas que não foram invadidas e que ainda permitem alguma diferenciação.

Como se este confinamento não bastasse sobreveio a enxurrada digital e os seus biliões de fotografias de férias ou de viagem. Mas isso não significa apenas que nas férias as pessoas têm mais disponibilidade para fotografar.

O grande Steve McCurry disse qualquer coisa como: “Quando alguém me pergunta como se pode tornar fotógrafo eu quase nunca menciono câmaras, lentes, ou técnicas. Digo: se quer tornar-se fotógrafo saia de casa, vá tão longe quanto puder. Torne-se um estrangeiro em terra estranha.”

Há realmente um nível, artístico, na nossa relação com as imagens que está por baixo da nossa inserção social, que tem muito de instintivo e intuitivo, e que se exprime melhor quando estamos em locais onde não sabemos identificar os códigos culturais que nos rodeiam.

Apesar dos esforços dos especialistas para nos explicar e contextualizar as grandes fotografias todos nós sabemos que a verdadeira razão das nossas preferências não tem explicação textual. Tal como não precisamos de saber contraponto, ou o significado histórico do barroco, para amar a música de Bach.
Façamos pois da fotografia uma enorme e exótica viagem.
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1 comentário:

Fernando Torres disse...

No Dia Mundial da Fotografia não resisti a fazer o link.
Um abraço do ESCREVINHADOR