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"Estou cansado do Apocalipse" é a frase inicial do livro "Les prêcheurs de l’apocalypse" que tem como subtítulo "pour en finir avec les délires écologiques et sanitaires".
O autor, Jean de Kervasdoué, é de um ecletismo desconcertante, saltita com facilidade da economia para a saúde e desta para a ecologia. Tem-se dedicado principalmente à sociologia da medicina e, de 1981 a 1986, foi responsável por todos os hospitais de França. Diz-se que já publicou duas centenas de artigos científicos, investiga e ensina no CNAM.
A sua entrevista recente ao Notícias Sábado interessou-me apesar dos óbvios erros de tradução. Sem medo de ir contra a corrente diz coisas como:
"Os ecologistas fizeram-nos olhar para o nuclear em vez do carvão: provavelmente a razão é porque, na origem, eram a URSS e a Alemanha do Leste que o fabricavam."
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"Factualmente, o nuclear faz menos mortos do que o carvão e não produz gases que contribuam para o efeito de estufa. Da mesma forma, os transgénicos foram criados por razões ecológicas, para evitar a utilização dos pesticidas."
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"Quatro ecologistas de Long Island, nos EUA, ganharam um processo porque afirmavam que (o DDT) fragilizava a casca dos ovos dos falcões selvagens locais. Isso interditou a uso de DDT. No entanto, no Bangladesh, antes do DDT havia um milhão de pessoas que morriam da malária; durante o DDT, menos de mil; e sem DDT a epidemia voltou a matar um milhão. É um conflito entre os animais do Norte e os homens do Sul."
Estas tomadas de posição desassombradas, cuja validação não está ao meu alcance (ver texto interessante), vieram encontrar-me num momento de acentuado enjoo, diria mesmo nojo, quando sou bombardeado com manifestações do politicamente correcto.
O tabaco, o aquecimento global, os transgénicos, os acidentes na estrada e outros tantos assuntos respeitáveis têm vindo a tornar-se fonte de autênticas obsessões quando não de fanatismos.
Os processos do fanatismo, como já tenho dito, seguem sempre o mesmo padrão: empolamento e absolutização de um problema, fé inquestionável num conjunto de soluções e consequente justificação da violência, mesmo que só na forma insinuada, contra todos os que as não pratiquem.
Curiosamente quatro dias depois, a 7 de Novembro, o Público inseria um artigo de Rui Ramos intitulado "Depois do Fim", dedicado a dois romances "apocalípticos" americanos, onde faz esta acutilante análise:
"Entrámos no século XXI predispostos para o apocalipse. No primeiro dia, houve logo quem esperasse uma devastação provocada pela suposta incapacidade dos computadores para registar a nova data. Depois, foi a vez dos militantes do islamismo radical aparecerem como agentes do fim do mundo. Mal se percebeu que Bin Laden poderia ficar por massacres localizados, logo o clima tomou o seu lugar. Aguardamos agora que secas e inundações nos arrastem à extinção. E para o caso da meteorologia desiludir, já temos em carteira a gripe das aves. Passámos a viver num mundo que está para acabar. Nas discussões políticas, não há hoje proposta, por mais ínfimo que seja o seu alcance, que não nos seja vendida como o único meio de evitar o colapso iminente da nossa prosperidade ou segurança. O abismo espreita-nos por todo o lado. "
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O catastrofismo em voga quer assustar com fins educativos. Parte do pressuposto de que o futuro está nas nossas mãos, como em tempos esteve nas de Deus. Basta substituir as emissões de carbono pelas emissões de boa vontade, e as guerras pelas operações humanitárias. Gerações antigas souberam que havia, no mundo e nos seres humanos, forças e tendências para além do controle de qualquer ciência ou bom senso. Hoje, tudo o que corre mal é por nossa culpa: a doença deve-se ao estilo de vida, o acidente à imprevidência, e a catástrofe, quando vier, terá a ver com os nossos abusos. O que quer dizer que tudo pode ser evitado e corrigido, se nos arrependermos a tempo. É o evangelho dos caixeiros-viajantes da desgraça. Nos alicerces de tudo isto, está um cristianismo sem Deus, ou melhor, em que a humanidade tomou o lugar de Deus, embora ainda imperfeitamente: já é omnipotente, mas ainda não dispõe da sabedoria divina que terá de extrair do livro de Al Gore ("obrigatório", como diz o anúncio do PÚBLICO).
Permito-me acrescentar que se, como ele diz, agora "o futuro está nas nossas mãos" não é certamente no sentido de o construirmos mas sim no sentido de sofrermos por ele. Os pregadores do Apocalipse não esperam de nós qualquer golpe de inteligência mas sim que paguemos pelos nossos "pecados".
Numa mistura inusitada do atávico pecado original com a orfandade das utopias políticas cada vez maior número de fanáticos procura o sofrimento e fazer-nos sofrer com eles. Não visam a solução de qualquer problema mas sim a expiação.
Até os "temas fracturantes", a que tanto se dedicam, não são apenas um sinal da incapacidade para desenhar futuros alternativos. Valem acima de tudo por chocarem e escandalizarem os "burgueses" que se atrevem a continuar vivendo no mundo da injustiça global.
O passo seguinte é a fogueira para os hereges. O MAI está a estudar uns dísticos, a três cores, para exibir em público os automobilistas prevaricadores com base nas estatísticas da sinistralidade rodoviária. O próximo passo poderá ser uma chupeta na lapela para os fumadores e depois, talvez, um chapéu especial para os maiores de 50 que não tenham feito um toque rectal nos ultimos 5 anos (justificados pelo facto de, quer o cancro do pulmão quer o cancro da próstata, matarem muito mais do que os acidentes de viação).
A revista VISÃO dedicou um dos seus últimos números à ecologia, ufanamente verde e um pouco ridículo. O que mais me chocou foi a pergunta, feita a torto e a direito: Qual é a sua "pegada ecológica" ?
Perante o espanto dos visados, pessoas com responsabilidades públicas, passava-se ao interrogatório sobre os seus hábitos para avaliação do comportamento; se separavam o lixo, se usavam transportes públicos, se tinham lâmpadas de baixo consumo, e por aí fora.
Já não estamos no domínio da sugestão, do aconselhamento ou mesmo da educação mas sim da ameaça velada de exposição à execração colectiva. Este e outros tipos de chantagem têm permitido a muitas idiotices bem-pensantes penetrar nos centros de decisão políticos. Pode até admitir-se que certos interesses económicos joguem também neste tabuleiro.
Tal como nos tratos de polé do Santo Ofício, quando esmiuçava os costumes e as intimidades dos suspeitos, parece até ouvir-se já o grito "só preciso que me digam o que devo confessar".
Voltando ao artigo de Rui Ramos:
...Cormac McCarthy caracterizou com uma frase toda esta literatura e a actual cultura secular do Ocidente: "There is no God and we are his prophets" (p. 143). Deus não existe e nós somos os seus profetas.
Em defesa dos chulos
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*No Tribunal Constitu*
*cional*parece haver seis juízes
cavernícolas
*«O Tribunal Constitucional recusou legalizar o proxenetismo, mas os juízes
do Paláci...
Há 25 minutos
4 comentários:
Por bondade
09.11.2007, Vasco Pulido Valente
Quando a imprensa inglesa e americana anuncia que a proibição de fumar em restaurantes não teve efeitos visíveis na saúde pública, em Portugal essa mesma proibição entrará em vigor a 1 de Janeiro de 2008. O que me espanta nisto não é a extravagância do acto em si. Duas coisas me parecem muito piores. Em primeiro lugar, a facilidade com que em todo o Ocidente o Estado resolveu intervir na vida privada de cada um e negar radicalmente o direito de propriedade (impedindo, por exemplo, que se criem restaurantes de fumadores), sem um protesto sério em parte alguma. Em segundo lugar, a rapidez com que o fumador foi socialmente estigmatizado e o vício de fumar (há 20 anos, normal e aceitável) se tornou quase o que era antigamente uma blasfémia, uma profanação ou uma heresia.
Isto não anuncia nada de bom. Por um lado, porque fatalmente à campanha contra quem fuma se vai seguir a campanha contra quem bebe e a campanha contra quem come o que não deve ou come demais. E talvez, mais tarde, a campanha contra o "sedentarismo" e a falta de exercício. Não custa nada argumentar com as doenças que o álcool e a gordura provocam (tantas como o tabaco), ou retirar do mercado "produtos de risco", ou vigiar o que os restaurantes servem. Por outro lado, já se viu que o poder do Estado para converter a populaça ao objectivo tenebroso de "melhorar o homem" é hoje ilimitado. A metamorfose das democracias do Ocidente em totalitarismos de uma nova espécie não incomoda ninguém. Não uso a palavra descuidadamente (não uso, de resto, nenhuma palavra descuidadamente): para Hitler (que não fumava, nem bebia), o alemão perfeito não andava muito longe do perfeito espécime do Ocidente contemporâneo.
Imagino muitas vezes quem, de facto, quererá este mundo sufocante e asséptico, obcecado com a "saúde"? Gente, como é óbvio, com pouca imaginação. Por mais forte que seja o culto e a idolatria do corpo, a velhice chega. E, com ela, a irrelevância, a obsolescência, a solidão. Esta sociedade de velhos trata muito mal os velhos. A ideia (e a propaganda) de uma adaptação contínua é uma grande e cruel mentira. Os velhos são um embaraço. Um peso que se atura, que se arruma num canto, que se mete num "lar". Setenta anos de esforço para durar acabam num limbo à margem da verdadeira vida, quando não acabam no sofrimento e na miséria. O Ocidente está a criar um inferno. Por bondade, claro.
Vasco Pulido Valente
in Público, 09.11.2007
Li, no PÚBLICO que o Ministério da Administração Interna (MAI) estuda a possibilidade de diferenciar entre bons, médios e maus condutores, através da colocação nos seus veículos de dísticos respectivamente verdes, amarelos e vermelhos.
Não sei porquê, mas este procedimento fez-me recordar que já houve uma época em que se distinguiam as pessoas conforme as suas crenças religiosas, mediante a colocação no seu vestuário de estrelas, ora invisíveis ora amarelas.
Já agora fico a aguardar que o Governo venha, na mesma linha de pensamento, a estudar também a possibilidade de se colar nas testas dos cidadãos portugueses outros dísticos, como por exemplo um quadrado vermelho para os que já tenham cumprido pena de prisão, um amarelo para os que estejam considerados arguidos e um verde para todos os que por sorte, incapacidade mental ou em casos mais raros por civismo, nunca se tenham visto a braços com a justiça portuguesa.
Triângulos, igualmente coloridos, poderiam também ser úteis para avisar os outros cidadãos de que a pessoa que com ele se vai cruzar é saudável (verde) ou portadora de doença grave, mas não contagiosa (amarelo) ou se sofre de uma qualquer maleita contagiosa (vermelho).
Este tipo de exposição pública (...) da culpabilidade passada dos cidadãos, por crimes que já foram ou já deviam ter sido redimidos, pelas multas, pelas inibições de conduzir e por outras sanções disciplinares parece-me indigno de uma sociedade civilizada.
José Artur da Costa Cabral
Este tipo de problemas foi, há algum tempo, levantado por um ambientalista dinamarquês que, pelos vistos, o deixou de ser: Bjorn Lomborg, que escreveu um livro intitulado “O Ambientalista Céptico”. Penso que há uma tradução brasileira.
Quanto ao DDT aquilo que sei é de que o seu descobridor ganhou um prémio Nobel, o que muitos ignoram, e que a sua importância em casos de grande risco de infecções é extremamente importante. Diz-se que foi a sua utilização maciça depois da II Guerra Mundial que permitiu evitar a proliferação de doenças contagiosas em larga escala no Continente Europeu, então em situação sanitária calamitosa. Foi também devido ao DDT que se conseguiu eliminar o mosquito da malária nos pântanos existentes na zona do arroz, no estuário do Sado. Apesar de a sua persistência na cadeia alimentar ser enorme e provocar, a longo prazo, alterações genéticas importantes. Ou seja, não se pode fazer a sua apologia absoluta nem a sua total condenação. Neste caso, como em quase tudo no ambiente, tem que haver um balanço entre as vantagens e os prejuízos, apoiando-nos sempre na investigação científica.
Quanto aos OGM a afirmação do articulista é um rotundo disparate. A origem dos transgénicos não teve criação qualquer preocupação ecológica, com vista à poupança de pesticidas, mas sim a venda de um produto que, sendo útil aos agricultores, poderia trazer lucro às empresas que já vendiam as sementes e os próprios pesticidas. Ou seja, estas habituadas que estavam a vender as sementes e os pesticidas indispensáveis ao êxito das culturas, acharam que poderiam desenvolver uma outra linha que permitisse aos agricultores ter maior produtividade.
A referência aos transgénicos como resultantes de preocupações ecológicas entendo-a assim: fossem quais fossem as intenções dos fornecedores é um facto que os transgénicos dispensam os pesticidas o que é ecológicamente positivo.
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