sexta-feira, dezembro 16, 2011

O Portugal comunista

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Por muito que me esforce tenho dificuldade em imaginar um caminho que nos tire da decadência anunciada, no quadro político actual em que os partidos, os grupos de interesses, e em geral todo o bicho careto, se obstinam em perseguir os seus próprios desígnios egoístas.
Mesmo arrepiando as consciências mais sensíveis só uma solução me ocorre; um Portugal comunista, à chinesa, com todos a remar como um só homem na mesma direcção. Só um partido comunista estaria em condições de levar tal tarefa a cabo.
A China é uma demonstração viva de que os slogans que opõem a austeridade ao crescimento estão errados; austeridade, a um nível que nós nem sequer imaginamos, redundou ali num crescimento prolongado de 10% ao ano.
Significa isto que a ascensão ao poder de esquerdas mais radicais, se tal viesse a tornar-se realidade, se assumida consequentemente, levaria a sacrifícios muito mais intensos do que aqueles hoje rejeitados por muitos dos que militam em tais movimentos (claro que nessas circunstâncias, para sossegar as consciências, nos diriam que os sacrifícios pedidos já não se encontravam manchados pela sombra das injustiças de classe).
Eu, por mim, acho que pode chegar o dia em que, por desespero, não enjeitaremos essa forma de patriotismo.
Nessa altura, muitos dos radicais anticapitalistas de hoje saltarão pela borda fora.

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11 comentários:

vítor dias disse...

Caro Fernando:

Desprezando tudo o mais que um tal post justificaria, apenas duas notas inocentes:

- uma para lamentar que o «à chinesa» não tivesse cabido no título;

- outra para lembrar que, no léxico político ocidental, «austeridade» não é a mesma coisa que «pobreza» ou mesmo ausência de importantes direitos; no contexto ocidental tem-se entendido por austeridade políticas que retrocedem em matéria de nível de vida ou de direitos sociais; e, nesse ponto, sem prejuizo de tudo o resto, parece que nas últimas décadas a China tirou cerca de 400 milhões dos seus cidadãos da pobreza.

F. Penim Redondo disse...

Caro Vitor,

não ignoro o carácter "provocatório" deste post que, espero, fará abanar um elevado número de conceitos e de preconceitos.

Realmente "austeridade" não é a mesma coisa que "pobreza". A "pobreza" que os chineses experimentaram é uma forma brutal de "austeridade", tão brutal que se pode considerar qualitativamente diferente. Por isso eu escrevi "que nós nem sequer imaginamos".

Chamo muitas vezes a atenção para esse feito de resgatar centenas de milhões de pessoas da miséria extrema.
Só um partido comunista clarividente percebeu que era preciso vender mão-de-obra barata para conseguir industrializar o país e fazer crescer o mercado interno. Quem mais teria tido capacidade para forçar tal brutal sacrifício de 2/3 gerações? Agora que é a fábrica e o banqueiro pode ditar as regras do jogo.

A grande inovação da China foi a conjugação das vantagens da economia planificada com as da economia de mercado. O Estado, ou melhor o partido, mantém o poder de decisão em tudo aquilo que é essencial e estratégico.
No nível abaixo desse deixam que as forças do mercado actuem "livremente". Na verdade todos sabem que, se se portarem de forma considerada inconveniente para o engrandecimento do Estado chinês correm graves riscos. Um exército de militantes e um exército de soldados, com muitos milhões de membros lá estão para lho lembrar.

F. Penim Redondo disse...

Eu queria dizer: "Agora que é a fábrica e o banqueiro do mundo pode ditar as regras do jogo"

Anónimo disse...

Oh, Fernando.

Eh, pah! Qualquer ainda te oico a cantar: Entreguei-me todo a Cristo nunca mais me senti só...

Desculpa lá o humor, mas às vezes é preciso.

Saudações,

João Pedro

F. Penim Redondo disse...

A Cristo?
Agora é que eu não percebi nada

vítor dias disse...

Caro Fernando:

Desculpe a franqueza mas creio que chutou para canto em relação às questões que eu levantei.


Se quer ligar austeridade na China e o seu contraponto com o seu crescimento económico, então dê um passo em frente e declare que hoje a população daquele país vive pior que há uns anos.

Entretanto, fico a aguardar um seu post sobre a austeridade na Índia, país que suponho também tem crescido bastante.

E falando de China e Índia talvez lhe aproveite ver algumas comparações entre os dois países que encontrei proveitosamente resumidas aqui em
http://sempunhosderenda.blogspot.com/2010/11/atencao-das-cancios-dos-serras-pereiras.html

F. Penim Redondo disse...

Caro Vitor

Pensava que era clara, desde o princípio, a minha tese de que aos chineses foi preciso fazer muitos sacrifícios para chegarem ao ponto em que estão. Ou seja, sacrificaram-se muito mas hoje estão não só melhor mas com razões para acreditar no futuro.

Há vários anos que venho chamando a atenção para o admirável desenvolvimento da China, que visitei em 2006 e 2009, e por isso receio não estar a compreender o fundo da nossa discussão.

J Eduardo Brissos disse...

João Pedro,
Estavas a provocar o Penim, mas isso às vezes acontece na vida real.
Uma nossa vizinha ex-PC fez mesmo esse percurso.
Entregou-se a uma seita cristã, espalha a palavra do Senhor, e de vez em quando vejo-a por aí a passear o cão, vestida a rigor com uma túnica branca até aos pés.

J Eduardo Brissos disse...

Penim,

Então o capitalismo, ou mercado, ou como lhe queiras chamar, não é aquele sistema em que, segundo os seus defensores, cada um prossegue os seus interesses individuais e daí resulta o bem comum?
Portanto, a tua critica à "obstinação" é uma critica ao sistema, ou uma defesa dum capitalismo mais altruísta?

Quanto à austeridade poderás ter a tua própria definição, mas austeridade não é pobreza extrema. Um gajo rico pode ser austero.

Quanto à austeridade a que nos estão a sujeitar, são orientações que visam alterar a distribuição do rendimento, desvalorizando o trabalho e reduzindo as prestações sociais, em favor das rendas e dos lucros.

F. Penim Redondo disse...

Brissos,

Se estivesses mais atento ao que eu tenho dito ao longo dos últimos anos saberias que se há coisa que abomino são as teorias do "capitalismo de rosto humano".
Mas também abomino as teses passadistas que pensam destruir o capitalismo com retórica em vez de proporem algo realmente novo, e pálpavel, como fazem os chineses.

J Eduardo Brissos disse...

Novo? Então não tinha já sido tentado com a NEP? Embora no caso da China a aliança ser em primeiro lugar com os capitalistas de fora, em vez dos caseiros.