quinta-feira, fevereiro 11, 2010

O regresso do lápis azul





Este é um dia triste em que se assiste ao regresso do lápis azul da censura prévia a Portugal, crismado de providência cautelar.
O poder, cobardemente e por interposta pessoa, reduz a informação a uma face oculta com base em pretextos formais.
Voltaremos agora, como há 40 anos, a circular a informação em folhas fotocopiadas ? ou de forma actualizada sob o anonimato da blogosfera ?
Este é um dia de luto para os ideais de Abril.
.

26 comentários:

mariahenriques disse...

o sol ficou impedido de publicar mais escutas e ao que parece há para aí alguns que ficaram ofendidos com isso.

http://apombalivre.blogspot.com/2010/02/o-sol-ficou-impedido-de-publicar-masi.html

Fernando Torres disse...

Concordo.
Sem quase nos apercebermos, sob outras formas, e com a chancela dos moços de fretes da justiça, voltámos ao 24 de Abril.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Fernando,
Ao que julgo saber tu foste vítima de vigilâncias e, talvez, de escutas da PIDE antes do 25 de Abril.
Podes nunca ter dito nada em privado que considerasses embaraçoso que se soubesse em público.
Podes ter sido um santo.
Mas também podes ter sido meramente humano, e dito coisas que não gostarias que fossem do domínio público.
Provavelmente, na altura não gostarias que fosse divulgada nem uma palavra do que disseste, fossem elas embaraçosas ou não.
Especulo eu, porque estou certo que nessa situação seria esta a minha posição.
Se eu fosse um "boy" do PS pago a peso de ouro, ou um tipógrafo do Diário de Lisboa funcionário do PCP, ou meramente o Manuel Vilarinho Pires, não quereria que as escutas fossem divulgadas, e faria o que estivesse ao meu alcance para o evitar.
Na altura haveria pouco que fazer.
Agora há o recurso aos tribunais...
Fernando, habituei-me desde sempre, por saber que pessoas como tu eram perseguidas antes do 25 de Abril, a considerar que as escutas e o lápis azul estavam do mesmo lado da barricada.
Será que andei enganado estes anos todos?

Saudoso disse...

Eu não sabia que o direito à providência cautelar era incompatível com os ideais de Abril, mas estou sempre pronto a aprender. Como me esqueci de encomendar fato preto, estou histérico por falhar este dia de luto, mas prometo alinhar no próximo. Viva o JPPEC! Viva!

PS: Julgamento na Praça Pública Em Curso.

F. Penim Redondo disse...

Caro M. V. Pires,

O teu raciocínio, que tenho a certeza tem as melhores intenções, padece de algumas falhas em meu entender:

1. Eu sou absolutamente contra a divulgação pública de conversas pessoais e de índole íntima.
Tal não é o caso das conversas em que detentores de cargos públicos, ou seus mandatários, planeiam actos ilegítimos pagos, directa ou indirectamente, com dinheiros públicos.
Uma conversa em privado não é necessáriamente uma conversa pessoal, como se pode ver pelos exemplos em apreço.

2. A invocação da PIDE toca-me pessoalmente como tu sabes.
Mas também aí estás um pouco equivocado.
As polícias repressivas, e as suas escutas, são usadas pelos poderosos contra os fracos e os oprimidos e não o contrário.

3. Os visados pelas escutas têm todos os meios que é possível imaginar para se defender, mediáticamente e económicamente.
Se tanto prezam a justiça porque não perseguem judicialmente as falsidades que sejam publicadas ?

4. Impedir a publicação não se sabe o quê, em abstracto, parece-me um caminho muito perigoso. Como muita gente mais ilustre que eu já disse hoje, isso é abrir a porta à censura prévia.

Lamento não poder concordar contigo mas despeço-me com amizade

Vitor M. Trigo disse...

Oh, Oh.
Estão aqui alguns "desalinhados" que ainda não entenderam que as providências cautelares não se podem aplicar aos jornalistas.
Para os outros cidadãos são um importante instrumento jurídico de protecção de direitos individuais. Mas, quando visam um jornal, são censura.
Tudo em nome da democracia, claro.

F. Penim Redondo disse...

Vitor,

Travar a saída de um jornal é uma coisa gravíssima que só pode ser aceite quando as consequências de não o fazer sejam de enorme gravidade.

Eu até acho que a publicação das escutas, no ponto a que as coisas chegaram, beneficia os visados (não é por acaso que alguns já se mostraram dispostos a autorizá-las).
Se não forem publicadas as pessoas imaginarão coisas ainda piores do que as escutadas.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Vou dar uma resposta LIFO:
4.Impedir a publicação de uma informação em abstracto pode ser perigoso, mas em concreto pode não o ser necessariamente. O direito à informação é um importante direito civil, mas não é o mais importante (como curiosamente há bocado disse o PSTJ a uma entrevistadora).
Se fosse, seria legítimo um jornal pagar a alguém para raptar o Sócrates, para o torturar e para publicar a informação, aí fidedigna, sobre as aldrabices que ele fez (e acredito que sejam muitas, que nisso seja mesmo o campeão dos PM da democracia portuguesa).
O direito à vida é o mais importante, e há pessoas como eu que pensam que o direito à privacidade é mais importante do que o direito à informação, por razões que não cabem aqui.
3.Defender-se de escutas não é explicar os factos revelados por elas, ou demonstrar a sua falsidade (até porque normalmente são verdadeiros), é impedir terceiros de conhecerem o seu conteúdo, permitindo ao escutado a salvaguarda do seu direito à privacidade.
Os tribunais são, em democracia, uma das possibilidades a que pode recorrer quem é vítima dessa violação.
2.As polícias repressivas, e as suas escutas não são só usadas pelos poderosos contra os fracos e oprimidos.
São muitas vezes usadas pelos poderosos contra outros poderosos.
A engenharia jurídica com que o Sol hoje se esquivou a ser notificado, mandando justamente um fraco e oprimido receber a notificação, demonstra que não é um oprimido, mas um poderoso, que tem advogados que lhe permitem brincar com os tribunais.
É um caso de poderoso contra poderoso.
1.Todos os governos da democracia portuguesa (e todos os da ditadura) tentaram manipular a comunicação social.
Desde as nacionalizações logo a seguir ao 25 de Abril, até a estas trapalhadas do governo actual, todos o fizeram, com maior ou menor eficácia, descrição, habilidade.
É útil sabê-lo? Claro que é.
Mas não é preciso fazer escutas e vigilâncias para o sabermos.
E as escutas só podem e só devem ser usadas em condições muito estritas na investigação criminal, e com um grande rigor no seu tratamento.
Para vigilância política, não devem servir.
Porque se aceitarmos que sejam, hoje pode-nos parecer boa ideia, porque é para desmascarar (ia escrever tramar...) um político de quem não gostamos, mas o precedente será invocado amanhã para tramar outros... e um dia ainda nos calha a nós.
Um abraço, que estaria logo no início do texto se fosse uma tradicional resposta FIFO!

Vitor M. Trigo disse...

Manuel,
há pouco quando vinha para casa apanhei na rádio alguém (perdi o nome que só foi mencionado no início, mas que foi apresentado com altamente para o parecer que lhe solicitaram), que, sobre a entrega do documento do tribunal ao segurança de serviço no Público, disse mais ou menos o seguinte:

- Na sede duma empresa, em horário laboral, tem de estar presente alguém com responsabilidade para receber este tipo de documentação;

- A organização interna de qualquer empresa é, sob o ponto de vista legal, da sua inteira responsabilidade. Uma empresa de comunicação social não é excepção;

- Quando uma empresa delega esta responsabilidade (numa empresa de segurança, como é o caso presente), não pode invocar não ter recebido a documentação. Está notificada. Se desobedecer assume a responsabilidade inerente.

Mais não sei. Mas penso que possas não ter ouvido este importante esclarecimento.

Um abraço.

Luís Maia disse...

Concordo em absoluto contigo meu caro Penim, embora como já aqui disse várias vezes acho que a fuga de informações é um crime gravíssimo.

impedir a saída do sol é como se depois de alguém me vir agredir a casa, me impedissem de sair a rua para não exibir as nódoas negras

F. Penim Redondo disse...

Vitor,

Acho importante, para perceber que a providência cautelar não pode trazer nada de bom, ver a posição tomada por Joaquim Vieira (o tal que defendeu a publicação do mail clandestino pelo DN).

Publicado no Jornal de Negócios:


Joaquim Vieira, ex-provedor do Público e presidente do Observatório de Imprensa, considera que as escutas do semanário “Sol” devem ser publicadas e que os jornalistas não devem ceder às intimações judiciais. Em causa estão princípios como o direito à informação e o interesse público, defende.

“Na altura em que fui Provedor do Público, escrevi uma crónica na qual referia que chegaria um momento de desobediência civil por parte dos jornalistas. Chegou esse momento. As escutas devem ser publicadas, os jornalistas devem esforçar-se por publicá-las e não se deixarem intimidar”, manifesta Joaquim Vieira.

“O que está em causa é matéria de interesse público e o interesse público sobrepõe-se aos direitos privados dos cidadãos”, sublinha o presidente do Observatório de Imprensa.

“Há suspeitas graves que envolvem pessoas do aparelho de Estado. Não havendo ninguém interessado em desvendar o assunto, cabe aos jornalistas fazê-lo no âmbito do direito à informação, princípio consagrado na Constituição”, continua.

“Que processem os jornalistas. Em última instância, o assunto vai até ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e, aí, certamente que serão absolvidos”, conclui.

Vitor M. Trigo disse...

Com o devido e óbvio respeito pelas opiniões aqui expressas, não vejo a analogia introduzida por Luís Maia.

Em abstrato, impedir a saída dum jornal é uma péssima notícia. Mas não me parece ser o caso do Sol - creio que o Sol pode sair, mas com a condição de não voltar a divulgar informações que ainda estão em segredo de justiça.

Perceberia a analogia se o Sol tivesse sido "agredido" e agora estivesse a ser impedido de "mostrar as nódoas negras".

Mas o que parece, admitindo estar insuficientemente informado, é que o Sol quer mostrar as ainda não provadas nódoas negras de outrem, que, ao que parece pode, ao abrigo da lei, evitar que tal aconteça.

O Estado de Direito é para todos. Não pode excepcionar uma empresa de comunicação social.

Vitor M. Trigo disse...

Para que se entenda o meu último comentário - foi escrito ANTES de ter lido o último comentário do Fernando.

Luís Maia disse...

imagem pode não ser feliz mas a nódoa negra simboliza um crime que alguém quer evitar a sua exibição.

Direi mais são vários crimes, para mim o principal insisto é a própria fuga de informação.

Anónimo disse...

Meu caro Fernando As fronteiras são sempre a pedra de toque, oscilam e variam consoante os interesses e as conveniências dos interlocutres, vide o vergonhoso comportamento do Sol, que a coberto da pseudo liberdade de imprensa esta tal como a MMGuedes e respectivo con(sem)sorte, O MCrespo e outros a fazer uma objectiva campanha partidária, basta saber de onde veem e para onde querem ir. Vai daí, não se respeitam providências cautelares que eles estão acima dessas coisas. Realmente tudo anda podre por estas bandas e o Sr A Saraiva devia ter vergonha, mas não tem, se calhar são coisas de familia que se pegam ou que se herdam FC

Anónimo disse...

Moral da história, o jornal deverá sempre sair nem que seja para desrespeitar uma ordem do tribunal, pois como diz o Vitor eles legalmente já estavam notificados. Portanto cometam-se as ilegalidades à vontade, pois isso não será relevante para servires os promotores da teoria da conspiração.
Por favor tirem de lá o Socrates asap porque eu estou ansioso por ver lá o Rangel, pois vai ser muito melhor! Pelo menos o Portas vai deixar de "queixar-se" de ser o único populista à direita. O que a malta neste país quer é que nada se faça, boicotem-se as reformas, as avaliações tudo. Afinal não somos todos tugas, no pior dos sentidos? Ah! e depois venham daí os aumentos, venha donde vier a massa que já não há. FC

Anónimo disse...

Lápis Azul, é o tema dos Album dos Dr.Salazar.
Corta corta... Risca Risca... A tua ideia não pode passar...
Visitem: www.myspace.com/drsalazar1

Manuel Vilarinho Pires disse...

Aqui para nós, Fernando, queria-te deixar um tema de reflexão e de cautela.
A humanidade pode-se dividir em dois grupos de pessoas: as que têm idade para se lembrarem na primeira pessoa do fascismo e da censura, e os jovens que não têm idade para se lembrarem e vão construindo a imagem dele a partir do que lêem.
Eu entendo que tu estejas a falar para os primeiros quando falas de lápis azul, querendo dizer que isto pode (vir a) ser tão mau como a censura fascista.
Mas também podes estar a ser lido por jovens que podem ler que o fascismo era tão mau (ou tão pouco mau) como isto.
E não era, como sabes.
Podes estar a dizer a jovens que o fascismo e a democracia não são tão diferentes assim.
O tiro pode-te sair pela culatra.

F. Penim Redondo disse...

Tens razão, esse perigo existe.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Eu tenho sempre razão, como te deves bem lembrar, se fizeres um esforço de memória!!!!
;-)

E relativamente a este tema, eu diria que o primeiro ministro, de quem eu gosto tanto como tu, tem tantos, mas tantos, rabos de palha, desde assinatura falsas em projectos, a graus académicos de político, a familiares e amigos demasiado ricos para parecer verdade, que não é preciso esgravatar pretextos que, por um lado, são inócuos e, por outro, até podem servir para branquear o fascismo, para o combater.

F. Penim Redondo disse...

Caro Manuel Pires, não sejas vaidoso, LOL.
Eu disse que tinhas razão quanto à existência do perigo não disse que devíamos temer esse perigo ao ponto de aceitar tudo o que hoje se faça.

Confesso que reajo muito mal ao uso de mecanismos autoritários para calar quem queira falar.
E como se viu também beste caso, essa é a melhor forma de dar notoriedade a quem nos critica.

Não sei se gosto mais ou menos de Sócrates do que tu. Um dos males desta polémica é toda a gente funcionar na base de gostar ou não gostar do homem, mesmo quando enunciam grandes declarações de princípio.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Não devemos aceitar tudo o que o(s) governo(s) faz(em), mas devemos colocar o problema na sua real dimensão, não o ampliando artificialmente para parecer tão grande como os outros, os do antigamente, porque a consequência é estarmos a afirmar que os outros eram tão pequenos como este, o que é uma trágica mentira de consequências imprevisíveis.

Até porque não há nada a ganhar com esta ampliação artificial.
Concordo em absoluto com o teu último parágrafo, a esmagadora maioria dos eleitores olha para os factos políticos na óptica de clubismos, e não de princípios, e acho que isso deve ser motivo de reflexão, mais do que de lamento.
A consequência directa é que uma "campanha" como a actual não faz ninguém mudar de opinião: os adeptos dele acham que há uma conspiração em marcha contra ele, os adversários que ele está a promover uma conspiração.
Tal como a divulgação das escutas do "Apito dourado" não fez perder nenhum adepto ao FCP.

Não gritemos então pelo lobo quando sabemos que o que estamos a ver é um cão, porque quando aparecer o lobo verdadeiro e gritarmos por ele vão pensar que estamos outra vez a ver um cão.
E a crise chama pelo lobo...

F. Penim Redondo disse...

Espero que os meus leitores tenham capacidade para perceber que o lápis azul, como eu próprio dou a entender, é uma forma de expressão para vincar uma ideia. Não creio que façam uma leitura literal.

O que nos interessa agora, de um ponto de vista urilitário, é saber se esta tentativa canhestra de calar o Sol é um sinal de desorientação. A vida tem mostrado que os governantes quando começam a gastar demasiado tempo a dizer mal da imprensa é porque estão em queda imparável para a demissão.


Creio ser esses o caso de Sócrates que ainda só viu a ponta do iceberg.Podemos imaginar o que vai acontecer quando as escutas divulgadas contiverem conversas do próprio PM e não só dos seus amigos.

Nem Sócrates, nem nós, nem as agências de rating, podemos conviver com esta espada de Dâmocles sobre a cabeça do PM.
Acho que ele, para pacificar os mercados e o povo, devia anunciar a sua partida logo após a aprovação do OE e do PEC, fazendo gentilmente companhia à Ferreira Leite.
Só lhe ficava bem.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Alguns leitores terão essa capacidade, mas outros lêem literalmente, podes confirmar isso nas referências ao 24 de Abril dos comentários, que eu considero irresponsáveis pelos motivos que expliquei.

A animosidade com a imprensa não significa necessariamente que a queda esteja próxima.
O Cavaco nunca simpatizou com a imprensa, nem ela com ele, desde o primeiro momento, e teve o seu ciclo completo de ascensão, sucesso e declínio.
Significará talvez é que estes primeiros ministros gerados na TV ligam muito mais à sua imagem do que os que tiveram uma vida própria antes.

Quando ouvires as escutas ao Sócrates, e vais ouvi-las certamemte, porque foi para isso que o Rainho e a Manuela se constituiram assistentes ao processo e não se vê a justiça a impedi-los, vais certamente confirmar o que já sabes sobre os esquemas dele, e vais certamente ouvi-lo dizer caralhadas.
Nada de novo, e nada que mereça uma violação do direito dele nem dos seus amigos à privacidade.

Porque as escutas telefónicas em democracia só devem ser utilizadas pela justiça num contexto extremamente circunscrito, que não inclui saber o que andam a dizer os políticos, sejam eles do governo ou da oposição.
Mais depressa chegamos ao 24 de Abril a escutar políticos do que a tentar impedir a divulgação pública de escutas telefónicas judiciais.

Finalmente, a democracia, e isto é uma das coisas em que se distingue mais das ditaduras, tem uma enorme capacidade de encaixe de dirigentes de baixa qualidade.
Portugal pode perfeitamente viver com um péssimo primeiro ministro e encontrará formas legais e constitucionais de o substituir, mesmo antes de acabar o mandato, sem necessidade de andar a espiar políticos.
Por exemplo, arranjando-lhe um bom cargo internacional ao mesmo tempo que as sondagens lhe disserem que já não tem a simpatia da maioria dos eleitores.
Já foi testado, e com sucesso!

F. Penim Redondo disse...

Há alguns sofismas na tua argumentação.

Sofisma 1.
Claro que nós podemos e devemos viver "sem necessidade de andar a espiar políticos". Mas ao contrário do que essa frase insinua tal não é uma prática corriqueira. No caso em apreço o PM foi ouvido "por tabela" numa investigação ordenada por um juiz e que faz todo o sentido.

Sofisma 2.
O facto de a qualquer pessoa bem formada repugnar o acto de "espreitar pelo buraco da fechadura" não implica de forma alguma a inexistência dos facto observados por tal buraco.
Eu também preferia que a polícia pudesse dispensar o recurso a escutas mas tal não me leva a concluir que os factos escutados não existiram.

Independentemente daquilo que se possa pensar sobre a validade das escutas e da sua divulgação público temos que considerar inadmissíveis os actos que elas revelam.

O simples facto de o PM e seus colaboradores próximos tratarem ao telefone, que qualquer criança sabe ser um meio inseguro, assuntos que consideram reservados é antes do mais um caso de incompetência e irresponsabilidade.
Pode perguntar-se que informações revelou entretanto o PM pelo telemóvel não já a um tribunal, como é o caso em apreço, mas a um qualquer agente secreto estrangeiro.

Ao contrário do que insinua a defesa demagógica de Sócrates nós não vivemos num país onde inúmeros políticos e dignatários em geral tenham sido destituídos e esquartejados em resultado de perseguições mediáticas e judiciais. Vivemos sim num país onde os desmandos e a corrupção campeiam sem qualquer castigo à frente dos olhos de todos. Não há memória de uma única condenação de gente importante.

Não resta ao cidadão comum outro remédio senão colocar estas questões já que a "Justiça VIP", a tal que nunca encontra culpados, usa uns óculos de tal graduação que a realidade, se é que existe, nunca consegue ser nítida.

É a nós que compete decidir se este caso Face Oculta é apenas mais um em que os erros dos notáveis não têm consequências.
A repetição de tais situações é sem dúvida a maior ameaça que paira sobre a democracia portuguesa.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Sofisma 1.
A prática não é corriqueira, mas também não é inédita (quem foi o político que disse que cagava para o segredo de justiça? Se sabes, é porque foi espiado ""por tabela" numa investigação ordenada por um juiz"), e é extraordinariamente fácil fazê-lo.
Basta arranjar uma suspeita contra um amigo do político que se quer espiar, através de uma denúncia anónima, por exemplo, iniciar uma investigação judicial, colocá-lo sob escuta e esperar que o peixe (o político) venha à rede.

Sofisma 2.
A forma como a justiça trata a questão da legalidade e da lealdade processual é a seguinte: prova obtida de forma ilegal ou desleal não existe, e tudo aquilo de que se toma conhecimento a partir dela é ignorado.
Não é um formalismo para proteger os criminosos, é uma forma de proteger os cidadãos contra os abusos que a justiça tem poder e meios para cometer.
Porque se a justiça, por ser desleal, pode "queimar" a possibilidade de conseguir condenar quem persegue, tem um enorme incentivo à lealdade.
Se os cidadãos prescindem destes formalismos, por exemplo, para alegadamente aumentar a eficácia da justiça, o caminho para aquilo que tu te lembras é muito rápido.

Finalmente, os factos revelados pelas escutas são inadmissíveis, no plano ético, certamente, mas tenho as minhas dúvidas sobre se o serão no plano jurídico.
O veredicto do julgamento dos políticos no plano ético é feito nas eleições, e as audiências nos debates que as precedem, nomeadamente na comunicação social.
Para esse julgamento, é desleal usar escutas telefónicas.
E há o risco de o eleitorado ignorar os factos e absolver o réu por ficar chateado com a deslealdade processual da acusação.