segunda-feira, julho 07, 2008

A miragem do terramoto

.

Boaventura Sousa Santos, na Visão de 03 de Julho, brinda-nos com texto apocalíptico intitulado "Terramoto de longa duração". Quando eu pensava que ele tratava do "socialismo do século XXI", do seu amigo Chavez, eis que o descubro atormentado pela derrocada do "modelo social europeu".

"Um terramoto está a assolar a Europa. Não é detectável nos sismógrafos convencionais porque tem um tempo de desenvolvimento atípico. Não ocorre em segundos se não em anos ou talvez décadas. Consiste na convulsão social e política que vai decorrer da destruição progressiva do chamado modelo social europeu – uma forma de capitalismo muito diferente da que domina os EUA..."

Pensei então que a qualidade académica do autor nos iria brindar com uma tese explicativa, debruçando-se sobre as causas do desastre e sobre a sua imbricada arquitectura. Nem pensar, é tudo muito mais simples do que poderia supor-se.

"A destruição deste modelo é crescentemente comandada pelas instituições da União Europeia e pelas orientações da OCDE. "
"A miragem das elites tecno-políticas europeias – muitas delas formadas em universidades norte-americanas – é que a Europa só poderá competir globalmente com os EUA na medida em que se aproximar do modelo de capitalismo que garantiu a hegemonia mundial deste país durante o século XX. "

Ao arrepio de quem sustenta teorias sobre a complexidade do mundo, BSS revela (demonstrar para quê ?) que a derrocada resulta apenas, e só, de uma miragem das elites. Uma miragem, como todos sabem, basta para torcer irremediavelmente um continente inteiro.

Para este cientista do CES (Centro de Estudos Sociais) o resto do mundo não interessa, será que constitui também uma miragem ? Nem uma palavra sobre a evolução económica da China ou a Índia, sobre a vertiginosa perda de importância da Europa (e dos EUA) no concerto do mundo. Embora estudos recentes indiquem a supremacia económica da China, ultrapassando os EUA, já em 2025 (ver também este texto).

Ele acha que o "modelo social europeu", nascido nos tempos em que grande parte do planeta vivia sob o colonialismo europeu ou sob a drenagem impune dos recursos naturais, não tem nada a ver com o assunto (talvez devesse consultar o seu amigo Chavez sobre esta matéria).

"Vão surgir novas formas de protesto social, muitas delas desconhecidas no século XX. A vulnerabilidade do Estado será visível em muitas delas, tal como aconteceu com a greve de camionistas ..."
"A quem beneficiará o fim de um sindicalismo independente e agravamento caótico do protesto social? Exclusivamente ao Clube dos Bilionários, os 1125 indivíduos cuja riqueza é igual ao produto interno bruto dos países onde vive 59% da população mundial."

E assim termina o texto, com a originalidade e profundidade próprias de um panfleto. Em defesa de uma variante benigna do capitalismo

"...assente na combinação virtuosa... entre uma burguesia comedidamente rica e uma classe média comedidamente média ou remediada...

Sem comentários: