quarta-feira, janeiro 25, 2006

Ganhar o Rei sacrificando o Cavalo


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Em menos de um ano o governo suportado pela bancada socialista na Assembleia da República passou de detentor de uma confortável maioria absoluta para a condição de praça sitiada.
O cerco está montado pelas autarquias que perdeu, pelos sindicatos que não controla, pelas corporações que o abominam e, desde o dia 22, por um Presidente que se parece demasiado com um professor rigoroso.

Como foi isto possível ?

As razões de fundo são o vazio ideológico e a ausência de um projecto sócio-económico alternativo ao sistema actual o que reduz os objectivos estratégicos à simples obtenção do poder.
Mas mesmo nesse plano, este descalabro concreto explica-se por um conjunto de erros tácticos, que revelam incapacidade para definir prioridades e gerir expectativas.

Basta recuarmos até à partida de Durão Barroso para a Comissão Europeia, no Verão de 2004, para percebermos como a esquerda fez do bloqueamento da nomeação de Santana Lopes um objectivo prioritário. Essa questão foi pretexto para agressões verbais a Jorge Sampaio e levou mesmo à demissão da liderança do PS.

Assim que Santana foi empossado a pressão sobre o seu governo tornou-se impiedosa e atingiu uma escala sem precedentes mesmo antes que houvesse factos que a justificassem.
Nenhum dos partidos da esquerda, pareceu estranhar que várias forças e personalidades conotadas com a direita - Marcelo, Manuela Ferreira Leite, Pacheco Pereira, Cavaco - participassem nesse processo.
Pelo contrário, aceitaram alegremente a “ajuda” para a sua cruzada.

Hoje já é claro para todos que a direita sacrificou um "cavalo", Santana, para assegurar a vitória do "rei", Cavaco. Caso Santana se tivesse mantido à frente do governo seria altamente improvável uma vitória da direita quer nas autárquicas quer nas presidenciais.

Aqueles que, como eu, sempre disseram que a esquerda não se devia precipitar no engodo e na facilidade de vencer Santana foram olhados como suspeitos de “santanismo”.
Aqueles que defenderam a construção de uma alternativa política sólida antes de amarinhar para as cadeiras do poder foram ostensivamente ignorados pois, para muitos, “as cadeiras do poder já” são mesmo a única coisa que consta dos seus projectos.

Se a Assembleia não tivesse sido dissolvida haveria tempo para preparar uma alternativa política e eleitoral, e depois usar o descontentamento gerado pelo governo de direita para fazer eleger um Presidente que incluisse no seu programa a intenção de demitir Santana. Pelo caminho ter-se-ia provavelmente ganho as autárquicas em Lisboa e no Porto.

Como se sabe foi tudo feito ao contrário.

A direita venceu em Outubro nas principais cidades e agora usa as reivindicações locais para pressionar o governo. Cavaco está numa posição confortável pois tanto pode apoiar o governo, se este fizer as políticas que lhe interessam, como cortar-lhe as pernas se ele se desviar do “bom caminho”.

Pretextos não faltarão já que não é previsível nos próximos anos um sucesso inquestionável das políticas económicas e, por outro lado, está ainda muito vivo o precedente da dissolução da Assembleia decidida por Sampaio apesar da maioria PSD/CDS.

A guerra fratricida entre Alegre, Sócrates e Soares torna tudo ainda mais fácil para Cavaco já que o PS tem a sua capacidade de reacção diminuída e corre mesmo o risco de cisão parlamentar.

Tanta incompetência no planeamento parece demasiada mas é, infelizmente, uma realidade.

Mais grave ainda é o facto de a esquerda não ter um projecto alternativo de desenvolvimento económico e social.
Enquanto oposição, faz uma crítica casuística e de bota-abaixo. Uma vez com as responsabilidades governativas e confrontada com os problemas do sistema, não sabe aplicar-lhes senão as soluções próprias desse mesmo sistema.
E por esse motivo, o historial das suas ascensões ao poder mostra que elas apenas servem para executar as políticas da direita e dispensá-la, assim, de pagar o preço da impopularidade.
Depois de fazer o “trabalho sujo” a esquerda é de novo arredada e tem início um novo ciclo de direita.

Desta vez não será diferente. Dentro de três anos, ou quem sabe até antes disso, a direita liberal terá um Presidente e uma Maioria; a preparação do Partido começa no já anunciado congresso do PSD.

É por isso que não desistiremos de defender a urgência da construção de um projecto alternativo de sociedade e de política evitando o que sempre tem acontecido; serem os objectivos secundários, as prioridades erradas e as lutas sem perspectiva a comandarem a actividade dos partidos de esquerda.

9 comentários:

Anónimo disse...

Excelente post. Boa argumentacao. Ha apenas uma duvida:
E se foi Socrates que pretendeu sacrificar o cavalo (Soares) eate as torres (as autarquias) para se manter como rei vivo e indisputado?
E se foi socrates que pensou que um Presidente de direita lhe permitiria melhor partilhar a impopularidade (ou ate responsabilizar Belem) que a necessaria politica de contencao acarreta. Estando tao perto da falencia financeira, qq gestor do estado portugues percebe que a questao nao e um projecto de esquerda ou direita que se vai jogar nos anos proximos: e a mera viabilidade do pais.
Peco desculpa pela ausencia de acentos. Culpa do teclado.

Anónimo disse...

Bem dito.

Anónimo disse...

se é absolutamente consensual que o governo Santana não servia, como se pode admitir táticas que passam pela sua manutenção? E então onde fica Portugal? Não será por isso que os Partidos estão onde dizem que estão: a caminho do desprestígio total?

F. Penim Redondo disse...

O que importa é que Sócrates ganhou as eleições fazendo o eleitorado supor que:
1) tinha uma solução de novo tipo
2) evitaria as ameaças representadas por Santana
O que se verificou depois é que afinal as soluções de Socrates são exactamente do mesmo tipo daquelas que estavam a ser adoptadas por Santana.
Para ser mais claro: sair da crise impondo sacrifícios dos portugueses (adiamento das reformas, combustíveis mais caros, IVA maior, etc, etc).
Mas isso era o que Sócrates dava a entender, durante a campanha eleitoral, que sabia evitar...
Em suma o argumento de que Santana tinha que ser afastado com urgência não faz sentido.

Anónimo disse...

Excelente post. É o vazio de ideias, "o triunfo da mediocridade" ou do aparelhetik.
Os Portugueses estavam a espera de uma forma diferente de governar, de uma "nova" ideologia.
O que ganhamos?
Mais e pior do mesmo.

Anónimo disse...

Sócrates "cavalo"??
Cavaco"rei"??

Desculpe, eu sei que é uma bonita teoria da conspiração mas não faz muito sentido num sistema parlamentar como o nosso. Como se vê no post anterior, esse tipo de argumentação dá para os dois lados.

Anónimo disse...

Este post é dum humor extraordinário.
Caro blogger, a alusão ao tabuleiro de xadrez até está correcta, mas você interpreta mal o jogo a partir do momento em que começou a ficar em desvantagem. Acontece ...

Se quer ser rigoroso e não fantasioso, saberia que a peça a abater foi Ferro Rodrigues e o sacrificado para o cheque mate foi Santana Lopes. A rainha neste jogo todos sabemos quem foi, e o Rei também. A recente derrota foi apenas um clássico excesso de confiança, pois a sinistra estratégia resulou, mas apenas até certo ponto. A certa altura o próprio "público" se apercebeu, e resolveu intrometer-se.

Anónimo disse...

O que mais me enoja no pensamento da "direita" é o pensamento de "Salvador" argumento utilizado pelo Cavaco. Mas o vosso pensamento tem 400 anos e com muito poucas provas dadas, veja-se como este mundo está, e presumo que para si o que é bom é um G.W. Bush, um Berlusconi, ou se calhar um Chirac, falavam dos Gulags, vejam Guantanamo e outros, quem tem dinheiro é um democrata e quem não tem é o quê, uma ovelha ou melhor um voto nas vossas mãos, eu acredito no "comunismo", mas a sério não nas mãos dos priveligiados, como deve ser o caso de V. Excia. o dono(a) deste blogue, e a propósito o Cavaco não passa de um simples funcionário público, como tantos outros.

Anónimo disse...

Abaixo os donos de blogues e quem os apoiar...
Nacionalizem-se.