segunda-feira, julho 18, 2005

Paraíso perdido ?



Tróia - Sines, 50 km de areia e mar


"Interesse público" de projectos em Grândola pode levar a queixa em Bruxelas


Presidente da câmara acusa Ministério do Ambiente de ceder a interesses da Quercus

Se os ministérios do Ambiente e da Economia emitirem um despacho conjunto declarando a utilidade pública para viabilizar o empreendimento turístico Costa Terra, previsto para Melides, no concelho de Grândola, a Quercus "não terá outra alternativa" senão avançar para os tribunais e para a Comissão Europeia.
O presidente da Quercus, Hélder Spínola, que ontem se reuniu com o ministro do Ambiente, conta que a declaração de impacte ambiental (DIA) do projecto foi emitida, mas que, apesar de favorável, é condicionada à emissão de uma declaração de utilidade pública por aqueles ministérios. "Estamos a estudar os mecanismos legais mais adequados para impedir a concretização do empreendimento, porque consideramos que há matéria e argumentos jurídicos suficientes para o fazer", diz o presidente da Quercus.
Em causa está a construção de um empreendimento com perto de três mil camas num sítio classificado na rede Natura. "Aquele tipo de investimento não se pode confundir com utilidade pública e, a ser feito, tem de ser fora da rede Natura", considera Hélder Spínola. Fonte do Ministério do Ambiente adiantou ainda que, para além da utilidade pública, o despacho conjunto terá de reconhecer que "não há alternativa ao loteamento" e que "são cumpridas as medidas de minimização e planos de monitorização" indicados no estudo de impacte ambiental. O campo de golfe terá de ser compatível com o regime da Reserva Ecológica Nacional.
Um outro projecto previsto para a mesma freguesia do litoral alentejano, conhecido como Herdade do Pinheirinho, também está na mira da associação ambientalista. "Os estudos de impacte ambiental foram feitos com intervalo de dias e é provável que se venha a aplicar o mesmo princípio", antevê Hélder Spínola. Só estes dois empreendimentos prevêem, numa extensão de três quilómetros, 410 moradias, três hotéis, uma estalagem, sete aldeamentos/apartamentos e dois campos de golfe. Dada a dimensão dos projectos, a Quercus exige a realização de uma "avaliação conjunta dos impactes ambientais cumulativos". Para Hélder Spínola, "não basta avaliar os projectos isoladamente, é preciso aferir as suas implicações em conjunto". Tal mecanismo, adianta, "está previsto na lei" e deverá ser conduzido pelo próprio Instituto de Conservação da Natureza, em articulação com o Instituto do Ambiente e com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo.
Para o presidente da Câmara de Grândola, a exigência agora feita pelo Ministério do Ambiente não é mais que "um novo entrave" ao andamento de um processo que se arrasta há 15 anos. Carlos Beato garante nunca ter sido abordada, em reuniões com o ministério, a questão do interesse público. "Fala-se tanto em interesses, esta também é uma cedência a interesses dos ambientalistas", critica o autarca, acrescentando ser "lamentável não ter sabido disto através dos órgãos próprios", o que configura uma "violação da confiança entre os diversos níveis da administração".
O presidente da Câmara de Grândola tem sido a face mais visível na defesa dos projectos turísticos para o seu concelho. A necessidade de uma declaração de utilidade pública para que o processo avance é, em seu entender, "uma mudança de regras a meio do jogo". Todos os procedimentos legais têm sido "rigorosamente cumpridos", pelo que a decisão é "mais um duro golpe para as oportunidades de desenvolvimento do Alentejo litoral", considera Carlos Beato.
A Herdade do Pinheirinho, um loteamento para 200 hectares da empresa Pelicano, apoiado pelo programa One Planet Living, da World Wildlife Fund, contempla 204 lotes para moradias, dois lotes para hotéis, quatro lotes para aparthotéis e três lotes para aldeamentos ou apartamentos turísticos. Associados estarão ginásio, centro de convívio, capela e áreas de comércio. Para a zona sul da área habitacional está projectado um campo de golfe com 27 buracos, em 90 hectares.
O Costa Terra prevê um investimento de 450 milhões de euros, noutros 200 hectares da freguesia de Melides. Terá 2912 camas, distribuídas por 204 moradias e 862 apartamentos, que não ultrapassarão os oito metros de altura e que respeitarão a traça original alentejana. Contempla centro de talassoterapia, centro hípico, clubes de ténis, zonas comerciais e um campo de golfe de 18 buracos.

Cláudia Veloso
Publico, 16/07/2005

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