quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Cenas dos próximos capítulos





...como nas telenovelas.

Deixem-me fazer de advogado do diabo, como é costume, e olhar por cima das próximas eleições para um horizonte de dois anos.

- no dia 20 de Fevereiro de 2005 o PS ganha as eleições (como verão é indiferente se tem maioria absoluta ou não) e forma governo com pompa e circunstância. Passa imediatamente a governar na bissetriz das pressões das várias corporações que participaram da vitória eleitoral.

- as condições económicas e sociais, já de si bastante difíceis à partida, são atiradas pela conjuntura depressiva europeia para a quase ruptura

- A direita que se tinha libertado do Santana Lopes, entretanto substituído pelo Prof. António Borges, vai capitalizando todos os descontentamentos e consegue criar um consenso tecnocrático com base nas recomendações do "Compromisso Portugal"

- O Prof. Cavaco Silva, entretanto eleito Presidente da República decide, perante os indicadores catastróficos, dissolver o Parlamento mesmo que o Governo tenha o apoio de uma maioria (o precedente foi criado por Sampaio)

- Os partidos da direita ganham por maioria absoluta com base num programa que recupera todas as teses do liberalismo económico que o PS era suposto desmontar com a sua eleição em Fevereiro 2005. O amigo de Cavaco, Prof. António Borges, forma um governo recheado de gestores e académicos de grande reputação técnica.

- As "reformas estruturais" há tanto reclamadas pela direita, agora referendadas pelo voto, são finalmente executadas. Cavaco apoia tudo isso da sua cadeira presidencial.

- A esquerda vê-se de novo remetida para um degrau mais abaixo na sua interminável luta defensiva.

Esta história, cujo triste fim lamento, deve-se ao facto de a esquerda ter ido atrás do engodo do Santana.

Santana foi um brinde caído dos céus, um adversário demasiado fácil.

A esquerda concentrou-se na sucessão de pretextos que Santana fornecia e argumentou como se o problema estivesse nos defeitos de Santana em vez de estar no sistema económico e nos interesses de classe.

Como a vitória nas eleições parecia inevitável tornou-se suspeito quem argumentasse, como eu fiz, que essa vitória se devia basear num projecto de esquerda consistente em vez de ser construída sobre a rejeição dos adversários.

Quem viu o debate de ontem percebeu que Socrates vai ganhar estas eleições mas não tem ideia nenhuma de como vencer os enormes problemas que o esperam. O "choque tecnológico", mesmo que tenha sucesso, só pode apresentar resultados daqui a meia dúzia de anos. Os problemas não podem esperar tanto tempo.

O PCP e O BE defendem causas sociais meritórias mas a sua preocupação é essencialmente eleitoral (um não pode perder mais votos e o outro cedeu ao "cheiro a palha").

Sem coragem para romper o falso dilema que opôe o liberalismo ao "assitencialismo do Estado", incapazes de inventar um novo quadro de escolhas e de decisões, os partidos de esquerda caminham para uma "vitória de Pirro".

Por tudo isto, profundamente desiludido, decidi não votar em qualquer partido.


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