domingo, março 31, 2024

EQUADOR



Também já tive os meus cinco minutos de glória.
Precisamente em Agosto de 1967.
Fui colega, na revista "Equador", de nomes como Alexandre O'Neal, Eduardo Prado Coelho e outros que hoje veneramos. De todos eles só conhecia, e convivia, com o musicólogo e professor Mário Vieira de Carvalho (M.V.C.), dois anos mais velho do que eu e a quem, nesses tempos de juventude, chamávamos "Vieirinha".
A revista "Equador", obra do Diamantino Ramos de Almeida (que nunca mais vi), desapareceu logo a seguir. Pertencia à numerosa família das que só publicam o primeiro número.
A minha participação na revista, a convite do Diamantino, consistiu em figurar na capa e escrever um artigo sobre a história do cineclubismo (coisa em que então, nos meus 21 anos, estava envolvido).
A fotografia da capa (sou o da direita) foi feita em casa do arquitecto Sardinha, algures no largo da Graça. O Sardinha é o da esquerda e abarbatou-se ao cachimbo privando-me assim da farda de intelectual (que eu realmente praticava).
O texto que publiquei na "Equador" acerca do cineclubismo foi uma solução de recurso já que o convite inicial visava um poema; quando o material foi sujeito ao visto prévio da censura o meu poema foi alvo do lápis azul e teve que ser substituído.
A revista tinha tido uma longa e conturbada génese. Foi uma realização fantástica se considerarmos a época em que ocorreu, com todo o tipo de dificuldades económicas e políticas.
Quando o Diamantino anunciou as suas intenções no café Chaimite, à Paiva Couceiro, onde eu o tinha conhecido, o grupo de jovens a que pertencíamos considerou o projecto improvável.
O Diamantino Ramos de Almeida, a que toda a gente se referia como "o Doutor", trajava sempre um fato cinzento e gravata escura. Sofria de uma obscura doença (constava que se tratava de coreia) que se manifestava por movimentos bruscos e pouco controlados. Falava com dificuldade o que se notava nos movimentos do pescoço e no esgar facial na emissão das palavras.
Ou nunca soube, ou então não me lembro, por que razão lhe chamavam doutor.
À medida que o tempo ia passando sem que a revista saísse o maralhal, quase tudo estudantes universitários, foi subindo de tom na ridicularização do projecto. A coisa só não era mais achicalhante por beneficiar, o "Doutor", de consideração e estima geral.
E pronto, em Agosto de 1967, a "Equador" apareceu e com isso o Diamantino deu uma enorme lição aos seus detractores.
Um mês depois eu fui para a Marinha, e depois para a guerra da Guiné, e não tornei a ver o Diamantino. Restou-me um exemplar, certamente raro, da revista "Equador".

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