quarta-feira, março 31, 2010

Sinais dos tempos

À porta dos jornais



À porta dos estádios


À porta dos supermercados



À porta dos hospitais



À porta das igrejas

.

terça-feira, março 30, 2010

Em terra de cegos

.

A maneira como tem estado a ser tratada a questão da indemnização dos utentes do SNS que cegaram devido a um erro hospitalar é simplesmente repugnante.
Um aparelho de Estado dado ao despesismo, em que a ministra esbanjou recentemente muitos milhões de euros numa vacina contra um boato de  gripe, revela-se agora meticuloso e sovina quando se trata de compensar pessoas que viram as suas vidas destruídas.
Num país onde tantos gestores públicos, que devem os seus lugares às amizades e conivências, arrecadam em cada ano milhões de euros em prémios só por terem feito aquilo que lhes compete, vemos agora nomear uma comissão para calcular ao tostão as indemnizações dos que vivem, por responsabilidade alheia, o horror da cegueira.

Aterroriza-me de tal forma a hipótese de perder a visão que considero quase impossível "pagar" tal sacrifício. Por isso acho que são casos em que as vítimas dificilmente receberão demais.
Gostaria de ver o Estado exercer com elas a magnanimidade que costuma reservar às corporações profissionais chantagistas e aos empreiteiros de obras públicas que custam sempre muito mais do que o orçamento.
.

Choque frontal em excesso de velocidade

.


O grande acelerador de partículas do CERN - Laboratório Europeu de Física de Partículas vai voltar hoje a fazer colidir feixes de protões à velocidade da luz, esperando-se que a experiência multiplique enormemente o conhecimento científico.

O Big Bang inicial, hoje recriado no CERN, foi afinal um acidente de trânsito. Um choque frontal em excesso de velocidade.
.

segunda-feira, março 29, 2010

China investe no Brasil


O ano de 2010 deverá assistir a um salto no volume de investimentos da China no Brasil, com os maiores negócios da história das relações bilaterais. A maior quantidade de recursos estará concentrada nos setores de petróleo, mineração e siderurgia, que atendem a necessidades estratégicas do país asiático para manutenção do alto ritmo de crescimento econômico.
A visita ao Brasil do presidente Hu Jintao, em 15 e 16 de abril, será um marco nessa onda de investimentos. Durante a passagem do líder chinês pelo Brasil deverá ser assinado contrato entre a LLX, do empresário Eike Batista, e a estatal Wisco (Wuhan Iron and Steel Corporation) para a construção de uma siderúrgica no Porto do Açu. Se concretizado, o investimento será o maior já realizado pela China no setor de siderurgia em outro país, além de ser o maior investimento chinês já recebido pelo Brasil. A Wisco entrará com 70% dos US$ 4,7 bilhões necessários à concretização do projeto.
A Petrobras e a Sinopec discutem parceria que pode levar à exploração conjunta de petróleo no Brasil e trabalham para que o acordo seja anunciado durante a visita de Hu. A estatal chinesa já tem participação de 20% em dois poços da Petrobras no Pará. Além disso, a companhia brasileira negocia novo empréstimo de US$ 10 bilhões com o Banco de Desenvolvimento da China (BDC), que poderá ser anunciado na visita do líder chinês.
Com a perspectiva de manter forte crescimento no futuro próximo, os chineses estão preocupados com a segurança energética e tentam garantir fontes estáveis de fornecimento. O descobrimento do petróleo na camada do pré-sal no Brasil abriu novo capítulo na exploração do produto e criou uma fonte potencial de fornecimento à China. "O setor de petróleo levará ao surgimento de nova geração de projetos de investimentos chineses no Brasil", disse o embaixador do Brasil na China, Clodoaldo Hugueney. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

O mundo continua a transformar-se aceleradamente. Quem poderia prever, há meia dúzia de anos, que a China substituiria os Estados Unidos como mais importante parceiro comercial do Brasil ?
Também neste plano precisamos de acertar o relógio pela nova hora.

.

sábado, março 27, 2010

Um país destes com um povo destes



Hoje percorri uma parte do Norte de Portugal. De Vila do Conde a Guimarães onde visitei a Feira de Doces Conventuais no antigo convento das clarissas. Um portento de deliciosa criatividade em pleno centro histórico da "cidade berço", ela própria um doce arquitectónico de alto calibre.
Depois rumei ao Douro, via Penafiel, num país de belíssimas colinas e vinhedos, camélias e magnólias em flor. Por fim empanturrei-me de vitela assada numa vilória qualquer e prestei vassalagem ao fenomenal  e popular vinho verde tinto.   

Então perguntei-me: como é que um país destes, com um povo destes pode estar deprimido e descrente ? que praga de ineptos, que falsa elite tem governado este país ? que cegueira, que mesquinhez conseguiu pôr de joelhos um país com esta vitalidade e  este potencial ?
Não me venham dizer que este acesso de patriotismo e estas perguntas são consequência do vinho verde, que a graduação é baixa.


.

.

quinta-feira, março 25, 2010

PEC gestual

.


Hoje, já farto de ouvir os discursos partidários sobre o PEC, desliguei o som da televisão e comecei a ouvir música. De repente apercebi-me da enorme expressividade da senhora que, no quadrado inferior direito, traduzia os discursos em linguagem gestual.
Abriu-se-me um novo mundo de significados para o gesticular mudo dos deputados.
Achei que os lugares comuns do costume ganhavam ressonâncias inesperadas e fiquei fascinado durante muito tempo a ver aqueles dedos que tão depressa se uniam como que a dizer cambalacho, se agitavam como quem sacode o capote ou se contorciam como quem diz o contrário daquilo que pensa. Um tratado de retórica política.
Assim se prova que a Assembleia da República para ser clara como a água não precisa dos dedos de Manuel Pinho.
.

quarta-feira, março 24, 2010

Os orçamentos dos ilusionistas


Os orçamentos de 2008 e 2009, por exemplo, são omissos quer em relação ao défice externo, quer no que diz respeito ao endividamento externo medido pela Posição de Investimento Internacional. Mas o Orçamento de 2010 já refere seis vezes o primeiro conceito e oito vezes o segundo.
Jornal de Negócios 24.03.2010

Até parece que o problema só começou agora, o que não é verdade. Como é que os cidadãos podem confiar nos seus governantes, e no sistema democrático, quando são alvo de tais ilusionismos ?

.

Radicalismos súbitos

.

O governo da China bloqueou ontem o acesso ao site do Google que funciona a partir de servidores de Hong Kong. Com isso, usuários chineses não conseguem ver o conteúdo não censurado do site alternativo, segundo a edição online do The New York Times.
A medida da Google de redirecionar as buscas foi uma tentativa de driblar a censura imposta às ferramentas Google Search, Google News e Google Images. A estratégia, é claro, não agradou à China, que, por meio de um porta-voz do Escritório de Informação do Conselho de Estado, acusou a empresa de quebrar uma promessa feita por escrito, quando o site começou a funcionar no país, em 2006.
O governo chinês, aliás, agiu rápido para evitar que os conteúdos censurados no Google pudessem ser acessados com a transferência de dados para Hong Kong. A busca por palavras ou expressões que remetessem para assuntos proibidos no país, como “Tibet”, nomes de alguns movimentos religiosos e a famosa manifestação pela democracia na Praça Tian-an-men, em 1989, não era completada e mensagens de erros ou problemas na conexão apareciam no programa de navegação na internet.

Causa-me alguma perplexidades este radicalismo súbito da Google, depois de vários anos de contemporizações. Parece um ataque de purismo fora de tempo e permite interpretações que atribuem a sua decisão à incapacidade para aceitar a posição minoritária (30%) do seu motor de busca na China.

A decisão de afrontar um poder como aquele que representa o governo da China, se por um lado exige coragem por outro devia apoiar-se na razoabilidade. Para os chineses e para a abertura democrática da China seria talvez mais apropriado que a Google evitasse este conflito.

É realmente muito má a supressão de certas informações nas buscas mas o mundo não se esgota no Tibete nem na praça Tian-an-men. Há milhões de outras palavras para além dessas que os chineses precisam de continuar a pesquisar para conhecer o mundo.

 

terça-feira, março 23, 2010

Boas notícias sobre as cidades



O Fórum Urbano Mundial foi estabelecido pelas Nações Unidas para analisar um dos problemas mais urgentes que o mundo enfrenta hoje: a rápida urbanização e seu impacto nas comunidades, cidades, economias, mudanças climáticas e políticas.

O tema do FUM5 é “O Direito à Cidade: Unindo o Urbano Dividido” e decorre entre 22 e 26 de Março de 2010, nos armazéns da zona portuária do Rio de Janeiro.
Na abertura que ocorreu ontem o UN-HABITAT, United Nations Human Settlements Programme, divulgou um relatório com dados interessantes sobre as cidades que os brasileiros, como anfitriões, têm estado a comentar intensamente.

Em todo o mundo, o relatório estima que 227 milhões de pessoas deixaram de viver em assentamentos precários entre 2001 e 2010.
A redução na proporção de moradores de assentamentos precários no Brasil é atribuída a políticas que "aumentaram a renda dos pobres urbanos", à redução do crescimento populacional e a programas de urbanização, entre outros.

Segundo o relatório, a desigualdade nas cidades brasileiras é "muito alta", no mesmo patamar de centros urbanos de países como Colômbia, Argentina, Etiópia e Zimbábue.
Pequim surge no Relatório como a cidade com menor desigualdade segundo o coeficiente de Gini.




____________________________________________________

Desigualdade nas Cidades
______________________________________________



Cidade..........Coeficiente de Gini


Pequim
..........0,22
Hanói ..........0,39
Amã ..........0,39
Caracas ..........0,39
Washington ..........0,537
Brasília ..........0,6
____________________________________________________________

.

segunda-feira, março 22, 2010

Sócrates refugia-se no Magreb

.


Era o amigo Vara. Vê lá tu que no país deles ainda fazem inquéritos parlamentares só por causa de uma face oculta.

.

domingo, março 21, 2010

Para estragar o seu Domingo

.
A evidência histórica confirma que há uma correlação muito forte entre crises bancárias e bancarrotas de países afectados, quer no caso de países ricos como emergentes. As crises bancárias em geral precedem as crises de dívida soberana — aliás, ajudam a predizê-las, afirma o professor de Economia Kenneth Rogoff, da Universidade de Harvard, que tem trabalhado com Carmen Reinhart, da Universidade de Maryland, na história económica e financeira dos últimos 200 anos.
...
O problema estrutural reside no peso da dívida externa total (pública e privada) que atingiu rácios superiores a 100% em relação à riqueza criada anualmente (produto interno bruto, PIB) em diversos países ricos, com destaque para os europeus. Há os casos extremos da Irlanda e da Islândia, nos 1000% do PIB, seguidos do Reino Unido (413%), Holanda (310%), Bélgica (293%) e Suíça (273%). Portugal (230%) encontra-se em 8º lugar, neste clube de risco dos 20 países desenvolvidos com maior dívida externa total em relação ao PIB.
A “bomba ao retardador”, de que a revista “Time” falava há 25 anos, “deslocou-se” geograficamente dos países em desenvolvimento para os ricos. Nos anos 1980, quatro países da América Latina — Argentina, Brasil, México e Venezuela — concentravam metade da dívida externa mundial. Hoje esse lugar é ocupado por três países ricos: Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha. Os EUA passaram, desde 1985, a ser o principal tomador de empréstimos internacionais e apenas sete países da União Europeia — Reino Unido, Alemanha, França, Holanda, Espanha, Irlanda e Bélgica — detêm hoje mais de 50% da dívida total mundial. Os quatro países latino-americanos referidos representam, agora, apenas, 1% da dívida mundial.
O caso grego (apesar de ter uma dívida total em percentagem do PIB inferior aos 13 primeiros) despoletou-se, subitamente, em virtude da perda de confiança nas estatísticas oficiais que haviam ‘maquilhado’ a dívida externa (que ‘baixou’ 72% entre 2007 e 2008!) bem como o défice público durante o governo anterior. Perda de confiança que foi aproveitada pelos especuladores para um ataque à zona euro. Mas qualquer fagulha, inesperada, sublinha Rogoff, poderá incendiar este panorama estrutural no seio dos ricos. Com uma agravante: em caso de recaída na recessão mundial, a margem de manobra para políticas anticrise nestes países desenvolvidos será muito “mais curta” do que em 2007-2009, diz o economista francês Philippe Trainar.
Extracto do artigo "O risco de bancarrota nos países ricos",  Expresso Economia 20.03.2010 
 
Caminhamos, de surpresa em surpresa, com a leve sensação de pisar a tampa de um vulcão. Medina Carreira afinal é um optimista.
Lamento ter-lhe estragado o Domingo mas também eu, imprudentemente, li isto logo ao pequeno almoço.
.

sábado, março 20, 2010

Campanha ambiciosa

.
O candidato à liderança do PSD Pedro Passos Coelho apresentou hoje a moção global de estratégia, cujas «preocupações essenciais estão voltadas para o país», considerando que Portugal tem pela frente «uma tarefa fazível, mas gigantesca».
TSF, 20.03.2010
.

sexta-feira, março 19, 2010

Mesmo sem o Granadeiro


A China Mobile, maior operadora móvel do mundo em número de clientes (522 milhões de subscritores), registou um resultado líquido anual de 115,2 mil milhões de yuans (cerca de 12,24 mil milhões de euros) em 2009, reportam a agências internacionais com base em números publicados esta quinta-feira.
A companhia aumentou o lucro 2,3% face ao balanço do ano anterior, mas as margens cresceram 25%. O resultado bruto de exploração (ebitda) cresceu 5,9%, para os 229 mil milhões de yuan renminbi, enquanto as receitas progrediram quase 10%, somando 452,1 mil milhões.
Os números do último trimestre do exercício apontam crescimento de 3% nos lucros, cujo montante ascendeu a 31,3 mil milhões. Durante o exercício, a empresa obteve um crescimento líquido de 65 milhões de novos subscritores.
Dinheiro Digital, 18.03.2010

Esta empresa, que tem oito vezes mais clientes que a PT, que cresceu no ano passado o equivalente a uma PT, deve dar uns prémios fabulosos aos administradores.
É coisa para albergar um regimento de Ruis Pedro Soares.
Ao menos lá o Primeiro Ministro nunca dirá que não sabia de nada.

quinta-feira, março 18, 2010

Equação ruinosa

.



Governo pondera excepção na aplicação da regra "2 por 1" para as áreas da educação, saúde e forças de segurança, que empregam 347 mil pessoas. Cortes serão noutras áreas.
Jornal I, 19.03.2010

Com a regra "saiem dois e entra um" não há nenhum "corte". O que acontece é um aumento da despesa do Estado.
Em vez de dois o Estado passa a pagar três funcionários; as pensões dos dois que se aposentaram mais o salário daquele que foi admitido para os substituir.
.

quarta-feira, março 17, 2010

A ratoeira

.

As empresas também vão poder beneficiar da amnistia fiscal que será concedida a quem resolva declarar o dinheiro que está aplicado no exterior, avança o Jornal e  Negócios indicando que o Estado se prepara para perdoar empresas que fugiram ao fisco através de off-shores.
A novidade, que tentará repatriar capitais saídos do País, foi introduzida pelos socialistas na recta final da discussão do Orçamento do Estado (OE), com o apoio dos partidos da direita e, apesar de ter passado despercebida, terá grande impacto.
Isto vai permitir que as sociedades que, por exemplo, estejam envolvidas em esquemas "offshore", como os detectados na Operação Furacão, limpem a sua ficha tributária e criminal durante este ano mediante o pagamento de uma taxa de 5%, adianta o jornal.
Dinheiro Digital, 17.03.2010

Parece uma excelente ratoeira. Usa-se o dinheiro das falcatruas como isco e apanha-se mais algum dinheiro dos cidadãos incautos para substituir os impostos que os vigaristas não pagaram.
É a mensagem errada no momento errado.
.

terça-feira, março 16, 2010

Lei da Rolha

.





.

segunda-feira, março 15, 2010

Querem mesmo discutir peanuts?


Entre a liderança do PSD e os jogos parlamentares do governo, em Portugal, há algum esquecimento da ameaça que impende sobre a economia mundial. O PIB chinês cresceu acima de 8% em 2009, o crédito concedido voltou a superar o imaginável no mês passado, e três dos maiores bancos mundiais já são da China. A dimensão do pacote anticrise e uma política de juros baixos explicam o dito "milagre de 2009". No Ocidente era uma esperança: o gigante asiático seria motor da retoma global. Contudo, longe de validar esse keynesianismo, a China pode antes ser a vitória da teoria dos ciclos monetários de Hayek.

O crescimento que, ao longo de 30 anos, assentou nas exportações contrasta hoje com o estado dos seus mercados principais. Com menor escoamento, a liquidez injectada não encontra actividades rentáveis na economia real. O resultado é a inflação em múltiplos activos, particularmente no imobiliário. O filme já foi visto. As bolhas podem seguir o guião dos EUA. Com a diferença que uma crise de liquidez no país com a maior reserva de divisas do mundo, e detentor de uma fracção enorme da dívida americana, resultará na venda maciça dessas reservas. O colapso do dólar, o fim do financiamento ao Sudeste asiático, e a travagem do motor mundial seriam devastadores.
Querem mesmo discutir peanuts?
.
por Carlos Santos, Publicado no Jornal I em 15 de Março de 2010

.

domingo, março 14, 2010

Lapidar

.



O tão esperado PEC conheceu finalmente a luz do dia e a primeira coisa que se pode dizer é que nada era mais previsível do que o seu conteúdo. Sumário: os mesmos de sempre vão pagar mais para que os mesmos de sempre ganhem mais ou não percam nada.
...
Os tais 'priveligiados', que Sócrates apontou como exemplo da injustiça fiscal e que agora vão ser massacrados com 45% de IRS, mais o corte nas deduções com a Saúde, a Educação e os PPR (com que aliviam as despesas do Estado nestes sectores), são o alvo falso de uma demagogia que pretende esconder o fundamental: o Estado gasta metade da riqueza do país e o país continua pobre. Em lugar de verem agradecido o seu esforço (em cinco anos, passaram de 40 para 45% do IRS e agora, juntando os impostos directos e indirectos mais a Segurança Social, vão passar a entregar 60% do que ganham!), os ‘privilegiados’ são tratados como se fossem eles os culpados pelo deboche financeiro em que temos vivido. Eles, os únicos que não fogem ao fisco — porque os outros, os do grande dinheiro, estão no abrigo de offshores, fundações ou sociedades feitas para tal, e a grande massa dos evasores, aqueles que, pagando podiam de facto fazer a diferença, são os coitadinhos que não passam facturas, falsificam o IVA e vivem em economia paralela e protegida pelo Estado. Por isso é que os que vão pagar 45%, representando apenas 1% dos contribuintes, respondem por 18% da receita do IRS. É em grande parte graças a eles que foi possível a este Estado voraz recolher mais receitas fiscais do que a própria despesa nos últimos dez anos (ou seja, cobrou mais do que necessitava), e ter aumentado a receita fiscal seis vezes mais do que o PIB (isto é, colectou impiedosamente os poucos que criaram riqueza para dar aos que nada acrescentaram). Ser generoso com o dinheiro alheio é, aliás, uma característica bem portuguesa: basta ver os salários e mordomias dos gestores públicos.

Não falo dos justamente assistidos — dos que vivem com pensões de 300 euros ou do meio milhão de verdadeiros desempregados. Falo, para começar, dos imediatamente acima, mas moralmente bem abaixo: dos que vivem dos esquemas do subsídio de desemprego enquanto mantêm empregos paralelos ou vegetam no café ou à porta do Estádio da Luz a dizer mal de tudo; dos ‘biscateiros’ que nunca passam factura nem pagam um tostão de impostos e se acham cidadãos exemplares; dos que cultivam as falsas baixas e arruínam o sistema de saúde público com doenças que não têm, exames de que não precisa e remédios que não pagam; dos que compram Mercedes com subsídios para plantar batatas ou produzir 'arte' ou gravuras paleolíticas.
E falo dos ainda mais acima na escala dos assistidos: dos que oferecem robalos em troca de telefonemas, andares recuados em troca de urbanizações e milhões em offshores em troca de subtis alterações às leis. Falo, enfim, de todos os que vivem à conta e não sabem viver de outra maneira, dos tais 46% que se declaram soberbamente indisponíveis para aceitar sacrifícios- com a certeza adquirida de que os 'outros' é que têm de o fazer. São esses que o PEC protege.

Extracto da crónica de Miguel Sousa Tavares, publicada ontem no Expresso, intitulada "PEC: Plano de Extermínio dos Contribuintes".

Uma análise lapidar que merece ser lida na íntegra.

.

sexta-feira, março 12, 2010

As negativas do primeiro período

.


DN 12.03.2010


- A vaca tem quatro patas, duas à frente, duas atrás, duas à direita, duas à esquerda. São tão compridas que chegam ao chão. É um animal cercado de pelos por todos os lados.! Com o seu leite a vaca fabrica nata.!
- Os Romanos construíram as ruínas de Pompeia.!
- César tinha os cabelos carecas!
- Os homens primitivos viviam cem mil anos, trezentos mil anos, quinhentos mil anos!
- Os faraós comiam os escribas. Os faraós eram enterrados em túmulos mandados fazer propositadamente e colocados em múmias; O corpo era envolvido em ligaduras e perfumado com um perfume tão forte que se não estivesse morto morreria! Os Egípcios pintavam nas paredes dos túmulos cenas domésticas para as múmias não se aborrecerem.
- As iluminuras eram letras desenhadas pelos copistas com tinta fluorescente!
- A Inquisição em Espanha foi terrível. Vinham de muito longe para assistir às execuções: isto desenvolveu o turismo.!
- Napoleão mandou construir o Arco do Triunfo para que pudessem desfilar sob ele os combatentes de 1914-18.!
- Por vezes cavavam-se em redor dos castelos largos fossos onde se colocavam crocodilos. Quando não havia crocodilos os fossos eram cheios com água!
- Depois de recolhido, o milho é conservado em iglos!
- Na Roma antiga o suicídio era punido com a morte.!
- Certos navegadores praticavam o mercado negro a fim de repovoar a América com escravos.!
- As duas primeiras guerras de Luis XIV terminaram com mortos!
- Filipe Augusto ganhou em 1014 a batalha de Bouvines graças aos mísseis comunistas.!
- O último rei dos Franceses foi Luís-Filipe. Foi morto pela morte!
- Arquimedes inventou a engrenagem, que não encontrou a sua plena utilização senão alguns anos mais tarde, com a invenção do motor de explosão e do despertador!
- A Páscoa é o dia em que os Judeus marcharam 40 anos no deserto.

de O livro vermelho dos cábulas (Jean Charles)
.

quarta-feira, março 10, 2010

O Google contra Marx (2)

.

.clicar a imagem para ampliar

Na continuação de um post anterior sobre o mesmo tema, O Google contra Marx (1), voltamos para desenvolver um pouco mais a compreensão do modelo de negócio Google.

À primeira vista o modelo de negócio do Google parece idêntico ao dos media tradicionais; captação de receitas de publicidade atraídas pelas garantias de audiências dadas aos anunciantes, com base na disponibilização, por vezes gratuita, de informação. Mas essa semelhança é ilusória pois o Google não disponibiliza um determinado bloco finito de informação; em vez disso proporciona aos seus utilizadores, que são os destinatários da publicidade, uma ferramenta com a qual podem aceder às mais variadas informações, ao sabor de propósitos pessoais e particulares.

Ao contrário da publicidade dos grandes meios de difusão, como as televisões que também alcançam milhões de espectadores, a publicidade do Google não é igual para todos os destinatários como acontece com um spot televisivo. Cada utilizador do Google recebe publicidade específica de acordo com os interesses e perfil que a sua utilização do Google revela.
Em certo sentido o negócio do Google é mais parecido com qualquer aluguer de ferramentas ou de veículos. Pode-se estabelecer a analogia com um aluguer de automóveis dotados de GPS, sem outro custo para o utilizador que não fosse o de levar o rádio sempre ligado e fazer a condução ao som de anuncios publicitários. O condutor podia portanto levar o automóvel pelas estradas que entendesse pagando para o efeito a gasolina necessária (como paga a energia e os serviços de rede que permitem ao seu computador executar pesquisas no Google).

O negócio descrito atrás nunca seria viável por causa do custo do automóvel comparativamente com as verbas que os anunciantes estariam dispostos a pagar para influenciar as preferências de consumo de uma só família. Ao invés os custos da ferramenta que o Google "aluga", que são enormes, permitem influenciar não uma mas centenas de milhões de famílias e empresas. As "estradas" a que essa ferramenta dá acesso, as informações indexadas pelo Google, foram criadas gratuitamente pelos próprios cidadãos e pelas empresas.

A figura publicada no topo deste post mostra a diferença entre o esquema de valor tradicional e o esquema próprio do Google. No primeiro caso, a partir de capital constante (maquinaria, instalações, matérias primas, etc) e de capital variável (trabalho humano) obtém-se um determinado "valor de uso" que o vendedor cede ao comprador com base no "valor de troca". O esquema típico do Google parte apenas de capital constante (o hardware onde reside o repositório de indexação e o software de armazenamento e pesquisa) já que não há trabalho específicamente envolvido no atendimento das "encomendas" (os próprios anúncios publicados pelo Google são quase sempre comprados em regime de "self-service").

O Google produz "valor de uso" para três tipos de intervenientes:

a. os que acedem à informação com base no repositório de referência do Google
b. os que publicam e difundem informação através da referenciação pelo Google
c. os que pagam para aumentar a probabilidade de ser vistos nos acessos à informação proporcionados pelo sistema de referenciação

É forçoso constatar que os intervenientes do tipo c., uma minoria portanto, pagam o suficiente para manter a gigantesca infraestrutura do Google e garantir à empresa uma invejável rentabilidade.
O grosso do "valor de uso" disponibilizado pelo Google é entregue à sociedade que nada paga por ele. Trata-se de uma situação sui generis pois o "valor de uso" só numa pequena parte é cedido de forma onerosa, o que não encaixa no modelo de análise forjado por Marx.

A extensão do repositório do Google e a sua dimensão geográfica, a intensidade da sua utilização e a variedade de consequências que a sua utilização arrasta são verdadeiramente incomensuráveis. Quando oiço criticar o Google, com base em supostos perigos ou no excesso dos lucros, sou levado a pensar que a maioria de nós nunca pensou no valor proporcionado à sociedade pelas ferramentas que ele nos tem facultado.
Mesmo que involuntáriamente esta actividade empresarial do Google tem uma dimensão social enorme. É difícil, é mesmo impossível, imaginar tudo aquilo que teríamos perdido se o Google não tivesse sido inventado.


.

terça-feira, março 09, 2010

TROCOS para o PEC

.

.
.
É chegada a minha vez de dar um contributo para o PEC, de dar uns TROCOS para safar o PEC.
Convém esclarecer imediatamente o que se entende por TROCOS: trata-se do acrónimo para "Taxa Repressora de Operações com Off Shores".
Propõe-se a criação de um novo imposto que cobraria 5% do valor de todos os negócios em que pelo menos um dos contratantes fosse uma off-shore. É uma medida justa, para o Estado arrecadar alguma coisa, já que os off-shores só existem para ocultar matéria colectável ao fisco. Exemplos:
- o apartamento que, segundo os jornais, Sócrates comprou por 250.000 euros a uma off-shore renderia ao PEC cerca de 12.500 euros
- os 350.000 euros pagos pela TAGUSPARK a uma off-shore do Figo sempre deixariam por cá 17.500 euros, em vez de se esfumarem no espaço como o gato da Alice (também ela no país das maravilhas).
.

Os Óscares de Pequim

.

A distribuição dos Óscares em Hollywood ofuscou completamente as referências mediáticas à Assembleia Popular Nacional da China, que se iniciou no dia 5 de Março.
Perante quase três mil delegados, Wen Jiabao afirmou que o crescimento do Produto Nacional Bruto em 2010 vai ser de “aproximadamente” oito por cento. Um valor menos ambicioso que o alcançado noutros anos e que surge como meta para um ano que o primeiro-ministro descreveu como “complicado”.
Leu um discurso que delineia os pontos principais dos próximos meses. Gastar menos em projectos megalómanos e investir em novas energias e na protecção ambiental foram alguns dos avisos que ficaram.
Com o plano de facilitar o acesso ao crédito em zonas rurais e favorecer as pequenas e médias empresas, o governo calcula criar mais nove milhões de empregos para fazer face à entrada de jovens no mercado. O desemprego urbano não deve ultrapassar os 4.6 por cento e a inflação vai ficar à volta dos três por cento.
A política de facilidade ao crédito vai focar-se nos que mais necessitam e, aqui, Wen salientou o plano de aumentar o poder de compra de quem vive no meio rural, seja com subsídios, como através do acesso a empréstimos.
A necessidade de alterar o modelo de desenvolvimento, uma ideia que já tinha sido referida, voltou a caracterizar o discurso. Mais consumo interno é uma forma de criar um crescimento económico mais seguro.
A criação de emprego é a “prioridade máxima” e o governo central vai destinar 43 mil milhões de Renminbis para estimular o mercado de emprego. Ao lado dos jovens licenciados, Wen referiu os trabalhadores migrantes e os militares desmobilizados como as classes a não esquecer.
Caracterizado pelas medidas sociais, o discurso à nação referiu também o hukou, o registo de nascença que diferencia cidadãos urbanos de rurais. Mas apesar de, na semana passada, um editorial conjunto em treze jornais ter referido a necessidade de acabar com esta herança maoísta, Wen Jiabao disse apenas que nas aldeias e pequenas e médias cidades, o sistema vai tornar-se menos exigente de forma a facilitar a mobilidade social e geográfica. Mas nas grandes cidades como Pequim, Xangai, Chongqing, entre outras, os milhares de trabalhadores migrantes não vão ter a situação alterada quanto à ilegalidade de residência por falta de um contrato de trabalho.
Maria João Belchior em HojeMacau
Não há dúvida que as medidas mais importantes serão as que modifiquem o sistema de autorização de residência, ou "hukou", pelo qual todos os cidadãos chineses estão ligados legalmente ao seu lugar de nascimento e que abrange cerca de 230 milhões de migrantes internos. Para que tenham acesso aos serviços educacionais ou de saúde nas mesmas condições que os moradores das cidades onde trabalham.
O facto de ainda recentemente 13 jornais chineses terem publicado, no mesmo dia, textos iguais sobre o "hukou" constitui uma iniciativa inédita e mostra a sensibilidade social perante este tema.
A magnitude e relevância destas questões, cujas ondas de choque se sentirão em todo o mundo, não conseguiu no entanto sobrepor-se à luta de "Avatar" e de "Estado de Guerra" na disputa das estatuetas.
.

segunda-feira, março 08, 2010

A dentada da Popota

.



Pelas ruas de Maputo, no último de quatro dias de visita oficial a Moçambique - "Neste cargo somos comidos vivos", citou José Sócrates, para acrescentar: "E temos de ter força para aguentar." DN 06.03.2010
.

domingo, março 07, 2010

D. Branca na Segurança Social

.


Oiço certos economistas dizer que, no sistema de pensões da Segurança Social, as contribuições feitas pelos activos em cada momento servem para pagar aos pensionistas existentes nesse momento. Oiço dizer que o facto de termos contribuído pesadamente, ao longo de muitos anos, não constituiu uma capitalização e não garante a ninguém que venha a receber uma pensão de reforma.

Quando oiço dizer que o sistema está em crise porque deixaram de entrar nele contribuintes em número suficiente para o sustentar lembro-me imediatamente da D. Branca e do seu sistema piramidal. Ou do mais recente Madoff.

Era precisamente este o esquema dos seus negócios mas eles foram presos.

sábado, março 06, 2010

Freeshore, Off-Port e o CAOS

.


O regresso a Londres ainda este mês, para uma ronda final de inquirições a cidadãos ingleses, vai ser determinante para a equipa de inspectores e procuradores dedicados a tempo inteiro ao ‘processo Freeport’ decidir em definitivo o que fazer em relação a José Sócrates: deixá-lo de lado ou propor ao procurador-geral da República uma investigação directa ao primeiro-ministro, incluindo às suas contas bancárias.
...
Haverá ainda, no lote de informação recolhida em Inglaterra em Dezembro de 2009, um documento de um responsável financeiro do Freeport com alusões explícitas à alegada necessidade de pagar ‘luvas’ a um triângulo de figuras — a Sócrates e a outros dois membros do Governo.
Só com a comprovação desses indícios e a obtenção de testemunhos contundentes na próxima viagem a Londres — que reforcem as pistas iniciais —, a situação de não arguido do primeiro-ministro será reequacionada.
A Polícia Judiciária já concluiu a análise pericial dos milhares de páginas de documentação financeira entregues pelo Serious Fraud Office (SFO) na última deslocação da equipa a Inglaterra, mas a verdade é que, até ao momento, não foram encontradas provas de transferências directas de dinheiro para sustentar a suspeita de que a aprovação do Freeport teria como contrapartida o financiamento ilegal do Partido Socialista através do então ministro do Ambiente. A PJ e o MP estão a aguardar, no entanto, as respostas às cartas rogatórias enviadas às autoridades de alguns paraísos fiscais para poderem chegar a conclusões sobre o rasto do dinheiro.
Expresso, 06.03.2010
.
Quando oiço Sócrates lamentar-se por andar a aturar o caso Freeport há vários anos eu, que sou um simplista, penso assim: eu já tinha chamado a polícia e os magistrados e dito "tomem lá as minhas contas bancárias todas e descubram lá onde está a massa que eu recebi, já que eu, infelizmente, não dei por nada". Acabava-se logo o meu martírio.
Claro que para mim a coisa seria muito fácil pois não tenho contas em off-shores nem tenho feito negócios com eles. Mas então levanta-se-me a seguinte dúvida: devemos tolerar em cargos públicos pessoas que usam, ou abusam, dos negócios disfarçados dos off-shores ?
Eu, se mandasse, só dava posse a ministros e outros altos dirigentes quando eles me apresentassem um CAOS (Certificado de Abstinência a Off-Shores)
.

sexta-feira, março 05, 2010

China tornou-se o maior mercado imobiliário do mundo

.


A China tornou-se o maior mercado imobiliário do mundo em 2009, ultrapassando os Estados Unidos, e deverá manter essa posição em 2010, disse hoje um jornal oficial chinês citando uma multinacional norte-americana.
Pelas contas da Cushman & Wakefield, em 2010, o investimento chinês no sector duplicou, somando 156,2 mil milhões de dólares (114,8 mil milhões de euros), enquanto nos Estados Unidos caiu 64 por cento, para 38,3 mil milhões de dólares (28,1 mil milhões de euros), disse o China Daily.
"O imobiliário chinês continuará a registar este ano um vibrante investimento apesar das recentes medidas do Governo para arrefecer o mercado", afirmou um responsável daquela multinacional.
Em janeiro passado, quando o preço das casas aumentou 9,5 por cento -- a maior subida em mais de um ano e meio -- reintroduziu uma taxa sobre as transações imobiliárias e o banco central impôs novas regras para a concessão de empréstimos
A Cushman & Wakefield, é uma organização fundada em 1917, com sede em Nova York, tem escritórios de 58 países.
Diário de Notícias, 04.03.2010
.

quinta-feira, março 04, 2010

O direito à greve

.



Entre greves e manifestações, os governos de José Sócrates já enfrentaram cerca de 18 acções de luta da Função Pública. E a estas há ainda a somar os paralisações sectoriais - como dos professores e enfermeiros. Hoje, quinta-feira, a Administração Pública voltou a parar.
Tal não deixa de ser paradoxal quando se tem verificado em Portugal uma clara redução do recurso à greve como mostram os quadros, obtidos no PORDATA, que publicamos no topo deste post.
Cada vez mais instala-se a percepção de que no nosso país o grosso das greves é feito pela Administração Pública ou pelas empresas do Sector Empresarial do Estado. A extensão e impacto destas greves não tem paralelo em qualquer greve do sector privado.
Embora o direito à greve seja consensual na sociedade portuguesa cada vez são mais as vozes que se interrogam sobre as razões por que as greves "migraram" do sector privado para o sector público já que é do conhecimento comum que no primeiro há sub-sectores com níveis salariais e segurança de emprego, muito mais baixos.
As greves em empresas, em que o utente pode quase sempre recorrer a produtos ou serviços alternativos, resultam em claro prejuízo dos empresários. Pelo contrário as greves dos serviços públicos, quantas vezes essenciais, raramente permitem o recurso a fornecedores alternativos afectando no essencial os utentes de tais serviços.
Há no entanto uma outra ordem de questões que me parecem muito pouco esclarecidas.
O Estado, por acção do Governo ou da Assembleia da República, toma decisões legalmente válidas sobre as condições de trabalho dos funcionários.
Cabe perguntar mesmo com risco de ser mal compreendido: fará sentido a tradicional extensão do direito à greve, que foi criado para proteger a parte mais fraca, os trabalhadores, da ganância capitalista dos empresários, à Administração Pública que tem como "patrão" entidades supostamente defensoras do interesse comum ? Entidades que têm sobre os cidadãos o poder discricionário de cobrar impostos e de nos mandar combater numa qualquer guerra ?
Não se trata de impedir a discordância. Os trabalhadores da Administração Pública têm o direito de discordar das decisões do Governo como qualquer outro cidadão, mas devem dar voz a essa discordância como qualquer outro cidadão; manifestando-se e votando. Sob pena de haver na sociedade cidadãos de primeira e de segunda no que toca às relações com o poder do Estado.
Uns, de primeira, podem parar os hospitais para defender os seus salários afectados por decisões de política orçamental e os outros, de segunda, só lhes resta esperar pelas próximas eleições para castigar um governo que, com a mesma política orçamental, os levou ao desemprego e à ruína.
..

quarta-feira, março 03, 2010

Há que chamar os boys pelos nomes

.

1. O Conselho Superior do Ministério Público reuniu, por convocação do Procurador-Geral da República, para ser por este informado da sua intervenção no dossier respeitante às certidões extraídas do inquérito n.º 362/08.1JAAVR da Comarca do Baixo Vouga.

2. O Procurador-Geral da República esclareceu o Conselho sobre o que este entendeu perguntar-lhe.

3. O Conselho considera, por unanimidade, que estão em causa intervenções de magistrados no legítimo exercício das suas competências funcionais, com observância das metodologias e dos procedimentos característicos da actividade judiciária.

4. O Conselho Superior do Ministério Público reafirma a sua determinação em impedir a contaminação do Ministério Público por considerações de índole política, em cumprir e preservar os procedimentos decisórios próprios e em não admitir que se insinuem motivações extra-jurídicas para as posições processuais que o Procurador-Geral da República ou cada magistrado entenda tomar de acordo com a Constituição e a lei.

Lisboa, 2 de Março de 2010

Neste comunicado do Conselho Superior do Ministério Público sobre o caso a Face Oculta não se percebe se aprova ou desaprova o que se passou e não se percebe a quem os recados se destinam.Tanto podem ter por alvo o PGR, como Sócrates, como as comissões parlamentares de inquérito ou os jornalistas.

Aquilo de que não precisávamos era de mais um comunicado sibilino, corporativo, hermético e que não chama os boys pelos nomes. Um justiça por hieróglifos.

.

terça-feira, março 02, 2010

O Google contra Marx (1)

.



clicar as imagens para ampliar

A fabulosa história de sucesso do GOOGLE precisa de ser compreendida, para lá do seu crescimento explosivo e avassalador, como o advento de uma nova economia que põe em causa as abordagens convencionais. Algumas das suas características merecem uma nova atenção:
- 97% das suas gigantescas receitas derivam da publicidade
- A publicidade é vendida com base em gigantescos repositórios de informação (textos, fotografias e filmes) que foi criada por milhões de internautas que nada têm a ver com a empresa
- Os seus 20.000 trabalhadores actuam maioritáriamente na investigação/desenvolvimento e no marketing


- Os seus trabalhadores actuam maioritáriamente em processos criativos destinados a facilitar o acesso à informação ou na motivação dos consumidores da informação
- Uma pequena parte dos seus trabalhadores actuam nos processos de manutenção e administração da gigantesca infraestrutura tecnológica onde reside o gigantesco repositório de informação
- Todo o sucesso se baseia na invenção de algoritmos de pesquisa e na capacidade técnica de armazenar e gerir quantidades gigantescas de informação

Do que atrás ficou dito resulta que o GOOGLE constitui como que uma enorme instalação "fabril" que processa uma "matéria" prima que lhe é entregue gratuitamente.

Estamos perante uma empresa que só tem, em termos marxistas, "capital fixo" pois cada unidade do produto que vende não depende de trabalho vivo, ou "capital variável", que tenha sido incorporado para que ela exista. É como uma fábrica que só tivesse engenheiros de produção, técnicos de manutenção e vendedores mas não tivesse qualquer operário.

Os conceitos de exploração pela apropriação de mais valia, de valor de troca criado pelo trabalho vivo aplicado na execução, tal como os definiu Marx, não se lhe aplicam. A própria mercadoria é apenas latente e potencial pois só passa a existir se, e quando, o comprador decide comprar publicidade.

Trata-se de uma ilustração eloquente da nova economia do Digitalismo que tardamos em compreender e integrar na análise do mundo actual.

.

segunda-feira, março 01, 2010

A autoridade das autoridades

.


As sociedades, e em especial a nossa, estão saturadas de autoridades aparentes. Alta Autoridade para a Comunicação Social, Autoridade Nacional Segurança Rodoviária, Autoridade para as Condições do Trabalho, Autoridade da Concorrência, Autoridade Nacional de Protecção Civil e não sei quantas mais que constituem um enorme aparelho de Estado paralelo. Todos temos a penosa sensação de que, em geral, são inoperantes ou mesmo inconvenientes.

Os acádémicos são os receptáculos do conhecimento, os tribunais são a encarnação da justiça, o parlamento é a casa da democracia e os sacerdotes são os porteiros do céu. Com base neste modelo criou-se nas sociedades um encastoado de grupos e confrarias, na economia tal como na saúde ou nas artes, que reproduzem o sistema da autoridade até ao nível mais baixo da pirâmide.

As últimas semanas da vida pública portuguesa têm sido marcadas pelas suspeitas de "abusos da autoridade", pelas invocações da "autoridade competente", pelas interpretações das "autoridades jurídicas" e pela falta de autorização para publicar as escutas.

É claro que precisamos de saber, em cada caso, quem em princípio tem competência para decidir ou impor a sua opinião. É verdade que em princípio as universidades detêm o melhor saber e que os tribunais fazem a melhor justiça mas nem sempre isso acontece. O princípio da autoridade não deve ser usado para descartar outras opiniões nem deve fomentar a aceitação acrítica de tudo o que emana quer das organizações socialmente aceites quer de grupelhos que quase sempre instituiram ad-hoc a sua própria autoridade.

A autoridade só é eficaz quando é naturalmente assumida e aceite. A sua imposição pela força ou por decreto é apenas mais uma forma de trabalho precário.

.